INTRODUÇÃO
Objetiva o presente
artigo analisar as práticas políticas preconizadas durante a
República Velha
(1889-1930) suas estruturas político, legislativa, não apenas sob a ótica
econômica, embora não se possa furtar ao tema, mas igualmente estabelecer um
contraponto com o atual contexto político do Brasil, enfocando também a
redemocratização1
do
sistema político (1986 – 2012).
Os esforços
empreendidos com fins identificar não apenas resquícios das práticas que
caracterizaram o sistema político conhecido como coronelismo, e também
estabelecer um paralelo entre o posicionamento político-Legislativo entre o
ocaso do Século XIX e primeiros anos do Século XX e o cenário descortinado na
atualidade.
Para tanto lancei mão
de uma obra clássica sobre a matéria a ser discutida,
Coronelismo, enxada e
voto de
Victor Nunes Leal, uma literatura básica para se pesquisar sobre o tema, dentre
outros autores, pois esta obra disseca o sistema político vigente a época onde
os coronéis tinham um papel fundamental neste sistema.
POLÍTICA
Um conhecido
dicionário traz as seguintes definições para o verbete "política":
• Princípio
doutrinário que caracteriza a estrutura constitucional do Estado.
• Sistema de regras
respeitantes à direção dos negócios públicos.
• Maneira hábil de agir,
astúcia, ardil, artifício, esperteza.
A última definição é,
sem dúvida, a que melhor caracteriza a política em nossa época. Aliás, o termo
"politiqueiro", definido nos dicionários como "aquele que em
política se utiliza de processos menos corretos", e também "indivíduo
intrigante, mexeriqueiro", apareceu pela primeira vez no ano de 1899, como
que num prenúncio do que seria a política nos séculos seguintes;
Sinônimo ainda de
corrupção e patrimonialismo, ou atuação em benefício próprio, a política atual
é mais um dos frutos podres que a humanidade tem de deglutir, um efeito
decorrente da atuação errada de povos inteiros, um carma coletivo.
Os dirigentes
deveriam ser pessoas que trouxessem si um sentido incorruptível da verdadeira
justiça e, com a sua visão mais ampla que os demais, estivessem aptos a reconhecer de que forma
deveriam conduzir o povo, para que este alcançasse seu máximo desenvolvimento.
Uma maneira de governar que sequer se consegue imaginar, preferimos taxá-la de
fantasia.
Assim quais práticas
que figuram na atual política brasileira, são pertinentes aos coronéis tão bem
caracterizados por Leal? Perdura ainda no atual contexto político brasileiro o
poderoso líder regional? Os coronéis de hoje se utilizam de novas ferramentas
de dominação do eleitorado? Por que os potentados obtiveram do governo federal
o direito de possuir repetidoras de jornais, rádio, televisão e mais
recentemente da informação digital? Estas são algumas questões que nortearam a
pesquisa, e que espero sejam respondidas no decorrer do mesmo, pois este é o
objetivo principal do trabalho.
Na metodologia
aplicada, utilizarei alguns trechos de discurso de políticos,
pronunciamentos,
entrevistas, matéria de jornais e revistas, que possam me auxiliar na confecção
do artigo, a fim de estabelecer algumas semelhanças entre antigas e recentes
estruturas político-legislativas, entre os velhos coronéis e os novos coronéis.
Tomaremos como ferramenta de trabalho a pesquisa bibliográfica, por se tratar
de um ótimo mecanismo na busca de documentos e materiais que se encaixem
perfeitamente no tema estudado.
REPÚBLICA DA ESPADA
República Velha é o
nome dado ao período que inicia-se com o Golpe Militar conhecido como
Proclamação da República em 1889 e terminou com o movimento de 1930 que depôs o
presidente Washington Luis.
Durante esse período
as oligarquias consolidaram-se no poder, apoiadas em sua riqueza, mas também em
uma estrutura política típica, desenvolvida pelas elites.
No entanto, não
podemos imaginar que, apesar de controlarem o poder de forma hegemônica durante
mais de 30 anos, essa tenha sido uma tarefa fácil. Os trabalhadores,
marginalizados politicamente e explorados economicamente rebelaram-se diversas
vezes contra o poder das oligarquias, tanto nas cidades como no campo.
Na República Velha,
desde sua proclamação houve revoluções, golpes e contragolpes dentro de golpes.
Segundo alguns
relatos históricos, no momento da derrubada do Primeiro Ministro Ouro Preto no
Campo de Santana, Deodoro da Fonseca impediu o brado de Viva a República e leu
um manifesto contra o governo do Primeiro Ministro que foi preso.
Consta que não
dirigiu crítica ao Imperador e que vacilava em suas palavras.
Relatos dizem que foi
uma estratégia para evitar derramamento de sangue. Sabia-se que Deodoro da Fonseca estava com o
Tenente-coronel Benjamin Constant ao seu lado e que não havia civis naquele
momento. A classe dominante, descontente com o Império que incentivou o golpe,
não foi para vê-lo consumado. Nota-se que a própria proclamação da República
não alterou as estruturas sócio-econômicas do Brasil imperial. A riqueza
nacional continuou concentrada em poucas famílias elitistas, enquanto na
economia predominava o sistema agrícola de exportação, baseado na monocultura e
no latifúndio. Se houve alguma mudança com a proclamação da República foi uma
mudança na classe social que passou a dominar a política brasileira: os grandes
cafeicultores paulistas, que tiraram o poder das antigas elites cariocas e
nordestinas.
Proclamada a
República, na mesma noite de 15 de novembro de 1889 formou-se o Governo
Provisório, com o Marechal Deodoro como chefe de governo. Eis o primeiro
ministério da República:
• Interior: Aristides
da Silveira Lobo;
• Relações
Exteriores: Quintino Bocaiúva;
• Fazenda: Rui
Barbosa;
• Guerra: tenente-coronel
Benjamin Constant;
• Marinha: Eduardo
Wandenkolk;
• Agricultura,
Comércio e Obras Públicas: Demétrio Nunes Ribeiro;
• Justiça: Manuel
Ferraz de Campos Sales.
A ECONOMIA E O
ENCILHAMENTO
Na corrida de
cavalos, a iminência da largada era indicada pelo seu encilhamento, isto é,
pelo momento em que se apertavam com as cilhas (tiras de couro) as selas dos
cavalos. É o instante em que as tensões transparecem no nervosismo das apostas.
Por analogia, chamou-se "encilhamento" à politica de emissão de dinheiro
em grande quantidade que redundou numa
desenfreada especulação na Bolsa de Valores.
Para compreender por
que o Governo Provisório decidiu emitir tanto papel-moeda, é preciso recordar
que, durante a escravidão, os fazendeiros se encarregavam de fazer as compras
para si e para seus escravos e agregados. E o mercado de consumo estava
praticamente limitado a essas compras, de modo que o dinheiro era utilizado
quase exclusivamente pelas pessoas ricas. Por essa razão, as emissões de moeda
eram irregulares: emitia-se conforme a necessidade e sem muito critério.
