RESUMO
Este projeto consiste na análise da Política Externa
adotada por Getúlio Vargas em seu segundo governo, e mais especificadamente,
das estratégias políticas por ele adotadas para promover o desenvolvimento
econômico do Brasil.
O primeiro e o segundo capítulos estudam,
respectivamente, os antecedentes históricos e o cenário interno do segundo
governo Vargas, e são fundamentais para a compreensão do terceiro capítulo, que
abrange a questão da Política Externa.
O Estudo realizado demonstra que a Política Externa de
Vargas não se extinguiu com seu suicídio, ao contrário, influenciou as ações
dos governos seguintes. A partir disso, é verificada a sua extrema importância
na história da política externa brasileira.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I - ANTECEDENTES
1.1 O governo Dutra
1.2 O retorno ao Intervencionismo
1.3 Plano SALTE e Missão Abbink
1.4 A Política Externa
CAPÍTULO II - CENÁRIO INTERNO DO SEGUNDO GOVERNO
VARGAS
2.1 O Retorno ao poder
2.2 Estratégias de desenvolvimento econômico
2.3 A oposição e as pressões internas
CAPÍTULO III - POLÍTICA EXTERNA DO SEGUNDO GOVERNO
VARGAS
3.1 O Nacional – Desenvolvimentismo
3.2 A Política Externa
3.3 Comissão Mista Brasil – Estados Unidos
3.4 Acordo Militar de 1952
3.5 Diversificação da Agenda Internacional, Pacto ABC
e Petrobrás
3.6 As pressões e a crise de Vargas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
INTRODUÇÃO
Esta monografia apresenta um estudo da Política
Externa do segundo governo Vargas (1951-1954) e, principalmente, a análise das
relações bilaterais Brasil - Estados Unidos, desde o governo do General Eurico
Gaspar Dutra. Para tanto, foram desenvolvidos três capítulos, complementares
entre si, a fim de facilitar a compreensão do tema em questão.
No primeiro capítulo, são analisadas as atitudes do
presidente Dutra frente às dificuldades econômicas, políticas e sociais
enfrentadas por seu governo. Dentre elas se destacam a adoção do
intervencionismo econômico a partir do esgotamento das reservas do país; a
criação da Superintendência da Moeda e do Crédito; a implementação de controles
cambiais, que resultou no processo da industrialização espontânea; a
concretização do Plano SALTE para investimentos públicos, o qual marcou a
mudança de atitude do Estado na economia; a instituição da Missão Abbink, que
deu origem à Comissão Técnica Mista Brasil – Estados Unidos para a cooperação
econômica; a cooperação militar entre ambos os países; além da manutenção de um
alinhamento político-econômico com os Estados Unidos, visando obter vantagens
de qualquer espécie.
O segundo capítulo abrange os principais pontos do
cenário interno do segundo governo Vargas, relacionados, direta e
indiretamente, com a Política Externa desse período. O estudo deste tem início
com o retorno de Vargas ao poder, em 1951, e no decorrer de sua leitura são
verificadas diversas questões importantes como a divisão social do trabalho; a
diferenciação social interna; a política nacionalista e as estratégias de
desenvolvimento econômico adotadas por Getúlio, assim como os debates internos
sobre as mesmas; e as razões internas que levaram o presidente ao suicídio em
1954. A análise de tais pontos foi desenvolvida com o objetivo de auxiliar o
entendimento da trajetória da Política Externa de Vargas, estudada no final do
projeto.
Por fim, o terceiro capítulo estuda a diplomacia
brasileira da segunda gestão Vargas e as estratégias de barganha internacional
das quais o mesmo se utilizou, assim como analisa as relações entre o Brasil e
o Sistema Internacional e, principalmente, as relações econômicas e políticas
entre o primeiro e os Estados Unidos no âmbito da Guerra Fria e da Guerra da
Coréia. A ideologia do Nacional-Desenvolvimentismo utilizada pelo governo até
1954, a influência interna sobre a política internacional, o dilema interno
sobre a intervenção militar brasileira na guerra coreana, a implantação da
Comissão Mista Brasil – Estados Unidos, a ratificação do Acordo Militar entre
estes países, a diversificação da agenda internacional brasileira, o Pacto ABC,
a questão do petróleo e as pressões internas e externas sofridas por Vargas, as
quais o levaram ao suicídio, constituem as principais questões desenvolvidas e
analisadas nesse capítulo.
Para uma melhor compreensão do estudo realizado, é
fundamental uma breve explicação do que foram a Missão Abbink, o Plano SALTE, a
Comissão Mista Brasil – Estados Unidos, o Acordo Militar e o Pacto ABC. A
primeira retomou a cooperação econômica entre Brasil e Estados para o
desenvolvimento da economia brasileira e objetivava a identificação dos pontos
de estrangulamento desta e as suas soluções, além disso, foi o caminho para o
estabelecimento da Comissão Mista Brasil – Estados Unidos, a qual formalizou a
cooperação econômica entre ambos os países e possuía os mesmos objetivos da
Missão Abbink. Sem apresentar resultados concretos, ambas foram importantes no
campo das pesquisas e das sugestões. O Plano SALTE previa o desenvolvimento
econômico do Brasil através da coordenação dos gastos públicos e da melhoria e
crescimento de quatro setores básicos da economia: saúde, alimentação,
transporte e energia; porém foi abandonado e também não apresentou resultados
concretos relevantes. O Acordo Militar Brasil – Estados Unidos foi resultado
das expectativas brasileiras de cooperação econômica com os EUA, e tratava do
consenso entre os países para a segurança do continente. O Pacto ABC não foi
instaurado devido às tensões entre Brasil e Argentina, todavia, deve ser
ressaltado porque demonstra as conseqüências da influência norte-americana no
Brasil.
O objetivo maior deste projeto é demonstrar a
importância e a influência das relações internacionais na política e na
economia interna de um país. Visto que a cooperação econômica com os Estados
Unidos, mesmo apresentando falhas, estimulou o desenvolvimento econômico
brasileiro, a partir do crescimento da industrialização. Porém, é preciso
ressaltar que tal cooperação só foi possível através dos esforços e barganhas
de Vargas para obter o apoio financeiro norte-americano para seu programa de
desenvolvimento, num contexto onde as atenções dos EUA estavam voltadas para
outras regiões do mundo e a industrialização brasileira não lhes proporcionava
nenhuma vantagem.
I - Antecedentes
1.1 - O governo Dutra
Em janeiro de 1946, o General Eurico Gaspar Dutra
assume a presidência do país. Seu governo foi caracterizado pelo receio das
revoltas populares e da agitação social, decorrentes da política brasileira do
período (VIZENTINI, 2004, p. 17). Dutra iniciava seu governo a partir da
redemocratização do país e do relativo abandono da política de industrialização
vigente anteriormente (MENDONÇA/PIRES, 2002, p. 237).
Dentre as oposições ao governo Dutra estavam o PCB 1 ,
legalizado em 1945 e considerado o partido comunista mais forte da América. E o
ex-ditador Getúlio Vargas que planejava sua estratégia de retorno ao palácio
presidencial. O primeiro elegeu quinze membros que atacaram fortemente os
dispositivos liberais constados na Constituição de 1946:
Dutra logo se mostrou um presidente tranquilamente
apolítico. O seu período presidencial foi caracterizado por freqüentes apelos
por um retorno à tranqüilidade. Dutra gozou de uma lua-de-mel política durante
o seu primeiro ano, quando a UDN cooperou com o seu governo nas tarefas
imediatas de reconstrução do imediato pós-guerra (SKIDMORE, 1975, p. 91).
A fim de combater a inflação resultante da Segunda
Guerra Mundial e considerando o elevado número de divisas do país, o governo
promoveu uma abertura às importações de produtos manufaturados. Tanto em 1946
como em 1947, a política de importação foi estimulada pelo Ministério da
Fazenda com vista no combate ao aumento dos preços internos. Sendo assim,
Thomas Skidmore divide a história econômica da gestão de Dutra em dois
períodos; o primeiro, entre os anos de 1946-47, marcou o retorno aos princípios
liberais através de uma política afetada pelo repentino esgotamento das
reservas de divisas do país; a partir disto, houve a necessidade de uma
reintrodução de controles cambiais, marcando o início do segundo período entre
1947- 50, quando se fizeram presentes o aceleramento da industrialização e o
planejamento geral dos gastos federais (SKIDMORE, 1975, p. 96-97).
