Resumo
Este artigo propõe-se a discutir o desemprego no Brasil e seus desafios éticos. A controvérsia encontra-se nas disparidades entre as taxas de
desemprego e o perfil da educação, principalmente nos últimos anos da década de 1990. Os impactos da globalização e o emprego de novas tecnologias ocasionam aumento de desemprego com diminuição de postos de trabalho em muitos setores da economia. Apresentar esta controvérsia para a compreensão ética é essencial numa situação onde a crise do
emprego formal é uma realidade e a busca de atividades produtivas, como a produção para consumo próprio, e os serviços sociais e domésticos
estão sendo valorizados como formas alternativas.
Introdução
O atual debate social apresenta geralmente
o desemprego como o resultado de três fatores
emergentes: a mundialização dos mercados, que
provoca uma reestruturação da produção, a
introdução de uma tecnologia que utiliza cada
vez menos mão-de-obra e o fim de uma era de
crescimento econômico sustentado, que garanta
o pleno emprego.
Assim, dentro do contexto da globalização,
podem-se observar mercados altamente
competitivos, movidos por políticas econômicas
agressivas, que têm evidenciado um ambiente
com grandes e imprevisíveis mudanças. Sob este
aspecto, a inovação tecnológica passou a ser um
fator vital para a sobrevivência das organizações,
pois ela determina o avanço da qualidade de
produtos e serviços.
Dessa maneira, a impressão vaga de que a
globalização e a tecnologia trazem consequências
negativas tem levado muitas pessoas a declararse
contra ela, pois parece que carregam consigo
tanto potencialidades positivas quando negativas,
e que a atitude mais sensata, no caso das novas
tecnologias, consistiria em explorar umas e
minimizar as outras. Entre as potencialidades
positivas, podem-se citar os avanços tecnológicos
como geradores de bem-estar e conforto. Entre
as potencialidades negativas, pode-se citar o
desemprego, que afeta países emergentes, em
grande parte por desqualificação profissional.
Sob esta ótica, é importante estabelecer uma
correlação entre o novo contexto econômico
mundial, o nível de desemprego no país e a
estrutura de educação e formação profissional
existente, associada aos investimentos do
governo nos últimos anos. O aumento do
desemprego tem sido objeto de diversos estudos
e levantado diversas opiniões, que em alguns
casos podem ser contraditórias.
A ética, por outro lado, apresenta-se, ao
mesmo tempo, como um sentimento, uma ciência
e uma doutrina. Ela nos ensinava, inicialmente,
a escolher entre o bem e o mal. A economia parece
fugir de todos os esquemas morais anteriores e
nos obriga a escolher entre múltiplas opções,
cada uma produzindo efeitos positivos e negativos.
É nesta perspectiva de arbitragens múltiplas e
ambivalentes que tentamos situar alguns
desafios éticos, e não em uma perspectiva binária
e reducionista de escolha entre o bem o e mal.
1 O desemprego no Brasil
No Brasil, as informações mais completas sobre a situação do mercado de trabalho são fornecidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) e também pelo Departamento
Intersindical de Estudos Estatísticos e Sócio-
Econômicos (DIEESE). Para o IBGE, desempregada é
toda pessoa com 16 anos, ou mais, que durante a
semana em que se fez a pesquisa tomou medidas
para procurar trabalho ou que procurou
estabelecer-se durante a semana precedente.
Já o DIEESE, para estabelecer essa informação,
utiliza um prazo de trinta dias, além de incluir o
desemprego oculto, representado pelo trabalho
precário e desalento. Assim, a porcentagem de
pessoas desocupadas em relação ao total da população ativa, ou seja, ocupados mais desempregados, é conhecida como taxa de desemprego.
A impossibilidade de definir o desemprego
redunda na multiplicidade de suas medidas. Cada
fonte estatística tem seu conceito, incompatível e
portanto incomparável com qualquer outra fonte
e, geralmente, escolhido em função de critérios de conveniência. O DIEESE define o fenômeno da forma mais abrangente possível, somando-se o desempregado aberto com os empregados precários e os empregados desalentados, ao passo que o IBGE restringe a medida ao desemprego aberto. As comparações internacionais de taxas de desemprego apresentam ainda maior perigo, uma vez que essas não dependem apenas de definições, mas também de peculiaridades institucionais, culturais e econômicas literalmente incomparáveis. Assim, tudo o que os números podem indicar é a variação do desemprego, sua estrutura e natureza.