A situação mudou com
a abolição da escravatura e a grande imigração. Com o trabalho livre e
assalariado, o dinheiro passou a ser utilizado por todos, ampliando o mercado
de consumo.
Para atender à nova
necessidade, o Governo Provisório adotou uma política emissionista em 17 de
janeiro de 1890. O ministro da Fazenda, Rui Barbosa, dividiu o Brasil em quatro
regiões, autorizando em cada uma delas um banco emissor. As quatro regiões
autorizadas eram: Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul. O
objetivo da medida era o de cobrir as necessidades de pagamento dos
assalariados - que aumentaram desde a abolição - e, além disso, expandir o
crédito a fim de estimular a criação de novas empresas.
Todavia, a
desenfreada política emissionista acarretou uma inflação incontrolável, pois os
"papéis pintados" não tinham como lastro outra coisa que não a
garantia do governo. Por isso, o resultado foi muito diverso do esperado: em
vez de estimular a economia a crescer, desencadeou uma onda especulativa. Os
especuladores criaram projetos mirabolantes e irrealizáveis e, em seguida,
lançaram as suas ações na Bolsa de Valores, onde eram vendidas a alto preço.
Desse modo, algumas pessoas fizeram fortunas da noite para o dia, enquanto seus
projetos permaneciam apenas no papel.
Em 1891, depois de um
ano de orgia especulativa, Rui Barbosa se deu conta do caráter irreal de sua
medida e tentou remediá-la, buscando unificar as emissões no Banco da República
dos Estados Unidos do Brasil. Mas a demissão coletiva do ministério naquele
mesmo ano frustrou a sua tentativa.
Esta primeira fase do
período republicano, conhecida como República da Espada, marcado pelos os
marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. Época de transição do regime
monárquico para o republicano, além deste desastre inflacionário promovido por
Rui Barbosa eram comuns os levantes populares e a repressão a focos de
resistência monárquica. O governo de Deodoro da Fonseca foi particularmente
marcado por greves e pela Primeira Revolta da Armada, Depois de elaborar a
Constituição de 1891, a Assembléia Constituinte foi transformada em Congresso
Nacional e, nessa condição, deveria eleger os primeiros presidente e
vice-presidente da República.
UM SISTEMA LEGISLATIVO
Como primeiras o
Governo Provisório, assim formado, decretou o regime republicano e federalista
e a transformação das antigas províncias em "estados" da federação. O
Império do Brasil chamava-se, agora, com a República, Estados Unidos do Brasil
- o seu nome oficial.
Em caráter de
urgência, foram tomadas também as seguintes medidas: a "grande
naturalização", que ofereceu a cidadania a todos os estrangeiros
residentes; a instituição do casamento e do registro civil. Porém, dentre as
várias medidas, destaca-se particularmente o "encilhamento", adotado
por Rui Barbosa, então ministro da Fazenda, já visto e que dará base a inúmeras
revoltas e enfraquecimentos que levarão ao fim da republica da espada.
O Poder Legislativo
era exercido pelo Congresso Nacional, formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. O
poder dos estados (antigas províncias) foi significativamente ampliado com a
introdução do princípio federalista. Os estados passaram a organizar-se com
leis próprias, desde que respeitando os princípios estabelecidos pela
Constituição Federal. Seus governantes, denominados presidentes estaduais,
passaram a ser eleitos também pelo voto direto.
Foi abolida a
religião oficial com a separação entre o Estado e a Igreja Católica, cuja
unidade era fixada pela antiga Constituição Imperial caracterizando a laicidade
do Estado e o fim do padroado.
Durante grande parte
da Primeira República (1889-1930) desenvolveu-se um intenso debate sobre a
necessidade de se reformar a Constituição de 1891, muitos reformadores
defendiam a ampliação dos poderes da União e do presidente da República como
forma de melhor enfrentar as pressões advindas dos grupos regionais. A Emenda
Constitucional de 1926 viria, em parte, atender a essas demandas
centralizadoras. A Revolução de 1930 encerraria o período de vigência dessa
primeira carta republicana.
Abaixo detalhe da
Constituição de 1891 e seus primeiros artigos
O FECHAMENTO DO
CONGRESSO
Articulada uma chapa
oposicionista, ligada aos interesses das oligarquias estaduais paulistas e liderada por Prudente
de Morais, foi, porém, derrotada. Os rumores sobre a intervenção militar para
impor Deodoro, caso não vencesse as eleições, garantiram sua vitória. Em
compensação, o candidato oposicionista à vice-presidência, Floriano Peixoto, derrotou
o vice de Deodoro.
Não dispondo de
maioria parlamentar, Deodoro sofreu várias derrotas no Congresso, que vetou
muitos de seus projetos. Não conseguindo conviver politicamente com o
Congresso, Deodoro dissolveu-o e prendeu seus principais líderes. Recebeu apoio
de parte do Exército e de vários presidentes estaduais.
A República Velha foi
marcada também pelo enfraquecimento do Poder Legislativo.
Eleito pelo Congresso
Nacional (indiretamente), Deodoro passou a enfrentar a oposição do Congresso e
da população devido à crise econômica.
Entre agosto e
novembro de 1891, o Congresso tentou aprovar a Lei de Responsabilidades, que
reduzia os poderes do presidente, mas Deodoro contra-atacou e decretou a
dissolução do Congresso em 3 de novembro de 1891. Na mesma data, lançou um
"manifesto à Nação" para explicar os motivos do seu ato.
Tropas militares
cercaram os prédios do Legislativo e prenderam líderes oposicionistas.
Deodoro decretou
estado de sítio (suspensão dos direitos civis) e oficializou a censura à imprensa.
Ao assumir, em 23 de novembro de 1891, Floriano Peixoto anulou o decreto de
dissolução do Congresso e suspendeu o estado de sítio.
Congressistas
liderados por Floriano, Wandenkolk e Custódio de Melo arquitetaram então um contragolpe, ao qual
Deodoro tentou resistir, ordenando a prisão do almirante Custódio de Melo. Este
reagiu sublevando uma esquadra, cujos navios postaram-se na baía de Guanabara,
ameaçando bombardear o Rio de Janeiro, caso Deodoro não renunciasse.
Sem alternativa,
Deodoro renunciou e entregou o poder ao vice-presidente Floriano Peixoto, em 23
de novembro de 1891. Peixoto, ao assumir a presidência, desenvolveu uma
política econômica e financeira voltada para a industrialização: tarifas
protecionistas e facilidades de crédito foram concedidas, porém, acompanhadas
de medidas para controlar a inflação e impedir a especulação.
As mesmas oligarquias
que apoiaram o golpe para a derrubada de Deodoro, passaram a fazer oposição a
Floriano, fundamentando-se no artigo 42 da Constituição, que dizia: "Se,
no caso de vaga, por qualquer causa à Presidência, não houver decorrido dois
anos do período presidencial, proceder-se-á a novas eleições".
