RESUMO: De maneira geral, pode-se dizer que educação é o processo pelo qual são transmitidos ao indivíduo os conhecimentos e atitudes necessárias para que ele tenha condições de integrar-se à sociedade. Nas comunidades mais simples, a aquisição de conhecimentos não exigia estabelecimentos especialmente destinados às tarefas educativas; a aprendizagem se realizava naturalmente, pois a criança participava dos trabalhos comuns e conforme crescia, o papel que desempenhava nas comunidades definia-se cada vez mais. Mas, a especialização de tarefas dentro da sociedade levou à criação da aprendizagem diferenciada e a cristalização de classes sociais com interesses antagônicos transformou a educação num instrumento perenizador dessa divisão. Partindo dessas assertivas, este trabalho tem como objetivo buscar informações sobre como se deu a educação nos aldeamentos indígenas do Brasil Colônia sob a direção dos padres jesuítas. Investigando a intenção desses primeiros educadores, quais os recursos utilizados no processo ensino-aprendizagem da época e outras questões pertinentes ao tema, a metodologia fundamentou-se prioritariamente, na pesquisa bibliográfica. Buscou-se variadas leituras desde autores tradicionais da historiografia brasileira até artigos de revistas especializadas em história. Não pode ser apresentado um resultado final, pois o trabalho ainda se encontra em elaboração.
PALAVRAS-CHAVE: Brasil Colônia; Educação; jesuítas.
Introdução
Organizados e administrados por Jesuítas no Novo Mundo, os aldeamentos indígenas – também chamados missões ou reduções – fizeram parte de uma grande obra evangelizadora e civilizadora.
“Educação Jesuíta: objetivo, metodologia e conteúdo nos aldeamentos indígenas do Brasil Colônia” busca apreender como se deu o trabalho educacional nesses espaços determinados que inseriam-se num contexto bem mais amplo.
Através de uma vasta pesquisa bibliográfica, esta investigação acabou julgando necessárias breves anotações sobre os Jesuítas e seu sistema educacional como um todo.
Em seguida, pôde-se adentrar no cenário encontrado na colônia portuguesa na América pela Companhia de Jesus e as adaptações feitas neste sistema de ensino para enfrentaras peculiaridades locais.
Quais os objetivos da educação nos aldeamentos indígenas? Quais os recursos metodológicos utilizados para atingir esses objetivos e que conteúdos eram abordados durante as aulas?
A resposta à essas questões são importantes para a percepção de como se deu o estabelecimento do processo educacional no Brasil e para desmistificar a ação Jesuíta entre os índios, vista de forma paradoxal, ora despertando ardorosos defensores, ora angariando críticos severíssimos.
Na realidade, o trabalho de pesquisa ainda continua; considera-se ainda haver fontes que devem ser consultadas.
Mas tornou-se relevante divulgar os primeiros apontamentos no intuito de contribuir com os estudos sobre a educação no período colonial do país, quando os Jesuítas tiveram significativo papel na unificação territorial pela língua.
Além disso, com esta divulgação pretende-se abrir a possibilidade de contatar e/ou trocar informações com outros estudiosos da área.
Jesuítas – o início de tudo
A palavra reformar significa renovar ou modificar algo que não serve mais, do modo como está.
Também quer dizer transformar.
Essa foi a palavra escolhida para designar um conjunto de mudanças no âmbito da Igreja Católica, que deram origem a diversas novas igrejas chamadas protestantes. As dissidências não seguiam o comando do Papa e a quebra da unidade religiosa – conhecida como Reforma Protestante – estabeleceu o fim da supremacia católica na Europa.
A Igreja Católica viu-se obrigada a reagir diante do avanço do protestantismo; à essa reação deu-se o nome de Reforma Católica ou Contra – reforma. Neste período foram criadas várias ordens religiosas, destacando-se a Companhia de Jesus.
Ela foi uma arma eficaz da reação católica; fundada pelo Espanhol Ignácio de Loyola em 1534 e reconhecida pelo Papa Paulo III em 1540, a Ordem seguia uma disciplina militar e sua missão principal era combater infiéis e protestantes.
Com sólida formação cultural, disciplinados e devotos, os Jesuítas atribuíram grande importância à educação, monopolizando as instituições de ensino de diversas regiões com o objetivo principal de difundir a ideologia católica romana e tornando-se o braço mais forte da Igreja no movimento de expansão marítima das nações modernas.