Para o governo, o meio mais eficaz de combate à
inflação e de promoção do desenvolvimento econômico do país seria a livre
importação de bens. A partir disso, era condenada qualquer forma de
intervencionismo estatal na economia. Nesse contexto o país chegou a ser
considerado essencialmente agrícola pelo Ministro da Fazenda, Correia e Castro
(FAUSTO, 2002, p. 403).
A contradição econômica desse período é caracterizada
por dois aspectos. Segundo Pedro Malan, o primeiro está relacionado à política
adotada pelos Estados Unidos em relação à América Latina no período pós –
Segunda Guerra Mundial, a qual gerou constantes frustrações sobre as
expectativas dos países latino – americanos, inclusive o Brasil, de
continuidade da cooperação econômica existente durante os anos da guerra:
(...) Em 1945, 42% das importações norte – americanas
eram originárias da América Latina (contra 25% imediatamente antes da guerra).
O Eximbank, que desde a sua criação em 1934 operava essencialmente com a
América Latina, havia se transformado em uma agência autônoma em 1945 e tinha
sua capacidade de empréstimos elevada para US$ 3,5 bilhões (contra 700 milhões
em 1940). As expectativas pareciam promissoras. Mas - retórica a parte – as
reais prioridades norte – americanas estavam obviamente em outras partes do
mundo. Coerente com seu projeto de internacionalização da economia mundial, os
Estados Unidos estavam preparados para oferecer não mais que conselhos à
América Latina e insistir no caráter global, e não regional, da política norte
– americana para o pós – guerra (MENDONÇA/PIRES, 2002, p. 238).
Sérgio Besserman Vianna identifica o segundo aspecto
como sendo o desequilíbrio das relações econômicas mundiais. Apesar de possuir
saldos cambiais ao final da Segunda Guerra Mundial, o Brasil deparava com um
problema, pois os mesmos foram acumulados em decorrência da elevada redução das
importações durante o conflito e grande parte deles era de moedas não –
conversíveis. A política liberal que havia sido adotada pelo governo em seus
primórdios apresentava fragilidades ao serem permitidos o consumo desenfreado
de bens de consumo leves e suntuários e a aquisição de empresas de serviços
públicos européias. Ambas as operações levaram ao desperdício de divisas
conversíveis e consequentemente ao aumento da inflação acompanhado de uma crise
cambial (MENDONÇA/PIRES, 2002, p. 239).
A expansão da capacidade industrial interna não teve a
mesma prioridade que tiveram a política de taxa de câmbio flutuante e os livres
movimentos de capital, visto que a preocupação do governo era a elevação dos
níveis dos preços. A política nacional baseada em uma intervenção mínima em
cada setor se mostrou contraproducente visto que as reservas cambiais, que em
1945 eram de US$ 708, se esgotaram em menos de dois anos (SKIDMORE, 1975, p.
96-97).
O tempo suficiente para que todas as reservas
desaparecessem foi muito curto, cerca de um ano. Resultado este da febre da
importação. Era perceptível o aumento de 40% das importações e de 80% do dólar
para importações, ao mesmo tempo em que ocorria a diminuição das exportações
para 17%. Não se pode afirmar com clareza que o declínio da taxa real de
crescimento da produção foi conseqüência do repentino fluxo de importações,
porém nota-se que a mesma teve uma retomada de crescimento em 1948, após o
esgotamento das reservas (BAER, 1995, p. 62).
Os pequenos saldos externos que sobraram estavam em
contas bloqueadas, reduzindo o ativo líquido no exterior a apenas US$ 92
milhões, no fim do primeiro trimestre de 1947. A política de satisfazer a procura
interna mantendo um alto nível de importações entrara em choque com o fato da
limitada capacidade do Brasil para importar (SKIDMORE, 1975, p. 97).
Na visão de Sérgio Vianna, o intervencionismo na
economia voltou como uma obrigação do governo de promover o combate aos
crescentes déficits acumulados com os Estados Unidos e com outros países que
possuíam moeda forte. Apesar de o país apresentar balança comercial favorável,
as reservas eram de moedas inconversíveis. Segundo Caio Prado Jr., mesmo
com o aumento das exportações no final da guerra, havia um desequilíbrio entre
essas e as importações que apresentaram um impulso maior ainda no imediato pós
– guerra, devido à necessidade de reposição do material desgastado. Além disso,
os gastos decorrentes das importações de artigos suntuários, das classes
enriquecidas durante a guerra só serviam para alimentar seu bem – estar e luxo
2. O governo Dutra se deparava não mais com uma escolha, mas com
uma necessidade, a mudança na política econômica. Para tanto, um rígido
controle das importações e da taxa de câmbio foi adotado, abandonando, desse
modo, a política liberal (MENDONÇA/PIRES, 2002, p. 239-241).
Criada em 1945, no final do governo Vargas, a SUMOC
(Superintendência da Moeda e do Crédito) não funcionou como empecilho para o
desbaratamento das divisas, todavia, possuía a finalidade de autorizar a compra
e venda de ouro e cambiais e orientar a política de câmbio e operações
bancárias. Nesse contexto, a solução encontrada pelo governo foi a adoção de
uma política de racionamento das divisas através do regime de licença-prévia,
ou seja, a venda de divisas passou a ser licenciada para a importação de
máquinas, equipamentos, combustíveis e matérias – primas essenciais para o funcionamento
do setor industrial. O estabelecimento de uma escala de prioridades serviu para
evitar a redução ou até mesmo interrupção da produção de alguns setores básicos
da economia brasileira. Os resultados de tal política consistiram na melhoria
do comércio exterior, e num considerável equilíbrio no final do ano. (IANNI,
1986, p. 95-97)
Tal política intervencionista de controle cambial
promoveu uma industrialização espontânea, pois a elevação da produção do
mercado interno ocorreu devido à alta cotação do cruzeiro no mercado externo
que estimulou as importações e reduziu as exportações (MARTINS, 1999, p.
132-133).
Nos dois últimos anos do governo, diversos
setores-chaves da indústria particular, como as empresas Klabin e Acesita,
tomaram empréstimos do Banco do Brasil a partir de uma política de crédito mais
liberal, fato esse, dentre vários outros, que contribui para o crescimento
econômico nacional, o qual se mostra bastante notável no final da gestão de
Dutra 3. (SKIDMORE, 1975, p. 99).
Também na visão de Celso Furtado, o aumento de 50% da
renda da população explicava seus desejos de importações que superavam as reais
possibilidades de pagamento no exterior, gerando o desequilíbrio econômico no
país. A política cambial utilizada promoveu uma queda nas importações de
manufaturas acabadas de consumo a favor das importações de matérias-primas e de
bens de capital, ou seja, a indústria recebia beneficio dobrado, uma vez que a
concorrência externa foi reduzida devido ao controle das importações, assim
como reduziram-se os preços dos equipamentos e das matérias-primas necessários
à atividade industrial. Como o setor industrial era o maior absorvedor de
divisas, a redução dos preços dos produtos estrangeiros iria favorecê-lo em
detrimento do prejuízo dos demais setores da economia (FURTADO, 1984, p.
217-221).
Não quer isto dizer que a indústria retivesse para si
a totalidade dos benefícios que a situação cambial lhe outorgou, pois, ao
aumentar a produtividade, ela transferiu parte dessa melhoria para o conjunto
da população por meio de uma relativa baixa de preços. Evidencia-se isso pelo
fato de, entre 1945 e 1953, a elevação dos preços de produtos industriais de
fabricação interna ter subido cerca de 60%, ao passo que o nível geral dos
preços cresceu 130% (LIMA, 1970, p. 370).
1.3 - Plano SALTE e Missão Abbink
O período após 1947 foi marcado por uma mudança de
atitude do Estado em relação à economia, devido à necessidade de organização de
seus gastos públicos. Para tanto, foi proposto, nesse mesmo ano, o Plano SALTE
(Saúde, Alimentação, Transporte e Energia) que abrangeria apenas investimentos
públicos (SKIDMORE, 1975, p. 99).