A POLÍTICA DOS
GOVERNADORES
Ratificada por Campos
Sales (1898-1902), a "política dos governadores" consistia no
seguinte: o presidente da República apoiava, com todos os meios ao seu alcance,
os governadores estaduais e seus aliados (oligarquia estadual dominante) e, em
troca, os governadores garantiriam a eleição, para o Congresso, dos candidatos
oficiais. Desse modo, o poder Legislativo, constituído por deputados e
senadores aliados do presidente - poder Executivo -, aprovava as leis de seu
interesse. Estava afastado assim o conflito entre os dois poderes.
Em cada estado
existia, portanto, uma minoria (oligarquia) dominante, que, aliando-se ao
governo federal, se perpetuava no poder. Existia também uma oligarquia que
dominava o poder federal, representada pelos políticos paulistas e mineiros.
Essa aliança entre São Paulo e Minas - que eram os estados mais poderosos -,
cujos lideres políticos passaram a se revezar na presidência, ficou conhecida
como a "política do café com leite".
Nota-se que mesmo
durante a República da Espada, as oligarquias agrárias formaram a base
governamental. O poder dos militares sucumbiu à força política dos barões do
café de São Paulo e aos pecuaristas de Minas Gerais. Com a instituição de
eleições diretas, os cafeicultores paulistas conseguiram eleger Prudente de
Moraes. Seu governo iniciou a política do café com leite (divisão do
poder entre paulistas e mineiros), que norteou a segunda fase da República
Velha, conhecido como República Oligárquica (1894-1930).
Vemos assim que a
República tornou-se possível, em grande parte, graças à aliança entre militares
e fazendeiros de café. Esses dois grupos tinham, entretanto, projetos distintos
em relação à forma de organização do novo
regime: os primeiros eram centralistas e os segundos, federalistas. Os
militares não eram suficientemente poderosos para impor o seu projeto nem
contavam com aliados que pudessem lhes dar o poder de que precisavam.
Os cafeicultores, ao
contrário, contavam com um amplo arco de aliados potenciais e compunham,
economicamente, o setor mais poderoso da sociedade. A partir de Prudente de
Morais, que, em 1894, veio a suceder Floriano, o poder passou definitivamente
para esses grandes fazendeiros. Mas foi com Campos Sales (1891a 1902) que uma
fórmula política duradoura de dominação foi finalmente elaborada: a
"política dos governadores”.
CICLO DA BORRACHA
Outra característica
da República Velha foi a valorização da borracha, no final do século XIX,
advento da vulcanização coincide com a descoberta dos grandes seringais nativos
no Rio Purus. Acontece no Acre, provocado pelo início da demanda das industrias
norte-americanas e européias pela borracha, o primeiro movimento de imigração
vindo do nordeste do Brasil. Este movimento migratório quase provocou uma
guerra com a Bolívia, que na mesma época tentava instalar postos aduaneiros nos
rios Madeira, Purus e Juruá. Milhares de imigrantes, principalmente nordestinos
fugidos da seca da década de 1870, invadem a floresta para recolher o látex e
transformá-lo em borracha.
Os novos
seringalistas se apropriaram de áreas enormes de Floresta para extrair o látex
das seringas. Os índios nas áreas de Juruá e Purus tentaram defender suas
terras deles, mas tendo só arco e flecha não conseguiram. Assim, foram extintos
a maioria dos índios. Muitos também morreram das doenças como tuberculose e
sarampo, as quais não existiam antes entre os índios e foram trazidas pelos
novos imigrantes. A mão de obra dos índios submetidos foi explorada para
recolher o látex e construir estradas.
Por quase cinqüenta
anos, da segunda metade do século XIX até a segunda década do século XX, a
borracha natural sustentou um dos mais importantes ciclos de desenvolvimento do
Brasil. Naquela época, a revolução industrial se expandia velozmente e o mundo
vivia período histórico de prosperidade e descobertas que se refletiam em todos
os setores. Automóvel, bonde, telefone, luz elétrica e outras inovações mudavam
paisagem e costumes nas cidades. Novos mercados se abriam. Era a “belle
époque”, cujo esplendor a literatura e o cinema se encarregaram de retratar
para as gerações seguintes.
As cidades
amazonenses crescem, impulsionadas pelo desenvolvimento do comércio
extrativista da região e começa a experimentar anos de prosperidade,
acentuadamente após 1888, quando Dunlop descobre o pneumático para bicicletas,
mais tarde aplicado nos automóveis pelos irmãos Michelin. A produção amazônica
chega a 42 mil toneladas anuais e o Brasil domina o mercado mundial de borracha
natural em 1912 alimentada pelo aquecimento da indústria automobilística dos
Estados Unidos. O interesse norte-americano pela borracha levou o Brasil a
comprar o território que hoje corresponde ao estado do Acre, então pertencente
à Bolívia. Na negociação foi conduzida pelo barão de Rio Branco, o Brasil pagou
um milhão de dólares à Bolívia e construiu a estrada de ferro Madeira-Mamoré,
que facilitaria o escoamento da borracha e de produtos da Bolívia, sem saída
para o mar.
O ciclo da borracha
trouxe progresso à região amazônica, especialmente a Belém e Manaus. A borracha
chegou a ocupar o segundo posto de nossas exportações, perdendo apenas para o
café. Com o aumento da importância da borracha no cenário internacional, os
ingleses apanharam sementes de seringueira no Brasil e fizeram plantações na
Malásia. Com o passar do tempo, a produção da Malásia superou a brasileira.
PRÁTICAS POLÍTICAS NA
REPÚBLICA VELHA – CORONELISMO, FILHOTISMO E MANDONISMO
Por toda Repúbica, a
época o tratamento de "coronel" passou a ser dado pelos sertanejos a
qualquer chefe político, não necessariamente dono de terras e nem sempre de acordo com a condição financeira do
indivíduo, dependia muito da liderança carismática como chefe local e de sua
capacidade de exercer as funções do Estado em seus domínios territoriais. Eles
concentravam grande poder, porque se tornaram peças importantes no desempenho
do sistema oligárquico, realizando a mediação entre os Governadores e o
eleitorado do Município, eram eles que indicavam os ocupantes para os diversos
cargos municipais e comandavam um lote considerável de votos de cabrest.o
O fenômeno que
existiu na vida política do interior do Brasil tinha características de
política municipal, é considerado uma espécie peculiar de ethos político,
um conceito brasileirista, específico da República Velha num sistema
representativo eleitoral onde existia voto e eleição e concentração de terra em
grandes propriedades. A maioria da população morava nas terras de outros e
estava sujeita aos seus donos, numa dependência econômica e social inadequada,
marcada pela pobreza. A maioria dos eleitores, 70% pertencia à população rural.
É necessário regressarmos um pouco no tempo, até a época imperial, no Império
havia fazendeiros que exerciam poder regional, mas não havia coronelismo. Esta
era, sobretudo, um compromisso, uma troca de favores, caracterizada pelo poder
público progressivamente fortalecido e pelo poder privado em decadência em
relação à influência social dos senhores de terras, o ponto de encontro destas
duas retas oferecia o ponto ótimo para a existência do coronelismo, portanto
este fenômeno tinha relação com a estrutura agrária e estava baseado na
sustentação das manifestações de poder privado.