A teoria econômica mais tradicional distingue
três tipos de desemprego, de acordo com seus
mecanismos geradores e, paralelamente, três
perspectivas de luta contra estes. A falta de
visibilidade e de transparência do mercado de
trabalho, a informação imperfeita que os agentes
têm, provoca uma forma benigna e geralmente
de curta duração de desemprego, chamada
friccional. A vaga e o candidato adequado existem,
mas os dois não se encontram, de sorte que a vaga
fica vazia e o candidato frustrado. É necessário
circular as informações por todos os meios: meios
de comunicação, lugares públicos, bancos de
emprego etc.
O desemprego dito conjuntural está ligado a
fases de recessão da atividade produtiva. A
experiência da década de 1980 ensinou claramente
que o desinvestimento provoca um desemprego duradouro, podendo haver conflito entre objetivos de curto e de longo prazos. Mas a forma mais resistente de desemprego está ligada a um descompasso entre a estrutura qualificada
da mão-de-obra necessária e da força de trabalho
disponível. A curto e a longo prazos, as três formas de desemprego misturam-se e confundem-se. No
longo prazo, a pior forma de desemprego (estrutural) resulta de uma defasagem entre a
evolução da tecnologia e o ensino.
Para preparar o recurso humano para uma tecnologia sofisticada e em permanente evolução, o ensino profissionalizante pode não ser a melhor opção. A maioria dos trabalhadores atuais deve mudar profundamente seu modo de trabalhar em função da introdução do progresso técnico na produção. Hoje constitui privilégio de uma minoria desfrutar de um emprego estável com tempo integral, o ano inteiro e durante a vida ativa. A maioria dos ativos destina-se a ocupações irregulares, temporárias, precárias, de tempo parcial ou falsamente independentes.
O aumento do desemprego no Brasil apresenta três explicações fundamentais: fatores estruturais, conjunturais e sazonais.
Dos fatores estruturais, o Brasil amarga efeitos de três fatores perversos: baixo crescimento, educação insuficiente e legislação inflexível. Destes fatores, a educação insuficiente
desde a infância é responsável direta ou
indiretamente pela baixa qualificação da mão-de-
obra no Brasil e apresenta-se como um dos pontos mais críticos para o país. Assim, é possível
evidenciar que boa parte dos problemas como
desemprego no país é gerada pela baixa
qualificação da mão-de-obra existente, oriunda
de uma educação precária e insuficiente. É importante salientar que, à medida que as
empresas se modernizam e aumenta a complexidade
da tecnologia utilizada, requisitam-se maiores aptidões técnicas e pessoais e, assim, a cada dia mais pessoas são consideradas desqualificadas para os cargos abertos nas empresas, caso o sistema de ensino vigente não proporcione formação adequada.
2 Teorias sobre o desemprego
O desemprego tem diversas causas e parece não haver uma única teoria a explicá-lo. Assim, existem diversas abordagens para o fenômeno,
conforme segue:
a) Job Search - Seu objetivo é explicar o desemprego onde trabalhadores e firmas têm informações incompletas e dispendiosas dentro de um mercado de trabalho competitivo.
b) Substituição intertemporal - A idéia básica
é que tanto o lazer corrente quanto o futuro são substitutos, e em períodos em que a taxa de salários e juros forem baixos os trabalhadores trocariam trabalho por lazer presente voluntariamente.
c) Sinalização - Ocorre quando um trabalhador
qualificado se recusa a aceitar empregos desqualificados com o receio de associar sua imagem profissional a ela.
d) Salários eficientes - Para evitar que os
trabalhadores façam “corpo mole” (shirking), as firmas adotam o pagamento de salários-eficiência. Gera-se desemprego involuntário, pois é desestimulada desta maneira a contratação de
mais trabalhadores.
e) Deslocamentos setoriais - Segundo este
modelo, o desemprego é devido à realocação
da mão-de-obra entre os setores econômicos, extinguindo muitos vínculos empregatícios.
f) Histerese - O modelo propõe que quanto mais a taxa de desemprego subir, mais elevada ela tende a se tornar, devido ao alto grau de correlação entre o desemprego passado e o corrente.
2.1 Causas e efeitos do desemprego
Para os economistas chamados clássicos ou monetaristas, o desemprego baseia-se no funcionamento do mercado e no desejo dos trabalhadores de receberem salários excessivamente
altos. Assim, o desemprego acima do friccional
deve-se a uma política de salários inadequada.