O Plano consistia em uma tentativa de coordenação dos
gastos públicos com base em um período de cinco anos. O mesmo era constituído
por uma somatória de sugestões provenientes dos diversos ministérios do Governo
Federal, as quais, em termos administrativos e contábeis, eram coordenadas pelo
Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP), abrangiam quatro setores
econômicos da sociedade - saúde, alimentação, transporte e energia - e
projetavam investimentos para os anos de 1949 a 1953, os quais seriam
financiados através de recursos provenientes do orçamento federal, de
empréstimos internos e externos e das dotações estipuladas na Constituição.
Porém, em 1952, o plano foi praticamente abandonado em razão de sua falta de
coordenação e por de não coincidir com a realidade. (IANNI, 1986, p. 101).
Salvo duas grandes obras – a pavimentação da rodovia
Presidente Dutra (Rio – São Paulo) e a Companhia Hidrelétrica de São Francisco
– o Plano ficou no papel (BASBAUN, 1968, p. 194).
É necessário lembrar aqui que o Plano SALTE foi
adotado por um governo que estava comprometido, desde a sua constituição, com
diretrizes liberais. Também a base parlamentar do governo, no Congresso
Nacional, onde se discutiu o plano, era predominantemente liberal. Essa é a
razão pela qual o Plano não correspondeu a uma reformulação das relações entre
o Estado e a Economia, para reforçar as funções do poder público. Ao contrário,
o governo preocupou – se em desempenhar apenas tarefas supletivas,
relativamente ao comportamento espontâneo do setor privado, nacional e
estrangeiro (IANNI, 1986, p. 103).
A Conferência Interamericana sobre Defesa do
Continente, ocorrida em 1947, além de resultar na assinatura de um acordo
militar entre Brasil e EUA, teve outra conseqüência, porém indireta. Quando
Dutra solicitou a Truman, então presidente dos Estados Unidos, e ao General
George Catlett Marshall, secretário-de-estado do governo Truman, presentes no
evento, uma ajuda econômico-financeira para o Brasil, o último recomendou ao
país criar condições propícias ao investimento privado norte-americano.
Todavia, na prática foi acordada a criação de uma Comissão entre ambos os
países (VIZENTINI, 2004, p.25).
Em 1948, foi estabelecida a Comissão Técnica Mista,
entre Brasil e Estados Unidos, a qual buscava estabelecer uma estratégia ideal
para o desenvolvimento econômico brasileiro assim como retomar a cooperação
econômica entre ambos os países, antes instalada pela Missão Cooke. Cabia à
Comissão a análise dos fatores que propiciavam e retardavam o desenvolvimento
econômico do Brasil. Os resultados foram incorporados ao Relatório Abbink, que
continha os pontos-de-vista liberais do chefe da delegação norte-americana,
John Abbink, e de Otávio Gouvêa de Bulhões, chefe da delegação brasileira.
Dentre os pontos ressaltados no relatório estavam a defesa do uso de medidas
financeiras e fiscais ortodoxas, o desenvolvimento equilibrado dos recursos
através das empresas privadas, a reestruturação do mercado interno e a
necessidade de combater as deficiências na infra-estrutura brasileira
(transportes, energia, saúde) através da ação do governo 4 (SKIDMORE, 1975, p.
100).
Presidida por John Abbink e Octavio Gouvêa Bulhões e
composta por economistas, técnicos, empresários e membros dos governos do
Brasil e dos Estados Unidos, a Comissão Mista Brasileiro – Americana realizou
estudos, projetos minoritários e recomendações sobre os aspectos econômicos do
país, como o comércio, a agricultura, a pecuária, a pesca, os combustíveis, a
mineração, as indústrias, os transportes, a mão – de – obra, os investimentos,
os financiamentos, entre outros. Da análise sobre o sistema econômico,
financeiro e administrativo do Brasil foram levantados os principais pontos de
estrangulamento, como a tendência especulativa, as taxas e tarifas irreais nos
serviços de utilidade pública, as carências nos transportes coletivos e no
setor de energia elétrica, a forte atração da propriedade imobiliária; etc.
Foram também listados como pontos deficientes da economia brasileira: o
excessivo protecionismo alfandegário que favorecia o crescimento da indústria,
os efeitos inflacionários da política salarial, assim como o desequilíbrio entre
o desenvolvimento agrícola e o da indústria, no que diz respeito à reduzida
oferta de produtos alimentícios nos centros urbanos, que gerava o aumento dos
preços internos. Ao considerar a dependência do Brasil em relação às
importações um grave problema por gerar efeitos negativos na balança de
pagamento, e ainda, por considerar estratégica a implementação da indústria
petrolífera, a Comissão recomendou que o país utilizasse o capital externo para
a criação e o desenvolvimento do setor de petróleo, já que o governo e a
iniciativa privada não disponibilizavam dos recursos necessários para tal fim.
(IANNI, 1986, p. 105-106).
Durante os trabalhos da Comissão, os EUA procuraram
não se comprometer com qualquer apoio concreto ao Brasil, mantendo-se no plano
das análises e sugestões. O relatório Abbink, em essência, não fez senão
repetir as recomendações liberais acima pontuadas. O aumento dos preços do café
a partir de 1948-49 desafogou um pouco a situação externa da economia, fazendo
parecer que algo de concreto havia sido obtido na cooperação com os EUA, dentro
dos pressupostos da Comissão Abbink-Bulhões (VIZENTINI, 2004, p. 26). Octavio
Ianni também analisa a base salarial do governo Dutra, a qual manteve – se
inalterada durante toda a sua gestão, ou seja, foi inexistente a elevação do
salário mínimo, salvo quando houve pressões por parte dos operários sobre os
empresários para que a mesma ocorresse. Enquanto isso, a inflação nesse período
reduzia drasticamente a capacidade aquisitiva dos assalariados da indústria. O
congelamento do salário mínimo refletia a política de confisco salarial adotada
pelo governo. Ao mesmo tempo em que a redistribuição de renda no país era
regressiva, a taxa de lucro crescia, assim como o capital do setor privado:
Como vemos, a conveniência entre a ideologia liberal e
os interesses do setor privado envolveram o confisco salarial. E o confisco
salarial – como é óbvio – estava na base da ‘estabilidade financeira’ e da
expansão do setor privado. Isto é, a política salarial adotada durante o
Governo Dutra apoiou – se numa política operária que produziu o agravamento das
relações entre o proletariado e os compradores de força de trabalho (IANNI,
1986, p. 115).
1.4 - A Política Externa
Ao assumir a presidência, Dutra não escondeu seu lado
anticomunista e estreitamente vinculado à estratégia da Casa Branca, uma prova
disso foi a interdição do Partido Comunista pelo governo brasileiro e a atuação
de Raul Fernandes no Ministério das Relações Exteriores o qual defendia o
alinhamento brasileiro a Washington. Por essa razão, eram freqüentes os atritos
entre Oswaldo Aranha, presidente da Assembléia Geral e chefe da delegação
brasileira na Organização das Nações Unidas, e Raul Fernandes, visto que o
primeiro alegava que a política internacional não favorecia o alinhamento
brasileiro à política dos Estados Unidos, então defendido pelo último, pois os
interesses norte-americanos estavam exclusivamente voltados para a reconstrução
européia. A tentativa de Raul Fernandes de sabotar a reeleição de Aranha na
Assembléia da ONU demonstrava a distinção das visões políticas de ambos
(VIZENTINI, 2004, p. 21-22).
Durante os anos de guerra, os países latino-americanos
eram estratégicos para os Estados Unidos como fornecedores de matérias-primas e
como regiões propícias para a instalação de bases militares norte-americanas.
Entretanto, no período pós-guerra, a situação mudou, pois o foco norte –
americano passou a ser a reconstrução dos países europeus destruídos pelo
conflito. Naquele momento, Washington buscava a eliminação das barreiras
alfandegárias e restrições ao livre comércio em âmbito não mais regional, mas
global. Como ressalta Vizentini:
Assim, a América Latina via-se ‘abandonada’ pelos EUA,
que a encorajava somente a eliminar restrições e controles cambiais para lograr
a entrada de capitais privados. A título de exemplo, no segundo semestre de
1945 e no ano de 1946, o Eximbank concedeu à Europa créditos no valor de US$
1,9 bilhão, enquanto a América Latina recebia apenas US$ 140 milhões
(VIZENTINI, 2004, p. 22).