O sistema de educação Jesuíta: diretrizes e bases
O método de ensino intitulado Ratio Studiorium, elaborado pela Companhia de Jesus no final do século XVI, foi utilizado para catequizar no Novo Mundo, servindo aos interesses da empresa da colonização e da Igreja contra-reformista.
O Ratio Studiorium surgiu para fornecer às instituições de ensino da Ordem uma base comum e as experiências pedagógicas das diferentes regiões onde esses religiosos atuaram acabaram colaborando para a construção do documento final publicado em 1599.
Compunha-se de trinta conjuntos de regras, num detalhado manual que indicava a responsabilidade, desempenho, subordinação e o tipo de relacionamento dos membros da hierarquia, dos professores e dos alunos; tratava também de organização e administração escolar.
O documento apresentava, ainda, o conteúdo e a metodologia a serem utilizados pelos professores.
De modo geral, o programa dividia-se em três cursos: Letras ou Humanidades, Filosofia e Ciências, Teologia ou Ciências Sagradas.
A avaliação deveria ser feita diariamente, observando-se o interesse, o envolvimento e o desenvolvimento do aluno durante as aulas.
Brasil: uma educação peculiar para um campo de trabalho peculiar
Na Europa, as ordens religiosas desempenharam importante função criadora na reorganização dos territórios, assim como na organização política de povos de origens diversas.
No Brasil, a Companhia de Jesus encontrou um cenário muito diferente dos que até então tinham sido seu campo de trabalho, prioritariamente, educacional.
Aqui, educação e catequese deveriam andar atreladas, uma vez que a compreensão dos preceitos religiosos implicava, primeiro, no uso de um aparato educacional.
Os Jesuítas, provavelmente, logo se aperceberam que o trabalho na colônia deveria seguir outros rumos, não sendo necessárias, diante de tantas peculiaridades, apenas adequações em seu sistema e sim, verdadeiras inovações.
Uma dessas foi o aprendizado de ofícios manuais por parte de seus membros, ocupação à qual não se dedicavam. Depois, merece destaque a criação de um aparato financeiro que, embora contrário às normas gerais da Companhia, fez-se necessário para o prosseguimento dos trabalhos dos padres.
Havia escassez de recursos. A fazenda régia, por vezes, não repassava à Ordem o que lhe era de direito e quando isso acontecia, os Jesuítas não recebiam em espécie, na maioria dos casos. Até mesmo o poder público impedia o andamento dos trabalhos, cobrando impostos, sendo que os padres eram legalmente isentos dos mesmos.
Política de aldeamentos: solução Jesuíta para o problema da cristianização
Diante do fato de que o fim último da vinda dos Jesuítas era a conversão dos pagãos à fé católica – ponto que eles nunca perderam de vista – observa-se que os mestres foram obrigados a ser condescendentes em vários momentos de sua obra.
Uma dessas condescendências foi o aprendizado da língua nativa; isso se deu através do contato com as crianças indígenas, pois havia grande resistência à língua invasora, sendo imprescindível a elaboração de uma “língua geral” (tupi e português mesclados).
Mais tarde, a adaptação de alguns ritos sacramentais da Igreja configurava novas concessões.
Manuel da Nóbrega, chefe da Missão Jesuíta Brasileira, e seus missionários utilizaram-se de uma nova língua, de ritos e mitos próprios dos indígenas; foi também ele que, por volta de 1556, concebeu a política dos aldeamentos com o intuito de solucionar o problema da cristianização.
Esses aldeamentos constituem-se em pontos de discórdia entre os estudiosos, pois enquanto alguns consideram que eles foram uma tentativa de retirar o indígena do contato desmoralizador do colonizador, outros afirmam que as reduções significaram a degradação da atividade Jesuíta no Brasil, desenvolvendo no meio daquelas populações uma das “influências letais mais profundas” (FREYRE, 2006).
Educação nos aldeamentos indígenas do Brasil Colônia: objetivos, metodologia e conteúdos
A preocupação básica do colonizador português nos séculos XVI e XVII era a difusão da língua; mesmo a organização da língua geral tinha esse objetivo.
A instituição dos aldeamentos prevenia um mal recorrente no trabalho educacional, catequizador e de expansão da língua: devido à mobilidade de muitas tribos, os Jesuítas não encontravam povos anteriormente visitados, não podendo, assim, dar continuidade ao processo.