O coronelismo foi
pesquisado por Leal em sua obra Coronelismo, enxada e voto (1976), no
qual ele pretendia analisar o sistema político, mas para tanto teve que se
embrear pelo caminho que o levou ao encontro com a figura do "coronel".
O vocábulo tinha sua
origem nos "coronéis" da extinta Guarda Nacional, nascida em 1831,
por iniciativa do padre Diogo Antonio Feijó, com o objetivo de manter a ordem
interna. A Guarda Nacional existiu por quase um século, tendo sobrevivido até 1918,
havendo um regimento em cada município e o posto de coronel era concedido ao
chefe político da comuna. O poder dos coronéis se favoreciam basicamente pelo
sistema de clientela e patronagem, no qual eles recebiam a patente de coronel
ou mesmo as compravam assumindo assim o posto de oficial da Guarda Nacional e a
representação local das autoridades do Império, gozando de privilégios e cargos
de confiança, normalmente era o mais rico comerciante, ou fazendeiro. O termo
é, nos dias da publicação, ainda utilizado para identificar aqueles que
mandavam na política local.
Qualquer que seja,
entretanto, o chefe municipal, o elemento primário desse tipo de liderança é o
"coronel", que comanda discricionariamente um lote considerável de votos
de cabresto. Recurso através do qual eram eleitos os chefes políticos
locais (municipais), regionais (estaduais) e federal (o governo central). A
fraude, a corrupção, e o favorecimento permeavam todo o processo eleitoral de
modo a deturpar a representação política.
No âmbito municipal
os coronéis locais dependiam do governador para obtenção de auxílio financeiro
para obras públicas e benfeitorias gerais, daí a necessidade de apoiar e obter
votos para os candidatos de determinada facção das oligarquias estaduais.
As oligarquias estaduais
também dependiam de votos para conquistarem ou assegurarem seu domínio
político, daí a necessidade de barganharem com os coronéis locais. Semelhante
condição de dependência política se manifestava nas relações do governo federal
com os governos estaduais.
As rivalidades, lutas
e conflitos armados entre coronéis de pouca ou grande influência e pertencentes
a diferentes oligarquias agrárias eram comuns, fazendo da violência um
componente constitutivo e permanente do sistema de dominação política da República
Velha. A força eleitoral empresta-lhe
prestigio político, natural coroamento de sua privilegiada situação econômica e
social de dono de terra.
A figura do coronel
representava ainda a de uma pessoa que aglutinava várias
funções sociais,
exercidas, sobretudo com a forte influência que tinha sobre seus dependentes
bem como os aliados, empregados e capangas2, senão vejamos:
Dentro da esfera
própria de influência, o "coronel" como que resume em sua pessoa, sem
substituí-las, importantes instituições sociais. Exerce, por exemplo, uma ampla jurisdição sobre seus
dependentes, compondo rixas e desavenças e proferindo, às vezes, verdadeiros
arbitramentos, que os interessados respeitam. Também se enfeixam em suas mãos,
com ou sem caráter oficial, extensas funções policiais, (LEAL, 1976, p. 23)
Podemos entender a
influência social desses “coronéis” fazendo referencia à estrutura agrária do
país. “O “coronelismo” é, sobretudo, um
compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente
fortalecido e a decadente influência
social dos chefes locais” (p.20). O poder desses fazendeiros e a sua importância
para o poder público se dão pela forma de representação proporcional e a então
recente ampliação do sufrágio, porque “o governo
não pode prescindir do eleitorado rural, cuja situação de independência ainda é incontestável” (p.20).
Os chefes políticos
que não são “coronéis” são ligados a essa classe de gente. Mas “qualquer que
seja, entretanto, o chefe municipal, o elemento primário desse tipo de liderança
é o “coronel” que comanda discricionariamente um lote considerável de votos de cabresto” (p.23). Ele exerce
uma ampla jurisdição e poderes de polícia sobre seus dependentes. A sua
qualidade de proprietário rural faz com que ele seja considerado rico por esse
povo sertanejo sofrido, justamente por ter acesso à educação, boa alimentação,
saneamento básico e outros “luxos” que não chegam às camadas populares do
campo. Essa falta de estrutura é “remediada” pelo “coronel” que passa a ser
visto como um benfeitor, sendo “... dele, na
verdade, que recebe os únicos favores que sua obscura existência conhece.
Em sua situação, seria ilusório pretender que esse novo pária tivesse
consciência do seu direito a uma vida melhor e lutasse por ele com independência
cívica” (p.25).
“Para se
compreender melhor a influência política dos fazendeiros, tão importante no
mecanismo da liderança local, cumpre examinar alguns aspectos de distribuição
da propriedade e da composição das classes na sociedade rural” (p.26).
O autor aponta o
crescimento numérico das pequenas e médias propriedades, apesar do percentual
de concentração não ter diminuído. Com a instalação da República Velha que tem
na historiografia tradicional a versão que a "proclamação da República
resultou de crises que abalaram o fim do Segundo Reinado e basicamente nas
instituições como: Religiosa e Militar, bem como a abolição da
escravatura" (VIOTTI, 1998, p. 447) o coronelismo teve sua atuação incrementada,
sobretudo pela manutenção do sistema eleitoral pautado em voto aberto,
facilitando, portanto a pressão do líder local em relação ao eleitorado. A formação
dos currais eleitorais era de certa forma constituída dentro dos domínios fundiários
do coronel, valorizando a formação de grandes potentados, juntamente com o
fortalecimento do "voto de cabresto".
Portanto, o líder
municipal ocupava sem sombra de dúvidas um lugar de extremo privilégio nos seus
domínios de influência, que o tornava um parceiro muito interessante para o
desenvolvimento político das grandes oligarquias agrárias, as verdadeiras
elites que estavam no poder justamente com o apoio do coronel e que ao longo do
século XIX tiveram suas posses agrárias abaladas especificamente pela diminuição
e extinção da mão-de-obra escrava e não obstante o esfacelamento dos preços das
monoculturas3
de café
algodão e açúcar, e o fortalecimento de algumas atividades comercias, como
podemos notar no texto de Faoro: a chamada elite agrária, forte e altiva nos
seus latifúndios, some diante do ardente círculo dos negócios: ela está
subordinada, pelos interesses da escravidão, ao "monopólio de outros
monopólios comerciais" (...)
o Segundo Reinado será o paraíso dos comerciantes, entre os quais se incluem os
intermediários honrados e os especuladores prontos para o bote à presa, em
aliança com o Tesouro (FAORO, 2001, p. 500).