Cabe mencionar que nesse período, a política externa
sofreu forte influência interna, visto que muitas vezes os interesses
político-partidários pautavam as ações diplomáticas do país. A imprensa e o
Congresso também foram atores que influenciaram a política internacional. O
instituto Rio Branco, criado em 1946, passava a ser uma academia diplomática na
qual os diversos cursos oferecidos buscavam o aperfeiçoamento da atividade
diplomática. Apesar do alinhamento aos Estados Unidos, o país não deixou de
ampliar o seu campo de atuação no Sistema Internacional, e mais
especificamente, no âmbito multilateral. Em 1946, o Brasil conseguiu um assento
não-permanente no Conselho de Segurança da ONU; e no ano seguinte, alcançou a
presidência do mesmo, representada por Oswaldo Aranha:
Ao praticar uma política de bloco, a diplomacia
brasileira manteve invariável apoio ao governo norte-americano nos foros
multilaterais. O alinhamento a Washington coincidiu com uma forte identificação
ideológica com os valores do mundo ocidental, mostrando uma sistemática
rejeição aos países que pertenciam à órbita soviética (SILVA / CLÓVIS, 2000, p.
119).
O anseio norte-americano de preservação do sistema
capitalista mundial e a luta do Brasil pela superação das dependências são situações
que provam a distinção das necessidades de cada um desses países. Não havia,
portanto, nenhuma intenção norte-americana de cooperar com a industrialização
dos países latino-americanos, somente quando fosse conveniente econômico e
politicamente, como foi o caso do Plano Marshall. Segundo Bandeira Moniz:
O Governo do Marechal Eurico Gaspar Dutra (1946-1951),
ex-Ministro da Guerra de Vargas e simpatizante da Alemanha nazista, orientou o
Brasil, naquele contexto, para o alinhamento incondicional com os Estados
Unidos, adotando políticas econômicas e excedendo-os no próprio anticomunismo e
anti-sovietismo (proscrição do Partido Comunista e rompimento das relações com
a União Soviética), sem nada receber, em contrapartida, por tamanha devoção
(BANDEIRA, 1999, p. 34).
Nas organizações internacionais era nítido o
alinhamento da diplomacia brasileira às posições dos Estados Unidos. O temor
das revoltas sociais fez o Brasil adotar uma política anticomunista dentro e
fora do país, quando perseguiu os grupos socialistas internos e cortou relações
diplomáticas com a União Soviética em 1947. Seguindo essa linha, o governo
ilegalizou o PCB e cassou seus deputados. Todas essas atitudes tinham um
objetivo maior: mostrar aos Estados Unidos a luta do país contra a subversão.
Vargas aproveitou a oposição dos blocos sociais ao governo Dutra para acusá-lo
de entregar a economia e as indústrias nacionais ao capital externo e para
voltar ao poder através da aliança com os mesmos (VIZENTINI, 2004, p. 23-24).
Diante dos esforços do governo brasileiro para
promover a exploração e lavra do petróleo, Dutra nomeou uma comissão de alto
nível a qual elaborou um anteprojeto que permitia a participação dos
investidores estrangeiros na exploração petrolífera, em troca, os mesmos deveriam
fornecer o capital e os conhecimentos técnicos. A oposição das correntes
nacionalistas e das Forças Armadas e a insatisfação norte-americana em relação
ao Estatuto do Petróleo fizeram o Congresso interromper seu andamento
(BANDEIRA, 1999, p. 37-38).
A reação contrária da opinião pública foi acompanhada
de importante mobilização política. Iniciou-se uma campanha pela defesa do
petróleo, conduzida por um conjunto de entidades, destacando-se a Liga de
Defesa Nacional, o Clube Militar, o Centro de Estudos de Defesa do Petróleo e
da Economia Nacional e a União Nacional dos Estudantes (SILVA / CLÓVIS, 2000,
p. 122).
A cooperação militar entre Brasil e Estados Unidos foi
impulsionada nesse período devido à expansão de canais bilaterais que aumentou
a participação norte-americana no treinamento e formação das Forças Armadas
Brasileiras e à instituição, nos moldes do National War College de Washington,
do Estado Maior Conjunto e da Escola Superior de Guerra. Ao mesmo tempo, a
Comissão Militar Conjunta Brasil - Estados Unidos apresentou um aumento de suas
atividades. Além da cooperação militar, era vigente a Cooperação para o
Abastecimento de Recursos Minerais com os Estados Unidos, no âmbito da qual o
governo brasileiro autorizou a exportação de areias monazíticas e materiais
estratégicos aos Estados Unidos, respectivamente ao seu programa de energia
atômica. A posição do Brasil em relação à Guerra da Coréia foi de alinhamento
aos Estados Unidos. Uma prova disso foi o reconhecimento brasileiro, em 1949,
do governo da República da Coréia do Sul e o apoio à condenação da República
Popular da China pelo governo norte-americano, devido à invasão da mesma à
Coréia. Entretanto, tal alinhamento apresentou fragilidades quando o governo
Dutra não atendeu ao pedido dos Estados Unidos de apoio militar no conflito
coreano, isso porque o Brasil passava por um período eleitoral e o governo não
conseguiu apoio interno para ceder à solicitação norte-americana (SILVA /
CLÓVIS, 2000, p. 120-121).
Ainda no âmbito militar, o Tratado Interamericano de
Assistência Recíproca (Tiar), assinado na Conferência Interamericana sobre
Defesa do Continente em 1947, estimulou a criação da Organização dos Estados
Americanos (OEA), em 1948, através da IX Conferência Interamericana, e
impulsionou a criação da Comissão Técnica Mista Brasil – Estados Unidos. Ambos
são importantes para identificar as relações entre a América Latina e os
Estados Unidos. O apoio militar entre ambas as regiões, na existência de uma
ameaça externa, foi concretizado a partir do Tiar. Já a OEA era responsável
pelo estabelecimento de vínculos políticos entre os países membros deste
tratado (VIZENTINI, 2004, p. 25-27).
A partir da OEA, foram definidas as regras de
convivência e a cooperação econômica no âmbito Interamericano, assim como foi
determinada a solução pacífica de conflitos regionais (SILVA / CLÓVIS, 2000,
p.116).
A OEA, como organização regional, institucionalizava a
política pan-americana desenvolvida desde a Doutrina Monroe, e constituía um
elemento valioso para a diplomacia americana manter sob controle a política
interna dos países do continente. Dois princípios da Carta da OEA são bastante
reveladores do objetivo da Organização (...) O primeiro princípio condenava a
região a um certo isolamento internacional em termos políticos, enquanto o
segundo legitimava a ação dos EUA contra qualquer alteração reformista e/ou
nacionalista do status quo 5 (...) (VIZENTINI, 2004, p. 27).
A busca por um foro, no âmbito da ONU, que defendesse
seus interesses econômicos, levou os países latino-americanos a criarem, em
1948, a Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL). Suas recomendações
eram de extrema importância para esses países, entretanto, não agradavam os
norte-americanos, pois davam ênfase à intervenção do Estado na economia, à
regulamentação do capital estrangeiro e à promoção da industrialização (SILVA /
CLÓVIS, 2000, p. 116).
Sob o ponto de vista norte-americano, o apoio da
América Latina era um fato consumado e inegociável, não havendo então motivo
algum para o Brasil receber tratamento privilegiado dos Estados Unidos. Esse
ponto é fundamental para compreendermos o segundo governo Vargas, traduzido
pelo queremismo e mantido pelo populismo (VIZENTINI, 2004, p. 29).