Esse desemprego é qualificado como voluntário.
Já para os economistas keynesianos, o desemprego
deve-se fundamentalmente ao nível insuficiente da demanda agregada por bens e serviços.
Assim, defende-se que o desemprego acima do friccional é involuntário e ocorre porque o nível
da demanda agregada é insuficiente. Contudo, os custos mais graves do desemprego são para aqueles que sofrem diretamente os seus impactos, pois muitas pessoas não têm acesso ao seguro-desemprego.
E, para aqueles que se mantêm empregados, fica a obrigação de pagar parte dos custos do desemprego por meio de impostos ou contribuições sociais mais elevadas. Neste contexto, o desemprego traz conseqüências degradantes, prejudicando os bons hábitos de trabalho e a produtividade dos trabalhadores.
Assim, pode-se afirmar que o desemprego é o
primeiro fator determinante da pobreza.
3 Tópicos importantes na análise do desemprego
3.1 Perfil da educação no Brasil
O Relatório do Ministério da Educação e do
Desporto para a Conferência Internacional de
Educação de Genebra em 1996 apresenta o seguinte quadro sobre a educação no Brasil:
O perfil da educação brasileira apresentou significativas mudanças nas duas últimas décadas. Houve substancial queda das taxas de nalfabetismo, aumento expressivo do número de matrículas em todos os níveis de ensino e crescimento sistemático das taxas de escolaridade média da população. Não obstante, o quadro educacional do país é ainda bastante insatisfatório tanto do ponto de vista qualitativo quanto em relação a alguns indicadores quantitativos. No que se refere à escolaridade da população, observam-se duas tendências importantes:
primeiro, o crescimento da renda per capita verificado nas quatro últimas décadas foi acompanhado de expansão da taxa de escolaridade média, passando-se de dois anos de estudo em 1960 para cerca de 5 anos em 1990. Em segundo lugar, a queda das taxas de analfabetismo de 39,5% para 20,1% nas quatro últimas décadas, foi paralela ao processo de universalização do atendimento escolar na faixa etária obrigatória (7 a 14 anos), tendência que se acentua a partir de meados dos anos 70, sobretudo como resultado do esforço do setor público na promoção das políticas
educacionais.
Este movimento não ocorreu de forma homogênea; acompanhou as características de desenvolvimento socioeconômico do país e reflete suas desigualdades. Além das imensas diferenças regionais quanto ao número médio de anos de estudo, que apontam a região Nordeste bem abaixo da média nacional, cabe também destacar a grande oscilação deste indicador em relação à variável cor, mas relativo equilíbrio do ponto de vista de gênero.
Esta situação torna-se ainda mais grave ao se observar a evolução da distribuição da população por nível de escolaridade. Se é verdade que houve considerável avanço na escolaridade correspondente à primeira fase do ensino fundamental (1.ª a 4.ª série), é também verdade que em relação aos demais níveis de ensino os indicadores são ainda insuficientes: em 1990, apenas 19% da população do país possuía o primeiro grau completo; 13%, o nível médio e 8% possuía o nível superior. Considerando a importância do ensino fundamental e médio para assegurar a formação de cidadãos aptos a
participar democraticamente no mundo da vida e do trabalho, os dados indicam a urgência das tarefas e o esforço que o Estado e a sociedade civil deverão assumir para superar a médio prazo o quadro existente.
Conforme o Plano Nacional de Educação (BRASIL, 1997), os níveis de investimentos em educação existentes no país correspondem à parcela do PIB semelhante à de países desenvolvidos. Porém, a grande questão é a eficiência de sua aplicação. Se os recursos destinados à educação não são abundantes, também não são desprezíveis.
Os últimos dados comparativos disponíveis
indicam que, em termos de percentual do PIB, o
Brasil não se coloca em posição muito desfavorável
no conjunto dos países desenvolvidos e em
desenvolvimento. Por outro lado, se for considerado
o percentual de recursos públicos legalmente
vinculados à educação, há bem poucos países que
o superam, inclusive se for levado em conta
aqueles que são reconhecidos como tendo
efetuado uma verdadeira revolução industrial.
3.2 Impactos da globalização
Tanto as negociações comerciais da Rodada
Uruguai em 1994, quanto os acordos de livre
comércio tais como a União Européia, o NAFTA e
o Mercosul, foram acusados de pôr em perigo
os salários e empregos (UNITED NATIONS, 1995).