Leal disseca ainda a
perpetuação do coronelismo em face das representações políticas e sociais
inadequadas e um setor privado que como já vimos, exerce grande influência
setorial, causando justamente uma superposição do privado em detrimento do
público, que torna o coronelismo exatamente uma troca de favores, ou seja, uma
verdadeira rede de clientelismo. Um comprometimento entre o poder público e o
poder privado, no qual podem coexistir amplamente na esfera municipal. (LEAL,
1976, p. 20)
O coronel encontra no
meio rural o alicerce primordial para alcançar o mais amplo domínio político,
pois o homem do campo "tira a sua sobrevivência" essencialmente das terras do coronel, onde
segundo Leal ele vive na mais completa miséria, ignorância e abandono. A grande
massa de trabalhadores tinha na figura do coronel um homem rico e próspero,
portanto capaz de em qualquer momento poder ajudá-los, com qualquer tipo de
ajuda, seja ela com remédios, empréstimos em dinheiro e até mesmo com proteção
contra querelas com famílias rivais, fomentando mais ainda o voto de cabresto,
pois: "O lógico é o que presenciamos: no plano político, ele luta com o
'coronel' e pelo 'coronel'". (LEAL, 1976, p. 25).
Uma característica
marcante do fenômeno coronelístico tem como base também o patrocínio do grande
chefe local de todas às custas eleitorais, portanto quanto maior sendo as
posses do coronel maior chance ele terá no pleito. As despesas são das mais
variadas, pois o meio rural era, sobretudo paupérrimo, configurando assim a total
dependência do eleitorado ao seu protetorado, causando uma obediência incondicional
ao líder local, conforme o trecho: Sem dinheiro e sem interesse direto, o
roceiro não faria o menor sacrifício nesse sentido. Documento, transporte,
alojamento, refeições, dias de trabalho perdidos, e até roupa, calçado, chapéu para
o dia da eleição, tudo é pago pelos mentores políticos empenhados na sua
qualificação e comparecimento. (LEAL, 1976, p. 35)
Embora o poder
privado estivesse em decadência, a República Velha não era capaz de governar
sem o seu apoio, por isto, o poder público alimentava os privatismos, porque
dependia do eleitorado rural, e em conseqüência do poder privado municipal.
Do compromisso entre
os dois resultavam as características secundárias do sistema "coronelista":
o mandonismo, o filhotismo, o falseamento do voto e a desorganização dos
serviços públicos locais. práticas bastante corriqueiras.
O filhotismo, fruto
de um inadequado corpo burocrático tanto no contexto federal como no estadual
e, portanto, acentuado no município, onde imperava uma troca de favores entre
os agregados políticos do coronel, que exerciam cargos e eram seus agregados e
protegidos, sendo ou não parentes. O dinheiro dos bens e serviços municipais
eram utilizados nos pleitos eleitorais, perpetuando-se assim, por meio de seus
afilhados, toda a máquina municipal, que frequentemente era usada para custear
gastos com as verdadeiras batalhas políticas, onde era utilizado desde dinheiro,
até a mão-de-obra municipal, por meio desta ocorrência o coronel conseguia
manter-se no comando do município por muito tempo e com ele todos os seu
agregados. O que imperava realmente sobre qualquer outra coisa era a fidelidade
partidária e para tanto o chefe local dispunha de critérios, muita das vezes,
ilícitos para assegurar a seus correligionários um bom cargo na administração municipal.
O mandonismo por sua
vez servia basicamente para perseguir aos adversários ou grupos rivais,
"para os amigos pão, para os inimigos pau" ou mais delicadamente "aos
amigos se faz justiça, aos inimigos se aplica a lei". As relações do chefe
local com seus adversários raramente eram cordiais, e periodicamente eram
hostis entre os grupos, e não poderia deixar de ser, qualquer tipo de favor era
negado ao grupo rival, e também qualquer tipo de favor era tido como uma
humilhação. Nos períodos que antecediam uma eleição a convivência entre eles
ficava complicada vindo a melhorar um pouco nos períodos entre eleições. É
neste período que os coronéis podiam angariar um contingenciamento de cabos
eleitorais ou mesmo de outros coronéis para engrossar sua fileira. Os acordos
podiam ser selados até pouco tempo antes das eleições, e assegurava certa
segurança por um tempo maior, pois até que configurasse a não adesão ao grupo
que estava na situação, podiam ser poupados pelos grupos dominantes, mas não
firmado o acordo logo começava a perseguição.
Segundo Leal, estas
práticas são ocasionadas, sobretudo pela falta de autonomia que se encontrava no seio do
município, onde o governo dispõe ao "coronel",da situação, uma
autonomia "extra-legal", delegando poderes que serão fundamentais para
a manutenção do sistema de liderança bem como o de compromisso, utilizando,
sempre que necessário, a violência para concretizar alianças, ou até mesmo
enfraquecer os grupos rivais. Como afirma o trecho abaixo: É justamente nessa
autonomia extralegal que consiste a carta branca que o governo estadual outorga
aos correligionários locais, em cumprimento da sua prestação no compromisso
típico do 'coronelismo'. É ainda em virtude dessa carta-branca que as autoridades
estaduais dão o seu concurso ou fecham os olhos a quase todos os atos do chefe
local governista, inclusive a violências e outras arbitrariedades (LEAL, 1976,
p. 51)
Paradoxalmente, o
"coronelismo" que tem como firmamento o enfraquecimento da estrutura
agrária dos donos de terra, que se sustentam, sobretudo na relação de poder e
prestígio, conquistados a custa de submissão políticas às oligarquias estaduais,
e apoiados na massa que depende incondicionalmente das terras e dos favores dos
coronéis, não tem se enfraquecido, como era de se esperar, principalmente com a
inadequada situação agrária do país, naquele contexto, bem como com o
fortalecimento do poder publico, o que podemos destacar é:
O fortalecimento do
poder público não tem sido, pois, acompanhado de correspondente enfraquecimento
do 'coronelismo'; tem, ao contrario, contribuído para consolidar o sistema,
garantindo aos condutores da maquina oficial do Estado quinhão mais
substancioso na barganha que o configura. Os próprios instrumentos do poder constituído
é que são utilizados, paradoxalmente, para rejuvenescer, segundo linhas
partidárias, o poder privado residual dos 'coronéis', que assenta basicamente
numa estrutura agrária em fase de notória decadência. (LEAL, 1976, p. 255)
Mas nesta visão
cumpre pontuar ainda o poder do coronel não se assenta apenas sobre a questão
do latifúndio, o poder de mando do coronel vai além do domínio das posses, mas
manda também porque reside sobre ele o prestígio e a tradicionalidade. Como
podemos notar no trecho abaixo, pode existir coronel sem latifúndio:
O coronel,
economicamente autônomo, formara o primeiro degrau da estrutura política,
projetada de baixo para cima. Se a riqueza é substancial à construção da
pirâmide, não é fator necessário, o que significa que pode haver coronéis
remediados, não senhores de terra. (FAORO, 2001, p. 700)
A análise desta
situação se faz necessária para compreender o "coronelismo", pois na
medida em que se vê o enfraquecimento "natural" do dono da terra, mas
se faz imprescindível o apoio do "oficialismo" no intuito de garantir
o domínio da corrente política local. Não obstante ainda para a compreensão do
declínio do sistema.