O alinhamento político de Dutra aos Estados Unidos era
fruto dos benefícios econômicos gerados pelo alinhamento anterior do primeiro
governo Vargas a Washington. Porém, diferentemente deste último, as concessões
que Dutra obteve na relação bilateral com os Estados Unidos foram quase nulas,
o que gerou um intenso sentimento de frustração na sociedade brasileira, a qual
esperava maiores vantagens (VIZZENTINI, 2004, p. 28)
II - Cenário Interno do Segundo Governo Vargas
2.1 - O retorno ao poder
Ao longo da campanha, Vargas apresentou um programa de
governo baseado na continuidade do processo de industrialização substitutiva de
importações através do nacionalismo e do intervencionismo do Estado na
economia, além de uma política antiinflacionária que não provocasse prejuízo
aos salários do proletariado urbano, pelo contrário, os mesmos deveriam ter
aumentos reais com o objetivo de estimular o mercado interno. Vargas foi
eleito, apesar da rígida oposição, com aproximadamente 50% dos sufrágios, o que
traduzia o seu poder de carisma e aprovação popular. A UDN (União Democrática
Nacional) juntamente com os setores empresariais e com os grupos mais
conservadores das Forças Armadas tentaram judicialmente anular os resultados,
porém pela falta de respaldo popular, o Tribunal Superior Eleitoral impediu a
anulação:
A oposição ao retorno de Vargas explica – se não só
pelo saudosismo em relação à política econômica vigente durante toda a
Republica Velha, mas também por alguns fatores decorrentes da situação
internacional. Com efeito, o clima de guerra fria, avanço do socialismo no
Leste Europeu e a ascensão ao poder de Juan Domingo Perón, na Argentina,
provocaram verdadeiro pânico quanto a possíveis conquistas dos trabalhadores,
levando os grupos dominantes a tentar evitar, a qualquer custo, as
conseqüências da incorporação das massas populares ao jogo político
(MENDONÇA/PIRES, 2002, p. 248-249).
A eleição de Getúlio teve o apoio de todos os
partidos, com exceção da UDN e do PCB (Partido Comunista Brasileiro). O
primeiro recorreu à ferramenta da maioria absoluta – quando o candidato
alcança um terço ou mais dos votos - para impedir a posse de Vargas, pois não
aceitava a nova derrota de seu candidato. Porém tal ferramenta não passou de um
argumento ridículo que foi ignorado pela Constituição. A indignação deste
partido foi tamanha que o mesmo chegou a criticar o apoio do Exército à
eleição, sendo que o último derrubou Vargas seis anos antes (BASBAUN, 1968, p.
202).
No dia 31 de janeiro de 1951, a faixa presidencial foi
transferida de Dutra a Getúlio Vargas, marcando o início de uma nova era
Vargas. Pela primeira e exclusiva vez, o ex-ditador alcançou o poder através do
voto popular direto (SKIDMORE, 1975, p. 110).
A transição do Governo Dutra para o governo Vargas
correspondeu a uma reorientação das relações entre o Estado e a Economia. Com
Vargas, o poder público passou a desempenhar funções mais ativas e diferentes,
no sistema econômico – financeiro do País. Como mudou parcialmente a composição
das forças políticas no poder, modificou – se também a maneira pela qual o governo
passou a atuar. Essa transição, entretanto, não foi nem repentina nem isenta de
ambigüidades (IANNI, 1986, p. 119).
Logo no início do governo Vargas, a maioria do
Congresso Nacional e o poder público ainda se encontravam engajados em uma
política internacionalizante e contrária ao intervencionismo, a qual buscava
permitir as condições de funcionamento dos setores privado, nacional e
estrangeiro. O sistema político do país se tornava mais complexo devido à
estrutura política dos grupos e classes sociais e ao funcionamento dos
partidos, como o PCB, por exemplo, que se encontrava na clandestinidade. O
crescimento dos setores industrial e terciário juntamente com a expansão dos
centros urbanos dominantes, dentre eles São Paulo e Rio de Janeiro, foram
fatores responsáveis pela diferenciação da sociedade brasileira (IANNI, 1986,
p. 119-120).
Na visão de Boris Fausto, os nacionalistas e seus
adversários eram os responsáveis pela divisão básica da sociedade brasileira
tanto no cenário interno quanto no externo. Os primeiros, como o próprio nome
já diz, defendiam que o desenvolvimento econômico nacional a partir da
industrialização era o único caminho para a concretização de um sistema
econômico autônomo com restrição ao capital estrangeiro. Do outro lado, seus adversários
opunham-se à participação estatal na economia e defendiam o capital estrangeiro
e o progresso do país a partir deste. Para estes, o fim da inflação só seria
possível com a redução drástica dos gastos governamentais e através do controle
da emissão de moeda: Getúlio iniciou seu governo tentando desempenhar, nas
condições de um regime democrático, um papel que já desempenhara: o de árbitro
diante das diferentes forças sociais. Tentou atrair a UDN e escolheu um
ministério bastante conservador, com ampla predominância de figuras do PSD
(FAUSTO, 2002, p. 406).
O processo da divisão social do trabalho e da
diferenciação social interna estavam associados a uma maior representação das
classes sociais. No âmbito do debate sobre o desenvolvimento econômico estavam
engajados a burguesia industrial, a classe média e o proletariado, classes
sociais estas que também almejavam a industrialização, o nacionalismo e a
emancipação econômica. A burguesia industrial se dividia em três grupos
distintos político e economicamente, o primeiro era composto pela pequena
burguesia industrial produtora de bens de consumo tradicionais; a grande
burguesia industrial compunha o segundo grupo ligado à produção de bens de
consumo voltados para as empresas de grande vulto e o qual mantinha relações
com diversos setores como o agropecuário, o do grande comércio de exportação –
importação e o do capital financeiro; e por fim, surgido através dos
investimentos de capital estrangeiro e das primeiras associações de capitais, o
terceiro grupo era representado pela grande burguesia industrial internacional.
Cada um desses grupos mencionados possuía distintas posições quanto à atuação
do Estado na Economia (IANNI, 1986, p. 119-120).
Para Thomas Skidmore, ao assumir o cargo em 1951,
Vargas se deparou com uma sociedade bastante distinta da qual governou como
ditador no Estado Novo, pois naquele momento a mesma se dividia em três
principais setores: a classe média urbana, a classe operária urbana e os
industriais. Cada um deles agia de uma determinada forma em relação ao
desenvolvimento econômico. O primeiro era dividido em dois grupos: os
burocratas e os administradores os quais possuíam suas bases econômicas mais na
urbanização e no crescimento do poder federal do que na industrialização e, do outro
lado estavam os profissionais liberais e os administradores que viam a
atividade industrial como um instrumento fundamental para o futuro econômico do
país. O segundo setor, apesar de apresentar um rápido crescimento, era
praticamente desarticulado da política nacional. Por fim, o último grupo
composto pelos industriais era relativamente pequeno e suas atividades se
limitavam em obter apoio estatal às indústrias assim como garantir medidas
favoráveis de crédito às mesmas. (SKIDMORE, 1975, p. 111-114).
Ives Gandra Martins Filho divide a sociedade entre os
grupos sociais em ascensão e aqueles em declínio. No primeiro grupo estão os
industriais, a classe média urbana, composta pelo funcionalismo público,
defensor da manutenção do status quo 6, e pelos profissionais liberais,
administradores e comerciantes defensores da industrialização, e o operariado
urbano, que também na visão de Skidmore, ainda era desarticulado da política
econômica nacional. O segundo grupo engloba os fazendeiros de café, os comerciantes
de exportação e importação e os produtores internos de alimentos, ambos
preocupados com os possíveis prejuízos que a industrialização podia lhes trazer
(MARTINS, 1999, p. 134).
As associações Comerciais, compostas pelos
comerciantes e negociadores de exportação e importação, eram contrárias, já há
muito tempo, ao processo industrial, alegando que este extinguiu seu papel de
intermediação para as fontes externas de abastecimento além de ter dificultado
as suas transações de importação através de medidas de proteção a curto prazo;
ou seja, formavam um forte grupo de pressão política no Brasil (SKIDMORE, 1975,
p. 115).
