A
Dimensão Indígena No Contexto Do Ensino Superior
INTRODUÇÃO
A
construção do conhecimento constitui possivelmente o maior patrimônio de uma
nação; o conhecimento formado nas bases sócioculturais, não apenas identificam
o indivíduo, mas igualmente lhe conferem o pertencimento a um grupo social, lhe
conferem identidade, neste sentido procuramos desenvolver este artigo baseado
na visão sociocultural da integração curricular, usamos como recorte a dimensão
indígena, posto haver um projeto de implementação da universidade das culturas
indígenas já para 2015 no Brasil.
Ainda
que os fatores determinantes da organização curricular se entrelacem,
objetivando atender a propostas comuns, público alvo, sociedade em que a IES
está inserida, quem são os agentes do desenvolvimento, etc. tal organização e eleição não é espontânea, é
construída, baseada num planejamento, na organização e trabalho coletivos.
O
PROFESSOR E A LEI 11.645/08 E A
FACULDADE DAS CULTURAS INDÍGENAS
O Brasil
costuma reconhecer-se pela cordialidade, de fato criamos um mito do homem
cordial; mas quando ponderamos sobre as diversas culturas que contribuíram para
a formação do povo brasileiro nos obrigamos a repensarmos tal conceito.
Numa
sociedade em que tudo é mercantilizado; rendemo-nos ao processo globalizado de comercialização
massiva de valores culturais e tornamo-nos exterminadores de culturas divergentes,
expropriamos ao longo dos séculos duas matrizes de nossa base sóciocultural, a
africana e a indígena, e submetemos estas minorias étnicas a processos históricos de desqualificação e exclusão.
A lei
11.645 de 2008 que torna obrigatória nas escolas brasileiras de ensino
fundamental e médio, públicas ou particulares a temática indígena, nos
apresentou um problema de construção curricular; como trabalhar a temática indígena em sala de
aula se ao longo da História comportamo-nos como genocídas? Historicamente nos
ocupamos em criar modelos excludentes deste grupo, desqualificamos seus
valores, crenças, rejeitamos seus idiomas e dialetos, ao ponto de existir na
atualidade grupo indígenas que desconhecem completamente seu idioma original, e
quando se perde a própria língua começamos a perder conceitos fundamentais de
pertencimento.
Como
construir, então um currículo acadêmico que prepare o profissional docente para
esta realidade, um currículo que recupere os valores culturais indígenas se de
fato não sabemos nem ao certo quantos são?
Em
termos absolutos temos menos indígenas que o Chile, ou a Argentina, porém com
uma diversidade cultural imensa, fala-se no Brasil em cerca de 300 ou mais
etnias. Porque a história dos indígenas do Brasil não se encontra nos livros?
Trabalhar
a formação do profissional docente a partir de valores éticos em relação à
diversidade étnica no Brasil, atuar com a alteridade entender que o “outro”
está mormente vinculado ao “nós”, à nostridade, traduz o almejado diálogo
acadêmico, torna o desafio, não apenas no tocante às escolas indígenas, mas
igualmente na inclusão das disciplinas relacionadas ao tema enormes a começar
pela própria diversidade étnica; à exemplo dos portugueses de mais de
quinhentos anos atrás, é comum rotularmos quaisquer ameríndios como membros de
uma mesma etnia e detentores do mesmo patrimônio cultural, da mesma estrutura
social ou base linguística, quando na verdade não o são.
A mesma
diversidade étnica cultural que causou a confusão em Caminha nas suas cartas
descrevendo à coroa os povos da costa do descobrimento como tupi,
posteriormente verificado como Aimorés, Tupiniquins,
Tupinambás, Pataxós, etc.
A
construção e a utilização do conhecimento compreendem um
desafio para os profissionais ligados á gestão escolar, trabalhar o
conhecimento acadêmico e as experiências de cada grupo, de forma dialética,
respeitando as diferenças e vendo nisso um diferencial positivo, (aprendemos
mais, não “apesar de sermos diferentes”, mas “porque somos diferentes”).