Dentro desses espaços delimitados, o grande objetivo, mesmo a nível educacional, era a conversão dos gentios. Os Jesuítas introduziram, a priori, o ensino profissional, seguido do ensino elementar, constituído de classes para ler, escrever, soletrar, rezar em latim e contar.
O público-alvo era preferencialmente as crianças, pois com elas os padres recolhiam o material para a organização da língua e expandiam sua obra catequizadora, ensinando-os as cantigas pias, repetidas para os parentes em sua própria língua. O menino indígena foi, afinal, o eixo da atividade missionária no Brasil Colônia.
Ali, gradativamente, o ensino foi organizado através de várias metodologias.
O primeiro recurso metodológico utilizado para auxiliar a educação nos aldeamentos foi a música; através dela conseguiam despertar a atenção e a simpatia dos nativos, utilizando seus próprios instrumentos e elaborando um repertório no estilo indígena, cujas letras falavam do Deus cristão.
Outro recurso pedagógico empregado pelos Jesuítas para atingir seu grande objetivo foi o teatro.
Com ele, os religiosos promoveram a educação e evangelizaram os silvícolas, apresentando peças em tupi ou em português, chamadas autos, que versavam sobre a vida de santos e personagens das escrituras; apresentavam, também, textos de obras clássicas, devidamente adaptadas pela Igreja.
Também a dança foi usada com fins pedagógicos. Era adaptada da tradição indígena e passava a fazer parte de festas religiosas católicas como a do Divino Espírito Santo e a de São Gonçalo.
Em 1630, nos vinte aldeamentos que abrigavam por volta de 70.000 indígenas, os conteúdos ministrados eram basicamente os incluídos no ensino elementar – ou seja, rudimentos de leitura, escrita e aritmética – além de conteúdos de artes, oratória, ciências e aqueles ligados à doutrina cristã.
Entre as artes desenvolviam trabalhos nas áreas de música, pintura, escultura e arquitetura.
Considerações
Como evento isolado, os aldeamentos indígenas sob a direção dos padres Jesuítas são um fenômeno cultural interessante e peculiar na História da América.
Porém, muito se tem discutido sobre o seu verdadeiro papel no contexto colonial brasileiro. Seu sistema de ensino parecia satisfazer as exigências básicas daquele tempo.
Mas, apesar de seu pioneirismo, os Jesuítas terminaram por se esgotar nos seus tradicionalismo rígido e fanatismo religioso.
Expulsos do território brasileiro, os padres e irmãos inacianos devem, hoje, ser pensados como parte fundamental da construção da sociedade colonial brasileira, pois para isso existia a necessidade premente de catequizar os indígenas.
Assim, infere-se que, a favor desses religiosos pode-se invocar a moderação dos hábitos muitas vezes brutais – dentro da ótica do colonizador – dos nativos e a benesse de ter implantado o embrião do processo educacional no território colonial.
Acrescentando-se o fato de que a vida nos aldeamentos não encontrava sempre um cenário idílico, a Companhia criada para atender às necessidades da Igreja Católica, cumpriu, em maior ou menor escala, o objetivo ao qual se propunha quando de sua chegada às novas terras: converteu almas e educou os gentios na medida do possível, embora por uma possível falha didática, pouco tenha restado de uma cultura indígena aldeada, após a expulsão da Ordem e a desintegração das reduções.
Referências
ABREU, J. Capistrano de. CAPÍTULOS DA HISTÓRIA COLONIAL. 4 ed. Ver. Aum. Pref. José Honório Rodrigues. Rio de Janeiro: Soc. Capistrano de Abreu, Briguiet, 1954.
ALMEIDA, José Ricardo Pires de. HISTÓRIA DA INSTRUÇÃO PÚBLICA NO BRASIL: 1500-1889. São Paulo: INEP – PUC, 1989.
BORTOLOTTI, Karen Fernanda da Silva. O RATIO STUDIORIUM E A MISSÃO NO BRASIL. Tese de Mestrado. UNESP/Franca. São Paulo.
FREYRE, Gilberto. CASA GRANDE & SENZALA: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 51 ed. Ver. São Paulo: Global, 2006.
LEITE, Serafim. HISTÓRIA DA COMPANHIA DE JESUS NO BRASIL. São Paulo: Nacional, 1938, V. I.
THEOBALDO, Carlos Eduardo Pereira. OS PERCALÇOS DA LÍNGUA PORTUGUESA. Revista Rio Total. Coojornal. N. 305. Rio de Janeiro, 2003.
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