2.2 - Estratégias de desenvolvimento econômico
Em nenhum entre todos os discursos realizados durante
seus dois governos Vargas afirmou a contradição entre os crescimentos
industrial e agrícola, pelo contrário, ressaltava a importância da junção de
ambos para a promoção do desenvolvimento econômico do país. Ao mesmo tempo,
reconhecia que assim como o setor industrial, o setor agrícola apresentava
pontos de estrangulamento devido à escassez de infra-estrutura adequada para o
escoamento da produção. Ou seja, em sua visão, ambos necessitavam passar por um
processo de modernização através da intervenção do Estado. Para tanto, o
governo autorizou a importação de máquinas e equipamentos agrícolas e
incentivou a Fábrica Nacional de Motores na continuação da produção de
tratores. Tal iniciativa tinha por objetivo substituir a importação das
máquinas agrícolas a partir da produção interna das mesmas. Como ressalta
Fonseca:
Não se pode verificar, à luz destes dados, qualquer
abandono – e muito menos intencional – da agricultura no período. Pelos
discursos de Vargas depreende-se, inclusive, o empenho em incrementar a
produção do setor primário tanto para o mercado interno como para exportação. A
primeira, segundo ele, configurava-se-lhe como imperativo diante do aumento do
custo de vida; a segunda, para gerar as imprescindíveis divisas para equilibrar
o balanço de pagamentos e assegurar as importações ´produtivas´ (bens de
capital, materiais de infra-estrutura e insumos indispensáveis) (FONSECA, 1989,
p. 373).
Dentro de sua estratégia de campanha, Vargas
demonstrava sua igual atenção a todos os setores e classes da sociedade
brasileira. Porém já no poder, acabou dando ênfase ao crescimento e
desenvolvimento do setor industrial e à diversificação da economia. Com isso,
era perceptível a necessidade de tranqüilizar os setores tradicionais para
evitar que os mesmos formassem um obstáculo à sua meta. No cenário
internacional, a melhoria nas relações de troca, que teve seu início em 1949
perdurando até 1951, ajudou a sua estratégia. Eram nítidos seus esforços para
alcançar o desenvolvimento da economia brasileira, através da expansão de bens
de capital e da melhoria nos transportes e energia, porém não estavam claros os
meios para atingi-lo. O estudo realizado pela CEPAL7, voltado a encontrar
soluções para tais necessidades, ressaltou que a capacidade brasileira para
importar restringia e gerava a necessidade de estipular prioridades no
estabelecimento das diretrizes econômicas. A intervenção estatal estava
diretamente relacionada ao modelo de desenvolvimento escolhido (FONSECA, 1989,
p. 116-117).
Segundo Celso Furtado, a recuperação do preço
internacional do café e os efeitos advindos da Guerra da Coréia foram os
principais fatores que propiciaram a melhoria nos termos de intercâmbio,
mantendo a taxa de câmbio estável e a elevação dos preços internos constante.
Ao passo que o câmbio privilegiava os importadores de equipamentos e insumos
industriais, restringia, por outro lado, a importação de bens finais de consumo
fazendo com que os mesmos fossem substituídos, no mercado interno, por produtos
locais. Para financiar tal processo, o governo retirou os recursos do setor
exportador e os transferiu ao setor industrial através de taxas diferenciadas
de câmbio. Outro mecanismo, dentro dos diversos que foram adotados para
financiar as indústrias substituidoras de importações, foi o empréstimo de
recursos pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico à grande empresa,
recursos estes provenientes de pessoas físicas contribuintes do Imposto de
Renda e que, em razão da inflação, assumiram a forma de doações de capital. Tal
concentração não resultou uma pauperização das massas, pelo contrário, afetou
apenas alguns setores exportadores que chegaram ao limite de resistência até se
degradarem:
A análise da industrialização brasileira põe em
evidência que, não obstante a orientação desta derivar-se fundamentalmente do
processo de substituição de importações, a captação de recursos dependeu
fundamentalmente da ação do Estado. Este, além de ampliar as bases da estrutura
industrial, colocou à disposição do setor privado uma massa considerável de
recursos financeiros (FURTADO, 1975, p. 24).
O debate sobre qual seria a estratégia de
desenvolvimento mais adequada para o país teve seus precedentes no período
Dutra, prevalecendo até o governo Vargas, e ocorria em torno de três fórmulas:
a liberal, a desenvolvimentista-nacionalista e a nacionalista radical
(SKIDMORE, 1975, p.117). A primeira foi proposta por Eugênio Gudin, a segunda
foi defendida por Celso Furtado e a última por Caio Prado Jr. A política
adotada era uma mistura entre as medidas moderadas e as nacionalistas, ou seja,
era uma política dupla, nacionalista com a participação do capital estrangeiro
(MARTINS, 1999, p. 135).
A fórmula liberal alegava ser o mecanismo de preços o
fator determinante da economia, assim como o equilíbrio dos orçamentos
governamentais, o controle das emissões monetárias, o estímulo ao capital
estrangeiro e a redução das limitações impostas pelo governo ao movimento
internacional do capital e dos bens. A desenvolvimentista – nacionalista havia
acabado de ser formulada, em 1950, e baseava-se na extrema necessidade de
industrializar o país e de promover uma economia mista, com incentivos ao setor
privado e intervenções estatais na economia através de empresas estatais e
mistas, a fim de eliminar os pontos de estrangulamento e estimular os
investimentos nas áreas precárias. A fórmula do nacionalismo radical propunha,
como o próprio nome já diz, uma mudança radical na estrutura social e econômica
que vigorava, visto que a mesma era considerada exploradora pelos nacionalistas
radicais (SKIDMORE, 1975, p. 118-120).
Os pontos de estrangulamento estruturais, os atrasos
setoriais, os desequilíbrios regionais, o déficit no balanço de pagamentos, e
as limitações causadas por este à industrialização, e o crescimento súbito da
taxa de inflação que encarecia as exportações no comércio mundial constituíam
os graves impasses ao desenvolvimento proposto por Vargas, que buscou suas
soluções ao adotar a fórmula desenvolvimentista-nacionalista. Getúlio embarcou
em um projeto de novos investimentos para o país baseado na Missão Cookie, na
Missão Abbink e no Plano SALTE. O resultado foi o fornecimento de assistência
técnica e empréstimos de longo prazo pelos Estados Unidos ao Brasil para o seu
desenvolvimento econômico de base, assim como a implementação da Comissão Mista
Brasil - Estado Unidos que iniciou seus trabalhos em 1951, os quais propiciaram
a criação do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico em 1952, e apresentou
seu relatório final em 1953 (SKIDMORE, 1975, p. 117-125).
(...) a subida dos republicanos ao poder, com a
eleição de Eisenhower, levou à dissolução da Comissão e anulação do protocolo.
Este fato constituiu grave golpe para nós, pois, privou-nos do financiamento
norte-americano com que contávamos para expansão de nossas atividades
econômicas. O que se aproveitou disso tudo foram os estudos e os levantamentos
feitos (LIMA, 1970, p. 380).
Segundo Ianni, quando analisados os pontos de
estrangulamento econômico, restava aprofundar e difundir o debate técnico e
político sobre as condições de promoção do desenvolvimento da economia
brasileira, para tanto, começava a surgir, por parte das várias correntes de
opinião pública, diversas propostas de estratégias políticas. Diante da nova
fase nas relações entre o Estado e a Economia, dada a situação
econômico-social, o poder público criou novas condições para o aceleramento do
desenvolvimento industrial no país. Sendo assim, em 1952, Getúlio encaminhou ao
Congresso Nacional uma mensagem relatando os vários problemas da economia
interna, enfatizando o da energia (carvão, petróleo e eletricidade) e o do
reaparelhamento do sistema nacional de transportes (portos, ferrovias e
rodovias), assim como as soluções para os mesmos:
Esse foi o padrão do relacionamento entre o Estado e a
Economia, estabelecido naqueles anos. Os aspectos negativos da atuação
governamental nos anos do Governo Dutra, e a difusão do debate técnico e
político sobre as condições e as possibilidades do desenvolvimento brasileiro,
haviam aberto algumas perspectivas ao Governo Vargas. Além do mais, a mobilização
política das “tendências nacionalistas” existentes na sociedade brasileira
abriria novas perspectivas à atuação do poder público. Em várias ocasiões, o
governo procurava reafirmar a necessidade de reformular as relações externas
(econômico-financeiras) e emancipar as decisões sobre política econômica. A
partir de certo momento, o próprio governo passou a ver na CEPAL um órgão útil
e importante, nesse esforço de reelaboração das concepções latino-americanas
tradicionais sobre o crescimento e desenvolvimento econômico (IANNI, 1986, p.
124-125).
