sexta-feira, 15 de abril de 2011

HUMANO

Você conquista o meu respeito e a minha admiração pelo simples fato de se mostrar humano.
Humano como você é. Do jeito que você é.
Humano como todos nós somos.
Humano com todos os seus sentimentos e pensamentos.
Humano do mesmo modo que nós existencialistas pregamos em nossos discursos teóricos, mas que nem sempre conseguimos mostrar, em nossas atitudes. Pois nós existencialistas pregamos a liberdade como um dos valores mais importantes. Mas nem sempre conseguimos nos libertar de nós mesmos, a ponto de aceitar a liberdade e a libertação do outro.
Humano como me sinto, quando me lembro das vezes em que creio ter ajudado alguém a conquistar uma liberdade que eu mesma almejava, mas que ainda não possuía.
Humano quando penso que a esperança que sempre me move a continuar!
Humano do mesmo modo que nos ensinou Fernando Pessoa em seu Poema em Linha Reta:

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência,

Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,

Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,

Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;

Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
E verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma covardia!
Não, são todos o Ideal, se os ouço e me falam.

Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semi-deuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído.


Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Fernando Pessoa
in Obra Poética
Companhia Aguilar Editora

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