O que dizem os fatos (BANCO MUNDIAL, 1995) a
esse respeito? Nos países industrializados, duas
tendências inquietantes se destacam. Em países
como os Estados Unidos, o Canadá e a Austrália,
as desigualdades salariais cresceram, ao passo
que nos países europeus, com legislação social
mais rígida, o desemprego aumenta ou persiste.
Embora o efeito direto das importações deva
ser pequeno, as conseqüências indiretas
(inovações tecnológicas defensivas e de deslocamento de mão-de-obra não qualificada para o
setor de serviços) não podem ser desprezadas.
Mas existem outros fatores em jogo, especialmente
mudanças tecnológicas que poupam mão-de-obra. Nos países em desenvolvimento, observam-se duas tendências contraditórias. No Leste Asiático, o aumento do comércio exterior coincidiu com uma maior igualdade dos salários e das rendas; na América Latina aconteceu o inverso. Assim, a igualdade social não depende unicamente da abertura comercial.
Os países ricos costumam apontar três “vilões” do desemprego: a nova tecnologia, as importações baratas e a imigração de mão-de-obra barata. Desse diagnóstico decorrem três políticas perigosas: o controle da tecnologia, o protecionismo e medidas de contenção das migrações. O semanário inglês The Economist defende a idéia de que o argumento está baseado sobre um vício fundamental de raciocínio: supor que a produção é constante (crescimento zero)
e que, portanto, o estoque de trabalho a ser
distribuído é fixo. Este pressuposto contraria os
fatos: nos Estados Unidos, produtividade, emprego
e produto cresceram desde 1880 e o desemprego
ficou estável. Os três acusados só seriam culpados
em um mundo onde todas as necessidades e
desejos já estiveram satisfeitos, o que não existe.
No Brasil, a abertura dos mercados coincide
com o início do governo Collor. Desde então, os
dados da Federação das Indústrias de São Paulo
(FIESP) sobre a indústria paulista apresentam-se
como alarmantes: salvo dois curtos períodos, de
julho de 1991 a janeiro de 1995, os saldos de
fechamentos e criação de monopostos de
trabalho na indústria são negativos e elevados
(-120.000 em janeiro de 1991 e -60.000 em
agosto de 1995). Mas pelas estatísticas globais
de desemprego publicadas pelo DIEESE esse
números não crescem; até pelo contrário. A série
de taxas mensais de desemprego na grande São
Paulo sobrepõe três tendências:
a) uma tendência sazonal a diminuir no fim
do ano e aumentar no inverso;
b) um ciclo conjuntural (sucessão de expansões
e recessões) de 10 a 12 anos, com
o desemprego caindo de março de 1985 a dezembro de 1989, subindo de janeiro de 1990 a março de 1993 e declinando desde então;
c) uma tendência secular a permanecer em torno de uma taxa de 10%.
Como compatilizar as informações? Dois fenômenos devem ter acontecido: uma transferência de ativos da indústria para os setores terciários e informais e uma maior rotatividade da mão-de-obra sem que o saldo de desemprego a acompanhasse.
Cabe assinalar um fenômeno recente e surpreendente: o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA), do Ministério do Planejamento,
indica que a renda parou de se concentrar. Até
pode-se observar uma discreta redistribuição do
poder de compra a favor dos mais pobres, através
dos preços dos alimentos. Mesmo que o fato deva ser
creditado ao fim da inflação (Plano Real) e não
à abertura da economia, continua confirmada a
tese de que, na América Latina, a globalização
significa maior desigualdade.
De modo geral, a globalização gera, nos
países em desenvolvimento, novas oportunidades,
mas também grandes desafios. Do lado positivo,
a integração internacional carrega consigo
mercados mais amplos para o comércio, maior
diversificação de bens, mais influxos de capital
privado e maior acesso a tecnologias. Porém, as
novas oportunidades se fazem acompanhar de
novos e grandes desafios na área da gestão
econômica. As novas possibilidades favorecem
os mais ágeis, e a volatilidade dos fluxos de
capital dificulta as políticas econômicas dos
países em desenvolvimento. O acerto das políticas
macroeconômicas traz maiores recompensas, mas a inércia e o equívoco custam mais caro.
Finalmente, o crescimento dos países em desenvolvimento não é prejudicial e sim benéfico para os países industrializados.