O desenvolvimento das indústrias de base, dos
transportes e da energia eram os pré-requisitos para o crescimento e
aprimoramento dos demais setores da economia, além da modernização de
ferrovias, da construção de portos e rodovias, da produção de ferro e aço, da
prospecção de petróleo e da utilização industrial de energia atômica. A partir
disso, é incontestável a intenção de Vargas de dar um salto no processo
industrial brasileiro até então baseado na política de substituição de
importações. (FONSECA, 1989, p.363).
Ainda no intuito de promover a aceleração do
desenvolvimento industrial, foram criados novos órgãos governamentais para a
resolução de problemas econômico-financeiros e administrativos, assim como para
realização de estudos técnico-científicos sobre o tema. Em 1951, o Ministro da
Fazenda do governo Vargas, Horácio Lafer, anunciou o Plano Nacional de
Reaparelhamento Econômico, também conhecido como Plano Lafer. Este consistia em
um plano qüinqüenal de investimentos nas indústrias de diversos segmentos, como
a de base, de transportes, de modernização da economia, de frigoríficos e de
energia. Para que tais investimentos fossem possíveis, foi autorizada, em 1952,
pelo Congresso Nacional, a criação do Fundo de Reaparelhamento Econômico o qual
seria administrado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) e
teria assistência técnica e financeira dos Estados Unidos em relação aos seus
projetos. (FONSECA, 1989, p. 126).
Horácio Lafer ficou conhecido como o arquiteto da nova
política brasileira de desenvolvimento, auxiliado por uma equipe de competentes
economistas jovens, engenheiros e funcionários públicos, dentre eles, Glycon de
Paiva, Roberto Campos e Rômulo de Almeida (SKIDMORE, 1975, p. 126).
A nova etapa da industrialização demandava a abertura
de novos ramos de produção, os quais exigiam uma tecnologia mais avançada, um
maior volume de capital e uma infra-estrutura bem mais complexa. Concretamente,
tratava-se de ampliar o setor de bens de capital, o que exigiria esforços e
recursos ainda maiores do que na primeira fase da industrialização (VIZENTINI,
2004, p. 34).
No ano de 1950 o Brasil gozava de um excedente de
exportação de cerca de 425 milhões de dólares em moeda atual, porém essa
situação não se manteve constante visto que em 1951 houve uma queda brusca para
67 milhões devido ao aumento das importações, o que gerou um déficit de
exportação no ano seguinte. Sendo assim, eram incontestáveis as necessidades de
eliminar o complexo sistema de controle cambial vigente e de desvalorizar o
cruzeiro, que foram supridas em 1953 quando o governo adotou uma política
cambial mais flexível, ou melhor, um sistema de taxas múltiplas de câmbio foi
introduzido pela SUMOC 8, que resgatou a competitividade das exportações
brasileiras no exterior e canalizou as importações para setores fundamentais ao
desenvolvimento econômico de base (SKIDMORE, 1975, p. 126-27).
Com o objetivo de aprimorar a capacidade de exportação
dos produtos brasileiros e priorizar a importação de bens essenciais, foram
instituídas pela SUMOC, cinco categorias de importações conforme a
essencialidade dos produtos, além disso, tais categorias possuíam sobretaxas
cambiais crescentes. As constantes elevações dos preços, nesse mesmo período,
tornavam imprescindível a adoção de uma política de combate à inflação a qual,
além de controlar os preços, iria evitar as mobilizações dos trabalhadores
urbanos que protestavam a favor do aumento dos salários. Nesse cenário, as
tensões sociais e políticas se acirravam tornando inadiável a reforma cambial,
que se concretizou com a desvalorização do cruzeiro e com o controle do crédito
bancário pelo governo no o intuito de eliminar a inflação (IANNI, 1986, p.
128-129).
Tais resultados reanimaram os investidores e as
autoridades financeiras internacionais a atuarem no país, pois o Brasil
possuía, naquele momento, um equilíbrio financeiro - mecanismo de preços e
taxas livres de câmbio - favorável aos investimentos. Porém, a repercussão
interna foi negativa, porque para a sociedade, o papel do país era de submissão
aos interesses externos. Ao se explicar, Vargas atribuiu aos estrangeiros o
papel de vilões por terem obrigado o país a adotar tais medidas (SKIDMORE,
1975, p. 127).
No mesmo período, para evitar a desaceleração do ritmo
das indústrias, em razão da crise de divisas, a Carteira de Comércio Exterior
(CACEX) criou mecanismos para incentivar a importação de máquinas, ferramentas
e equipamentos favoráveis aos novos investimentos nacionais e estrangeiros, ou
seja, o que estava em questão era facilitar a importação de tecnologia mais
avançada 9 (IANNI, 1986, p. 129).
O aumento do preço final dos produtos era resultado do
crescimento do setor industrial devido às concessões de crédito fácil ao setor
privado pelos bancos oficiais, e principalmente pelo Banco do Brasil. Vargas
enfrentava um dilema, pois ao mesmo tempo em que não podia ignorar as
reivindicações trabalhistas pela redução dos preços, era obrigado a adotar
medidas impopulares de combate à inflação (FAUSTO, 2002, p. 410).
A elevação dos preços, além de motivar politicamente
as massas urbanas, também mobilizou os setores políticos e econômicos mais
conservadores e ligados ao capital externo a pressionarem o governo a adotar
políticas de estabilidade financeira e social. Apesar de ser acusado pela
oposição de “Republica Sindicalista”, por causa da sua política trabalhista,
Getúlio conseguia ampliar o apoio da população ao seu governo e à sua política
econômica. Fato esse que não agradava nem os setores internos mais
conservadores nem os grupos estrangeiros que defendiam o alinhamento político
do país ao contexto da Guerra Fria. Salvo todos esses problemas, foi mantida a
política econômico-financeira de estímulo à industrialização e, para tanto,
foram criadas novas ferramentas econômicas, financeiras, administrativas e
técnicas para o desenvolvimento econômico desejado, além da produção de novas
perspectivas ideológicas dentro do debate técnico e político sobre a
industrialização (IANNI, 1986, p. 130-131).
Como prova de tal anseio desenvolvimentista, foram
criados, dentro do período de 1952-53, o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), a
Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA), O Banco
Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE), e a Petróleo Brasileiro S.A.
(Petrobrás). Além disso, em 1954, foi proposto o Plano Nacional de
Eletrificação e a criação da empresa Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobrás).
Era evidente o fato de o poder público ser o maior responsável pela
transformação econômica brasileira (IANNI, 1986, p. 131-132).
As profundas suspeitas contra os investimentos
internacionais fizeram Vargas adotar uma nova fórmula, mais agressiva, de
nacionalismo econômico, assim, através da necessidade de criar empresas
públicas como instrumentos da política de investimentos, o presidente enviou ao
Congresso um projeto-de-lei para a implementação de uma empresa de economia
mista (SKIDMORE, 1975, p.128).
Durante a Guerra Mundial, a escassez de derivativos de
petróleo chegou a prejudicar o funcionamento de alguns setores da economia
brasileira. Por isso, após a solução encontrada para a siderurgia, com a
criação da Usina de Volta Redonda, colocou-se em primeiro plano o problema do
petróleo (IANNI, 1986, p. 133).
Resistindo a todas as pressões norte-americanas e
atendendo ao apelo popular, a Lei n. 2004 foi aprovada pelo Congresso
possibilitando a criação da Petrobrás. Sua implantação consistiu um forte golpe
contra os Estados Unidos, os quais se uniram à UDN na tentativa de derrubar
Vargas (FAUSTO, 2002, p. 204).
(...) o debate congressual em torno da questão do
petróleo levou 2 anos, confrontando a base governista, pressionada pelos EUA
para liberalização e formação da empresa mista, com a oposição do PCB, que
desejava a estatização, apoiado pela UDN, que desejava roubar a bandeira
nacionalista de Getúlio (MARTINS, 1999, p. 136).
2.3 - A oposição e as pressões internas
Há certa obviedade no fato da volta de Vargas ao poder
ter despertado o ressentimento negativo de seus adversários. Através do uso de
táticas, Getúlio buscava desarmar a oposição ao passo que possuía uma vantagem
significativa, o apoio de uma grande parte da elite política. Quando assumiu o
segundo governo, se deparou com um sistema político aberto e fluido muito mais
difícil de dominar que qualquer outro em que atuou em sua trajetória política.