Como vimos, o
"coronelismo" tinha fôlego no largo eleitorado rural que basicamente dependia das terras do coronel e
com pouco ou nenhuma instrução política. A grande influência do coronel na
massa de votantes rurais fomentava a institucionalização da "política dos
governadores" que tinha como base o domínio dos governadores sobre o voto.
Entretanto o controle dos governadores sobre as urnas era de certa forma
possibilitada pelo apoio advindo dos lideres locais – os coronéis, detentores
de um fortíssimo produto de troca, o voto, ou seja, era o famoso "toma lá,
dá cá". O governo estadual precisava, para manutenção desta "política
dos governadores", que o coronel além de ter influência dentro do seu
"curral eleitoral", ou seja, a influência direta, ele possuísse
também uma ampla influência indireta, que Maria Isaura de Queiroz define como
sendo uma ampla rede de parentela, mas não a parentela de cunho antropológico,
que vai alem dos laços familiares, como ela afirma:
O grupo familiar
ultrapassa a família nuclear, pois reúne numa rede de reciprocidade, de deveres
e de direitos tios, sobrinhos, primos, além de avôs e netos estendendo-se,
portanto não só o montante quanta à jusante da grande corrente das gerações, e
espraiando-se também horizontalmente para as duas margens de modo indistinto. (QUEIROZ,
1997, P. 165)
Um outro vício da
República velha que devemos levar em consideração é a questão do falseamento do
voto e das fraudes eleitorais. Segundo Pang: "O mínimo que se pode dizer
sobre as eleições na Primeira República é que constituíam verdadeiras farsas".
(PANG, 1979, p. 34), fica claro, portanto que no período das eleições as fraudes
eleitorais eram pertinentes ao processo, pois já começava com o registro dos
eleitores que ficava a cargo do coronel escolhendo quem estava qualificado para
votar, era de se esperar um abuso de poder para barrar o alistamento dos eleitores
que não apoiavam o candidato da situação, como percebemos abaixo:
A luta pela vitória
eleitoral começava com o registro de eleitores. A pratica corrente era que cada
município ou comarca (uma distrito judicial abrangia dois ou mais municípios)
organizava três comissões para promover as eleições: uma comissão de registro
(junta de alistamento), uma comissão eleitoral executiva (junta ou mesa eleitoral),
e uma comissão de apuração (junta de apuração).[...] As três juntas eram
formadas pelo juiz da comarca nomeado pelo governador (juiz de direito) um juiz
municipal eleito pelos munícipes, e membros escolhidos dentre o eleitorado
local. (PANG, 1979, p. 34).
O cenário eleitoral
era totalmente favorável para a corrente da situação, no qual eram por demais
controlado pelo coronel local, pois os juízes eram indicados pelos governadores
o que facilitava a ação do chefe local no tocante a qualquer tipo de prática
ilegal para se ganhar uma eleição. O procedimento que imperava era a utilização
da violência para tentar inibir o registro de qualquer eleitor que por ventura apoiasse
o candidato rival, caso o registro fosse efetuado havia então um despejo de
capangas muito bem armados para intimidar os eleitores da oposição.
Quando havia
suspeitas de um pleito apertado, a violência ocorria muito antes dos registros
dos eleitores ocasionando por algumas vezes o cancelamento das eleições, por
motivo de grandes conflitos entre as correntes partidárias. Chagara ao caso de
um "coronel" guardar dentro de sua própria casa o registro de
eleitores, deixando claro que somente os que eram ligados ao coronel tinham
acesso ao registro. A compra de votos era outra prática muito comum da
República Velha, mas não parava por ai, alem de existirem eleitores que eram
remunerados pelo o voto, existiam ainda aqueles que votavam depois de mortos,
ou seja, era utilizado um registro de uma pessoa que já havia morrido, como
podemos notar no texto que segue, o contexto eleitoral marcado pela compra de
votos e pelo falseamento deles, perpetuou por algum tempo depois de finalizada
a da República Velha, vejamos:
Duas décadas após o
final da Primeira República, um oficial das Nações Unidas observou que muitos
eleitores analfabetos jogavam na urna seus cupons de almoço, em vez da cédula
que lhes era fornecida junto com o cupom de refeição pelo chefe político. A distribuição
de roupas novas, sapatos e outros bens essenciais era comum durante a campanha.
[...] Outros abusos mais sérios diziam respeito a eleitores que não existiam.
Essa pratica eleitoral
fraudulenta era
conhecida como 'bico de pena'. Nomes de pessoas falecidas vinham de túmulos do
interior; eleitores fantasmas ou 'fósforo', como eram chamados na gíria eleitoral
da época, não só eram registrados pelo coronel dominante, mas também 'jogavam
sua cédula' (PANG, 1979, p. 36).
Fica claro, portanto
que no período da República Velha o bojo das eleições era um produto da relação
entre os poderes locais, representados pelo coronel, e pelo poder federal, os
governadores e os presidentes, estes últimos que controlavam ainda com extrema
parcialidade a verificação dos diplomas dos candidatos, no qual constava a quantidade
de votos adquiridos na eleição, no que se sabe os resultados obtidos eram
analisados pela comissão de verificação, onde candidatos que não apoiavam a corrente
da situação poderia ter sua homologação cancelada, e ainda "rever as credenciais
dos deputados eleitos" (PANG, 1979, p. 56), fortalecendo cada vez mais o
chefe local, pois quando este perdia nas urnas poderia contar com o recurso dos
correligionários nas comissões de verificação, onde o que menos importava era o
voto mas sim a qual corrente o candidato estava ligado.
A Comissão de
Verificação na realidade tratava-se de uma ferramenta extra que analisava todos
os candidatos eleitos fazendo uma triagem fraudulenta de todos aqueles que eram
indesejáveis. Se de algum modo um candidato de oposição fosse eleito, essa
comissão tinha seus meios para embargar sua posse. Assim, o presidente tinha
total apoio nas bancadas do Congresso, uma vez que o Governo Federal respeitava
as decisões dos partidos dominantes de cada estado e estes permitiam o poder do
coronel em suas regiões.
No quadro abaixo o
diagrama da Hierarquia e dominação política da Republica Velha
Podemos notar ainda a
insatisfação que este processo eleitoral estava causando no meio político, o
próprio Venceslau Brás4
que era
Vice-presidente da República, portanto pertencente a corrente da situação,
detentora da máquina do Estado e era nome para concorrer a Presidência da
República, defende a lisura e o fim das perseguições nas urnas, como ele mesmo
proferiu:
"Não quero dizer
com isto que não sejam necessárias umas tantas medidas garantidoras da verdade
do alistamento e do voto, da apuração deste e do conhecimento de poderes. [...]
Desejo apenas afirmar que qualquer disposição legislativa, à altura da
atualidade, fielmente executado, produzirá melhores resultados do que outra,
ainda que mais perfeita, desde que esta seja deturpada pelos abusos do poder ou
pela fraude".