3.3 Emprego de tecnologia e o desemprego
Dizia Colbert, ministro da Fazenda de Luiz
XIV, a um inventor que lhe trazia uma nova máquina de tecelagem: “procuro um meio de ocupar o povo para que cada um possa viver dignamente de seu trabalho e não de tirar do povo o pouco de ocupação que ele tem. Leve sua máquina para outro país, onde faltam braços”. A história não confirmou
o receio do ministro. A ociosidade dos recursos humanos não parece maior hoje do que no século XVII.
A curto prazo, o progresso técnico muda a composição qualitativa e setorial do emprego e, portanto, provoca um desemprego transitório de adaptação.
Nem mesmo essa forma de emprego deve ser evitada de
qualquer jeito.
Não se deve evitar de todo jeito o desemprego
de adaptação, mas, sim, administrá-lo com programas de reconversão, para os poucos suscetíveis de adaptar-se, e de amparo financeiro,
para a grande maioria.
A “teoria da compensação” procura estudar
o impacto da tecnologia sobe o emprego a longo
prazo e pode formular-se na seguinte proposição:
o efeito negativo direto da introdução do progresso
é compensado pelo crescimento indireto do
emprego. As comparações internacionais
permitem-nos sugerir que não existe uma
correlação necessária entre tecnologia avançada
e taxas de desemprego elevadas. As economias
mais avançadas do ponto de vista da tecnologia
têm desemprego menor que países quase
totalmente descapitalizados.
3.4 A alternativa do prosumo
A sociedade industrial se acostumou a pensar
o trabalho como uma atividade assalariada de
produção de excedentes para comercialização.
Porém, a produção para consumo próprio,
chamada por Alvin Tofler (1980) de “prosumo”,
adquire uma importância crescente.
A maior motivação em trabalhar para si
mesmo e a quebra das economias de escala em
muitos setores permitem às atividades de
prosumo muitas vezes atingir qualidade e rentabilidade competitivas como as atividades
de mercado. Sua perspectiva de ampliação das atividades e a maior utilização de horários de
trabalho flexíveis e contínuos poderão mudar o estilo de vida e o tempo disponível. Desta
maneira, o cidadão poderá dividir seu tempo entre o trabalho em regime de mercado ou de prosumo e
um tempo flexível para atividades de lazer ou de
trabalho benévolo.
3.5 O futuro do trabalho
O progresso técnico e a mundialização têm
provocado uma realocação espacial e setorial da
atividade econômica, que pode ter um impacto
sobre o nível de emprego, mas que cria bolsões
regionais e setoriais de desemprego de ajustamento.
O trabalho operário está em declínio.
Serviços expandem-se, mas ligados a uma
desigualdade social entre os que vendem e os
A maior motivação em trabalhar para si mesmo
e a quebra das economias de escala em muitos setores permitem às atividades de prosumo muitas vezes atingir qualidade e rentabilidade
competitivas como as atividades de mercado que compram. As atividades emergentes situam-se
nas áreas de manipulação de dados e palavras,
representações orais e visuais.
Quanto aos empregos primários, estagnam-se
em 5% dos ativos. Essa reestruturação setorial
exige uma reconversão do emprego e leva a um
desemprego estrutural de longa duração. Além
disso, a natureza da atividade sofre mudanças e
deve redefinir a ética do trabalho. Para o sociólogo René Castel (1995), duas palavras caracterizam o emprego do futuro: precariedade e flexibilidade.
Hoje, do ponto de vista do trabalho, a questão
social cristaliza-se em torno de três pontos: a
desestabilização dos estáveis, a instalação na
precariedade e um déficit global de empregos.
Assim, toda atividade produtiva pode ser
vista como concatenação de cinco dimensões: é
um desempenho de competência, uma atividade
de produção de bens ou serviços, um status
multidimensional, um modo e nível de remuneração
e um mecanismo de integração social. O
futuro do trabalho depende de como vão evoluir
essas cinco dimensões.
4 O desemprego e os seus desafios éticos
Como conclusão do presente artigo, propõem-
se alguns desafios éticos que marcaram esta reflexão sobre o desemprego no país e no
contexto mundial.