Na área
de estudos étnicos indígenas ainda encontramos muitos profissionais dispersos
em meio à organização acadêmica regional, ou local, não se pode usar o modelo
de ensino aprendizagem aplicado nas reservas urbanas do sul da Bahia, em são
Paulo, ou desta no interior de Rondônia, as dimensões e as diferenças econômicas,
linguísticas, de crenças, morais, socioculturais entre os povos inviabiliza
qualquer projeto de padronização, mas é possível balizarmos alguns pontos em
comum.
Quando fomentamos
a produção local de artigos, de pesquisa, de literaturas, estamos - independente do grupo étnico - trabalhando conceitos de organização
curricular baseada nos valores culturais.
Trazer o
mito de origem, os contos e narrativas para o meio acadêmico na produção de
materiais que atendam a um currículo integrado, onde as disciplinas conversem
como História, Geografia, Artes, Antropologia, Sociologia e Literatura, por
exemplo, alicerçará o levantamento e o planejamento, processos internos das
escolas voltadas às características singulares.
E ainda
que constitua a fase inicial, este levantamento ou planejamento não se basta, a gestão do conhecimento envolve,
além do gerenciamento do processo de criação de conhecimento dentro da IES,
segundo nos conceitua Zabot e Silva (2002,p. 71), “a capacidade
de disseminar tal conhecimento de incorporá-lo ao sistema”.
É
necessário trabalharmos igualmente a sociedade, de modo garantir a
operacionalização do processo formativo dos profissionais de ensino, neste
sentido o Ministério da Cultura tem a pretensão de criar, em 2015 uma rede universitária que contemple os
conhecimentos produzidos pelos índios brasileiros, objetivando o reavivamento
cultural e correção histórica desta matriz; usando como molde os parâmetros EAD
(ensino a distância).
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
Numa
rara demonstração de “via de mão dupla” no conhecimento a proposta é trazer
para os bancos acadêmicos os saberes indígenas, trabalhando a formação de profissionais
de todas as áreas, e não apenas os docentes, a partir da dimensão de tais
conhecimentos, do reconhecimento dos valores culturais, da estrutura social e
de todo o arcabouço intelectual dos ameríndios brasileiros, corrigindo desta
forma o atual modelo de escolarização, em que impomos nossa “escola de branco”,
etnocêntrica, positivista dentro do seio das reservas.
Novos
conhecimentos certamente hão de advir desta reconfiguração de algumas IES, do acréscimo e da categorização do universo
de saberes indígenas ao relacionamento do processo de aprendizagem.
O
levantamento e diagramação destes conhecimentos na forma de manuais,
documentos, resgate de histórias orais cria a oportunidade de compartilharmos
tal conhecimento formando então a educação integral, pavimentada não na ótica
mercantil ou na ideologia de alguns professores, gestores ou coordenadores, mas
através de uma discussão coletiva que envolva toda a sociedade.
REFERÊNCIAS
BRASIL,
S.E.E.F. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos:
Apresentação dos Temas Transversais - Secretaria da Educação Fundamental –
Brasília: MEC/SEF, 1998.
BRASIL. Constituição
da República Federativa do Brasil, 05/10/1988.
BRASIL.
Lei 10.639/03, de 09 de janeiro de 2003.
BRASIL.
Lei 11.645/08. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, para
incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática
"História e Cultura Afro-brasileira e Indígena".
BRASIL.
Lei 9394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Câmara dos
Deputados, Brasília/DF, 1996.
BRASIL,
Secretaria Especial de Política de Promoção da Igualdade Racial. Ministério da
Educação-MEC. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais
e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília/DF,
2005
CARVALHO,
Rosângela Tenório. de Interculturalidade objeto de saber no campo
curricular da Educação de Jovens e Adultos, UFPE, disponível em
http://www.anped.org.br/reunioes/27/gt18/t189.pdf, acessado em 12/04/2014.
GEERTZ,
Clifford. O Saber Local 2010 in A interpretação das culturas - l.ed.,
IS.reimpr. - Rio de Janeiro : LTC, 2008.
SILVA,
A. L; FERREIRA, M. K. L. (Org.). Antropologia, História e Educação. 2.ed.
Global: São Paulo, 2000.
ZABOT,
J. B. M.; SILVA, L. C. M. da. Gestão do conhecimento: aprendizagem e tecnologia
construindo a inteligência coletiva. São Paulo: Atlas, 2002
Nenhum comentário:
Postar um comentário