Sobre este assunto,
que é transcendental para a República, agirei desassombradamente perante os
funcionários públicos, e procurarei os chefes públicos para os seguintes fins:
Seriedade no
alistamento; Plena liberdade nas urnas; Reconhecimento de poderes dos
legitimamente eleitos; Sincera, Leal, positiva garantia para a efetiva
representação das minorias. (SILVA CARNEIRO, 1998, P. 69-70)
Portanto fica
caracterizada a inquietação que estava causando tais vícios que eram inerentes
da República Velha e reconhecida, se não, até por alguns membros da elite
política, que segundo os autores Silva e Carneiro, no momento em que Venceslau
lia a sua plataforma de governos alguns líderes gaúchos que estavam presentes
na reunião se mostraram demasiadamente descontentes com a mesma. Então era
desta forma que se fazia política na República Velha, com a presença do líder
político local, na figura do coronel, que lançava mão em qualquer artifício
para permanecer no poder, juntamente com o apoio advindo do governo federal,
bem como dos governadores, estes últimos os principais lideres oligárquicos que
via no coronel um elo fortíssimo para domínio das urnas e, contudo a manutenção
dos grandes potentados no poder.
AS DIVISÕES E A
ALIANÇA LIBERAL
As primeiras
rachaduras nessa estrutura aparecem no final da década de 1910. Em 1918, o
paulista Rodrigues Alves é eleito para suceder o mineiro Venceslau Brás.
Rodrigues Alves morre
antes da posse, e paulistas e mineiros não chegam a um acordo para sua
substituição. Lançam, então, o paraibano Epitácio Pessoa, que governa de 1919 a
1922. Seu sucessor é o mineiro Artur Bernardes (1922 a 1926), que não tem a
unanimidade de paulistas e mineiros. Bernardes desperta uma oposição militar
que desemboca nas revoltas tenentistas, tendo de governar sob estado de sítio.
O paulista Washington Luís (1926 a 1930) também assume a Presidência sem a
sustentação das lideranças de seu estado. Enfrenta o endividamento interno e
externo do país, a retração das exportações e, a partir de 1929, os problemas
provocados pela crise econômica mundial.
Pela política do
café-com-leite, cabe ao PRM indicar o candidato à sucessão de Washington Luís.
O partido já tem um nome, o do governador de Minas Gerais,
Antônio Carlos.
Sustentado pelo PRP, o presidente lança o nome de Júlio Prestes, governador de
São Paulo. O gesto rompe o acordo das oligarquias paulista e mineira. Com o
apoio do Rio Grande do Sul e da Paraíba, o PRM compõe a Aliança Liberal, que
parte para a disputa tendo o gaúcho Getúlio Vargas como candidato a presidente
e o paraibano João Pessoa, a vice. Em abril de 1930, a chapa de Júlio Prestes
vence a eleição. Inconformados, os aliancistas provocam a Revolução de 1930,
que põe fim à República Velha.
REQUÍCIOS DO
CORONELISMO NA NOVA REPÚBLICA
"A Polícia Civil
abrirá sindicância para apurar a prisão do agente Gilberto Maciel de Araújo,
detido no Gama por um promotor eleitoral. Ele trabalhou como fiscal de Roriz no
Centro de Ensino Fundamental 12 e portava arma e algemas, apesar de estar fora
de serviço".(FONSECA, Correioweb. 22 de outubro de 2002) Este fato foi divulgado
pelo Correio Brazilense em Outubro de 2002, na ocasião o então candidato pelo
Partido dos Trabalhadores, questionava a
legitimidade bem como a lisura no pleito para governador do Distrito Federal,
do qual saiu derrotado por uma pequena margem de votos pelo candidato a
reeleição: Joaquim Roriz.
O contexto político
atual está recheado de denúncias que remetem as práticas já bem caracterizadas
no capítulo anterior, no que se refere à República Velha. Na mesma matéria
divulgada pelo Correio Braziliense, existem denúncias de compra de voto,
transporte clandestino de eleitores e coação dos eleitores no momento do voto.
Tais práticas nos
remetem aos velhos coronéis que utilizavam o poder, e ainda o compadrio para
tentar vencer as eleições. E é exatamente o que podemos notar como descreve o
jornal.
No segundo pedido de
cassação de Roriz, a coligação de Magela relata várias condutas que
caracterizariam tentativa de compra de voto. Uma delas, a distribuição, no dia
25 de outubro, do cartão de desconto da rede Brasilcard para todos os
servidores da administração direta do GDF.Os cartões eram acompanhados de uma carta
em que Roriz assumia 15 compromissos relacionados a reajustes salariais.
Segundo os advogados, foram distribuídas ainda notas de R$ 50 dentro de
camisetas com o nome de Roriz, pedindo voto para o governador.
Também teriam sido
distribuídos vale-transporte e cupons de abastecimento, acompanhados de
material de propaganda eleitoral, além de promessas de emprego e lote. (Correio
Brazilense, 03 de novembro de 2002, p. 08)
Segundo a denúncia
acima, havia ainda a promessa de favorecimento por parte do candidato, o que
nos leva a verdadeira comparação entre os antigos coronéis e alguns políticos
do atual contexto político brasileiro, pois os antigos coronéis para lograrem
êxito na campanha eleitoral concediam ao eleitorado uma gama de favores, bem
como dádiva financeira, como discorre Leal em nota de rodapé:
Eis aqui uma lista
incompleta: arranjar emprego; emprestar dinheiro; avalizar títulos; obter
credito em casas comerciais; contratar advogado; influenciar jurados; estimular e preparar testemunhas; [...]; impedir que a
policia tome as armas de seus protegidos, ou lograr que as restitua; [...];
colaborar na legalização de terras; [...],
Enfim uma infinidade
de préstimos de ordem pessoal, que dependem dele ou de seus serviçais,
agregados, amigos ou chefes. (LEAL, 1976, p. 38)
Ainda hoje, podemos
perceber no eleitorado, uma carência que é advinda do campo, a do político
protetor e bondoso, portanto os políticos que no seu discurso de palanque
insufla a massa com promessas que vão ao encontro com o desejo deles, como
emprego e moradia, fatalmente irão obter o apoio necessário. Apesar de não se
tratar de um favor, pois tais promessas são deveres do estado previstos na Constituição
de 1988:
Art. 6o São direitos sociais
a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados,
na forma desta Constituição.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº. 26, de
2000)
O candidato
utiliza-se da pouca consciência política que a massa tem para desenvolver
políticas que o personificarão como sendo o protetor dos pobres e tomando para
si a figura do Estado, tal qual era tido o coronel na República Velha, o que
fomenta também a consolidação dos grandes bolsões eleitorais, ou seja, uma região
onde determinado candidato é campeão de votos. Um verdadeiro paralelo como às
áreas de influências dos antigos coronéis, que ficou conhecido como sendo o
"curral eleitoral". Podemos notar no texto abaixo:
Outro elemento
importante para a compreensão da estrutura política de massas é a composição
rural-urbana do proletariado industrial. Ai esta um dos fatores da inexperiência
política dessa parte do povo brasileiro. Com a migrações internas, no sentido
das cidades e dos centros industriais – particularmente intensas a partir de 1945 –
aumenta bastante e rapidamente o contingente relativo dos trabalhadores sem
qualquer tradição política. O seu horizonte cultural esta profundamente marcado
pelos valores e padrões do mundo rural. Neste, predominam formas patrimoniais
ou comunitárias de organização do poder, de liderança e submissão, etc. Em
particular, o universo social e cultural do trabalhador agrícola (sitiante, parceiro,
colono, camarada, agregado, peão, volante, etc.) esta delimitado pela religião,
a violência e o conformismo, como soluções tradicionais. Esse horizonte cultural
modifica-se na cidade, na industria, mas de modo lento, parcial e contraditório.