Em relação ao Brasil, talvez a conclusão mais
contundente a que se pode chegar é que o país,
mesmo possuindo escassez de capital para investimentos em educação, pode gerar resultados
muito mais expressivos. Cabe, neste contexto,
uma reflexão sobre a ética e a gestão dos recursos
destinados à educação que, conforme os próprios
relatórios governamentais, poderiam e deveriam
ser aplicados de maneira a atender as necessidades
dos cidadãos.
Como já foi citado anteriormente, três séculos
atrás, o Ministro Coulbert proibia a instalação de
novas máquinas de tecelagem na França para
manter o nível de emprego. O país que praticar
tal estratégia hoje deverá se proteger da concorrência internacional e o protecionismo levará ao atraso e ao isolamento. O povo dificilmente renunciará de forma espontânea a viver a grande aventura do progresso.
O fato de a máquina dispensar o homem de
tarefas insalubres e repetitivas não deve ser visto
apenas pelo lado negativo do desemprego; ela
também liberta o trabalhador para tarefas mais
criativas e proporciona mais tempo livre. Neste
sentido, o desemprego de adaptação pode ser
minimizado por programas de reconversão para
os que são suscetíveis de adaptar-se.
A tentação de manipular a idéia do “crescimento
zero” continua fascinando as mentalidades
catastrofistas. Ela, porém, contraria a condição
humana. Os desejos e aspirações são insaciáveis,
de tal forma que satisfazer uma determinada
necessidade não apaga a frustração, mas a desloca
a outros objetos ou ideais. Essa insatisfação
permanente causa sofrimentos, mas é a mola
propulsora do progresso.
A instituição do salário mínimo é cada vez mais questionada como instrumento de redistribuição de renda e proteção aos mais pobres. Contudo, um estudo do Banco Mundial sugere que o salário mínimo nos países em desenvolvimento não ajudou em termos de justiça. Só o crescimento da renda per capita pode aumentar os salários reais.
Toda atividade produtiva envolve um risco de fracasso, que pode ser reduzido, mas jamais
eliminando totalmente. Quem deve assumir o risco? O governo, o empresário ou o trabalhador?
A distinção é meramente funcional, uma vez que
a falência gera desemprego e que o trabalhador
também paga imposto, convém, porém, colocar a questão em termos claros.
A estabilidade do emprego e a irredutibilidade
dos salários transformam a mão-de-obra em custos fixos. Assim, empresas contratam em função do seu ponto mínimo de produção. Outra vez, a estabilidade de alguns se paga pelo desemprego de outros. A rigidez da legislação social e trabalhista define a fronteira entre o emprego formal, o setor informal e o desemprego.
O risco de se juntar ao exército de desempregados constitui uma das fontes mais freqüentes de
estresse nas sociedades modernas.
Mas nem sempre esse medo nasce de forma espontânea e se apresenta com risco real. A comissão de Justiça e Paz da Bélgica destaca um paradoxo: quanto menos riscos as pessoas correm, mais elas se sentem ameaçadas. Embora os níveis de desemprego
atuais no Brasil sejam equivalentes aproximadamente
aos de dez anos atrás, observa-se um aumento da sensação de insegurança. Será isso uma forma de neomilenarismo?
Todo tipo de imposto se tornará mais efetivo,
no que se refere a seu objetivo institucional,
quando sua forma de arrecadação ocorrer da
maneira mais transparente possível, especialmente
aqueles que incidem sobre salários. Em vez
dessas contribuições serem pagas pelas
empresas, os encargos deveriam ser pagos pelos
trabalhadores. Do ponto de vista contábil, não
haveria diferença, mas apenas do ponto de vista
do exercício da cidadania. Percebendo o serviço
comprado, o trabalhador cobrará seu uso.
Diante da crise do emprego formal, convém
valorizar formas alternativas de atividades
produtivas como o prosumo (produção para consumo próprio) e os serviços sociais e domésticos.
Vale lembrar que o trabalho informal constitui uma concorrência desleal ao setor formal.
Porém, a repressão é impossível como também indesejável, uma vez que o setor informal constitui
uma válvula de escape ao desemprego estrutural.
Na sociedade industrial anterior, o trabalho
não representava apenas um meio de subsistência.
Era também o principal fator de inserção
do indivíduo na comunidade. Nossa sociedade
poderia deixar de ser uma sociedade onde o
trabalho é o principal fator de integração social.
Ainda temos, contudo, de inventar uma civilização
do tempo livre.
Diante da crise do emprego formal, convém valorizar
formas alternativas de atividades produtivas como o prosumo e os serviços sociais e domésticos.
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