(IANNI, 1988, p. 57)
Segundo Ianni, este
universo vem sendo modificado como de fato percebemos, contudo grande parte do
eleitorado ainda permanece arraigada com valores oriundos do meio rural,
encontrando nos políticos que se propõem a praticar as políticas de massas, um
líder bondoso e justo, quase sempre rico, pronto e disposto a ajudar os necessitados.
O estudo de Leal
partiu a princípio dos municípios, onde o coronel, que segundo ele, desempenhava seu domínio
basicamente por conta da questão da terra como já foi dito. Portanto vamos
partir para denuncias nos pequenos municípios, onde os grandes chefes e lideres
políticos ainda são ligados a terra ou desempenham outras atividades como é
defendido por Pang em um contraponto a Leal:
As transformações
econômicas e sociais das décadas de 1930 e 1940 acrescentaram uma nova dimensão
à modificação do coronelismo. Depois de 1945, um coronel raramente é um Czar
econômico ou patriarca social de seu município. O estereotipo esta
desaparecendo rapidamente. Hoje em dia o coronel, ou mais respeitado chefe
político, é frequentemente um homem de nível universitário, muitas vezes um
advogado ou um medico. Até 1964 ele era uma pessoa-chave de um dos diversos
partidos políticos de seu município, aceitando a liderança do diretório local. (PANG,
1979, p. 56)
Como define Pang, o
coronel ao longo do tempo sofreu metamorfoses, que o diferenciam de certa forma
do coronel definido por Leal, mas não obstante é atribuído a ele um grande
poder, não apenas pelo grande potentado agrário, mas também por uma questão
financeira agradável que pode ser fruto de uma atividade liberal, ou até mesmo
comercial.
Nas últimas eleições
o que podemos notar é uma gama de denúncias nos processos eleitorais dos
municípios do interior, que vão desde compra de votos até mesmo a fraude nas
urnas, apesar do Tribunal Eleitoral afirmar que as atuais urnas são totalmente
confiáveis como atesta a Unicamp em avaliação do sistema informatizado das
eleições em maio de 2002. Porém a própria Unicamp sugeriu que as urnas fossem
dotadas de mais recursos no intuito de garantir maior lisura no processo eleitoral
como, por exemplo, a impressão por meio de assinaturas digitais como uma forma
de autenticação dos boletins de urnas, ou seja, o resultado da apuração de cada
urna eletrônica.
Dentre os grupos mais
influentes na atual política brasileira podemos encontrar nomes como os da
família Sarney no Maranhão, Quércia, Maluf e Covas em São Paulo, os Magalhães
na Bahia, os Barbalhos no Pará, Inocêncio de Oliveira no Pernambuco; o que nos
leva a confirmação de que possuir uma ampla rede de comunicação é a garantia de
manter as fortes oligarquias no poder, bem como a perpetuação do poder na mão
delas por membros da família.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O sistema político
conhecido como coronelismo tal como foi defino por Leal, dentre outros autores,
teve seu início e fim na República Velha, mas suas práticas perpetuam até os
dias atuais.
Ainda hoje podemos
encontrar no cenário político brasileiro os traços de uma política que a
questão do grande potentado influência boa parte do eleitorado, juntamente com
a relação de poder que tem por finalidade manter as grandes oligarquias no comando
político.
A compra de voto hoje
já não acontece da mesma forma como na República Velha, mas esta não deixou de
existir, só que de uma forma mais velada e camuflada nas políticas
eleitoreiras, ou seja, na doação de cestas básicas, leite, pão, remédio, e principalmente
na barganha com empregos e a casa própria, acabando por fim influenciando o
resultado de uma eleição.
Atualmente podemos
notar candidatos que prometem vantagens para os eleitores e ainda aos seus aliados,
no afame de conquistar a eleição. E o que podemos dizer do filhotismo praticado
pelos antigos coronéis, perpetua ainda por intermédio da indicação de cargos e
empregos aos membros da família e aos correligionários, objetivando a
manutenção de uma ampla rede de clientelismo e a garantia do domínio da máquina
estatal, utilizada para campanha política.
Apesar de um grande
avanço no sistema eleitoral, a possibilidade de falseamento do voto, ainda
persiste principalmente por a urna eletrônica se tratar de um programa de
computador passível de ser manipulado e carente de mais incrementos.
A questão que salta
os olhos realmente é a do coronelismo eletrônico, este é uma grande reprodução
dos coronéis de antigamente, pois como os tais, os atuais coronéis, estão construindo
verdadeiros latifúndios, por intermédio do domínio dos meios de comunicação, e
consequentemente exercendo sobre o eleitorado uma grande influência na hora do
voto, pois quando se aproxima um novo pleito os grandes potentados televisivos
escolhem os seus apadrinhados e combate de uma forma muito veemente o grupo
rival.
Portanto com a
confecção deste artigo notamos a importância de discutirmos este tema em todas
as esferas sociais, comunidade, casa, escola, pois somente com o conhecimento
de tais práticas podemos notar a semelhança entre os antigos e os novos
coronéis. Possibilitando com isso que se faça uma análise mais profunda e suscitar
estudos futuros mais aprofundados sobre a temática.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
BURSZTYN, Marcel. O poder
dos donos: planejamento e clientelismo no nordeste. Petrópolis:
Editora Vozes, 1984.
CONSTITUIÇÃO:
República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
Correio Braziliense,
03 de novembro de 2002, p. 08.
FAORO, Raymundo. Os
donos do Poder – Formação do Patrono Político
brasileiro.
São Paulo:
Globo, 2001
FONSECA, Correioweb.
22 de outubro de 2002. Disponível em: http://www.correioweb.com.br.
Acesso em 19 de Abril
de 2012 às 00:55
IANNI, Octavio. O
colapso do populismo no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
1988.
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo,
Enxada e Voto – município e o regime representativo no
Brasil.
São Paulo: Alfa-omega, 1976.
PANG, Eul-Soo. Coronelismo
e oligarquias, 1989-1934: A Bahia na primeira república brasileira.
Rio de Janeiro: Civilizacão Brasileira, 1979.
QUEIROZ, Maria Isaura
Pereira de. O mandonismo local na vida política brasileira e outros ensaios.
São Paulo: Alfa-Omega, 1976.
SILVA, Hélio;
CARNEIRO, Maria Cecília Ribas. História da república brasileira. São
Paulo: Editora Três, 1998.
Nenhum comentário:
Postar um comentário