Para tanto, encontrou na ala nacionalista do exército o apoio que necessitava
para promover seu programa econômico desenvolvimentista, também defendido pelo
General Horta Barbosa no que dizia respeito à criação da Petrobrás. (SKIDMORE,
1975, p. 133-137).
Os três anos e meio que Getúlio conseguiu governar
foram os mais agitados da vida constitucional do país. O ex-ditador, de volta
ao poder, decidira reiniciar sua política de `aproximação com as massas`,
interrompida em 1945. Nada articulou contra o PCB nem contra os seus membros,
pois este Partido estava já em franca decadência e não oferecia perigo à sua
política (BASBAUN, 1968, p. 203).
Em 1952, Vargas, estrategicamente, buscou obter e
manter o apoio do maior número possível de classes e setores. Porém tal
tentativa resultou em constantes críticas tanto por parte da esquerda quanto da
direita, que se opunham ao seu esforço de conciliação com ambos os lados
(SKIDMORE, 1975, p.141).
O Ministério do Trabalho foi entregue a um novo
personagem político, João Goulart, em uma estratégia varguista de mudar o foco
da oposição. Ou seja, as ações de Goulart iriam atrair as atenções dos grupos
mais reacionários do Brasil, visto que eram de defesa aos lideres sindicais e,
obviamente, à classe trabalhadora (BASBAUN, 1968, p. 203).
Ao tomar uma posição pró-operária, com vista no apoio
político ao seu projeto de estabilização, Getúlio se defrontava ainda mais com
a classe média e com a oposição conservadora. A primeira suspeitava de Goulart
por acreditar que sua nomeação era uma ameaça de regime sindicalista. As
tentativas de aproximar a classe trabalhadora sem afastar os industriais eram
um desafio para Vargas, pois o primeiro grupo reivindicava aumento nos salários
enquanto o segundo pressionava o governo a manter a política creditícia
responsável pelo surto industrial (SKIDMORE, 1975, p.149).
A reforma ministerial de 1953 foi uma prova da
intenção de Vargas de obter o apoio das massas. Ao jovem político gaúcho João
Goulart, popularmente conhecido como Jango, cabia a função de combater a
influência dos comunistas nos sindicatos. A oposição o tinha como defensor da
“República Sindicalista” e do governo de Perón, na Argentina. No âmbito desta
reforma, Osvaldo Aranha foi nomeado Ministro da Fazenda, substituindo Horácio
Lafer. O Plano Aranha, projetado pelo novo ministro, tinha como meta controlar
o câmbio e a expansão do crédito nas transações internacionais através de um
câmbio flexível que permitiria uma maior competitividade das mercadorias
brasileiras no exterior, assim como estimularia as importações de bens
essenciais para o crescimento econômico do país (FAUSTO, 2002, p. 411).
A fixação do salário mínimo por Jango causou, como
previsto, uma acirrada oposição dos grupos mais reacionários da sociedade, que
temiam o retorno do “queremismo” e das agitações trabalhistas. Sendo assim,
estes pressionaram a sua demissão:
Essa pressão, a que Getúlio quisera de início
resistir, acirrou a propaganda e as calúnias que contra ele atiravam os grupos
interessados, mas em compensação, aumentou a corrente de indisposição popular
contra a UDN e os grupos reacionários militares, concentrados na famosa
`Cruzada Democrática`, que então dominava o Clube Militar (BASBAUN, 1968, p.
203).
Após a reforma ministerial o objetivo do governo se
resumia ao programa antiinflacionário. Com o apoio do Ministro da Fazenda,
Aranha, e do presidente do Banco do Brasil, Souza Dantas, Vargas acreditava ser
possível o sucesso do Plano Aranha. Dentre as propostas deste estavam o corte
do déficit e a redução da velocidade do processo de industrialização para
aliviar a pressão sobre o balanço de pagamentos. Porém, inesperadamente, o
Brasil se viu afundado em uma maré econômica perigosa, o déficit no balanço de
pagamentos e a inflação eram extremamente persistentes e a pressão por parte do
governo norte-americano era ainda mais forte (SKIDMORE, 1975, p.150-51).
No final de 1953, com o intuito de reduzir o valor do
dólar recebido pelos exportadores de café, a Superintendência da Moeda e do
Crédito (SUMOC), através da Instrução n. 70, introduziu o confisco cambial que
gerou reações negativas no setor cafeeiro, pois deslocou os recursos obtidos
com a exportação de café para os demais setores da economia. Nesse mesmo ano, a
eleição de Eisenhower à presidência dos Estados Unidos inibiu as possibilidades
do Brasil de obter receitas com esse país para o financiamento de seu
desenvolvimento – melhoria na infra-estrutura e eliminação do déficit na
balança comercial – assim como encerrou os trabalhos da Comissão Mista Brasil –
EUA, os quais foram substituídos por negociações de crédito junto aos bancos
privados (FAUSTO, 2002, p. 411).
Em dezembro de 1953, Vargas se viu obrigado a
implantar um programa antiinflacionário penoso e impopular que geraria um
estrangulamento externo e desequilíbrios internos. A sua estratégia para obter
apoio político, visto as péssimas condições em que se encontrava, foi a de
atacar, mais uma vez, as empresas estrangeiras, responsabilizando-as pelas
dificuldades econômicas crônicas do país. Em 1954, tal estratégia era mantida
ao mesmo tempo em que o Plano Aranha não mostrava resultados eficientes, pois
não houve redução nos gastos públicos e muito menos das emissões, devido ao
primitivo sistema financeiro brasileiro. Os problemas só aumentavam, mesmo com
as reformas cambiais e com a redução das importações, o déficit do balanço de
pagamentos era permanente, além disso, no mesmo ano, diversos comícios foram
promovidos por trabalhadores que exigiam o reajuste salarial. Também o alto
preço de exportação do café estabelecido pelo Brasil incomodava os Estados
Unidos que realizaram uma investigação sobre o preço, realizada por uma
comissão de senadores norte-americanos (SKIDMORE, 1975, p. 57-58).
Enquanto isso, no cenário federal, Jango concentrava
os ataques das áreas civis e militares antigetulistas. Seu nome era ligado aos
supostos planos de uma Republica Sindicalista e, imediatamente, a um possível
aumento de 100% no nível do salário mínimo (...) Entre os adversários civis do
governo, estava a maioria dos integrantes da UDN e partidos menores e grande
parte da imprensa (FAUSTO, 2002, p. 414).
Como a política salarial ficou a cargo de Goulart, era
ainda maior o receio da classe média quanto à perda de seu status e de
vantagens econômicas. Ao atacar Jango, o real alvo dos antigetulistas era o
próprio presidente. O grosso da imprensa também se mostrava contrário ao
governo, apenas alguns jornais com pouca irradiação, como a Gazeta de São
Paulo, apoiavam-no. Insatisfeito com tal situação, Vargas aprovou um empréstimo
feito pelo Banco do Brasil a Samuel Wainer para que o mesmo lançasse uma rede
de jornais a favor de seu governo, dentre eles foi publicado o jornal Última
Hora que obteve considerável sucesso. Até mesmo nas próprias forças armadas
surgiu um foco de oposição a Getúlio (SKIDMORE, 1975, p.159-162).
Em 1954, como ressalta Basbaun, Vargas tinha contra si
próprio o povo que o elegera, a UDN e o PCB, os grupos apartidários adeptos ao
“entreguismo” e a maioria das forças armadas (Marinha e Aeronáutica):
Os nacionalistas e outros partidários de Getúlio
sentiam-se acuados, acovardados. O povo assistia ao espetáculo que lhe oferecia
a imprensa, estupefato. E para isso contribuía o PCB que ao mesmo tempo que se
lançava tão grande ofensiva contra Getúlio e as forças democráticas, teimava em
acusar o Presidente de `agente do imperialismo americano`. A direita e a
esquerda acossavam Getúlio e o povo não mais sabia que rumo tomar (BASBAUN,
1968, p. 207).
O nível de agitação nos meios militares era tão alto
que em 1954 foi divulgado o memorial dos coronéis do Exército, assinado por 42
deles e por mais 39 tenente-coronéis, o qual foi entregue ao Ministro de
Guerra. Tal documento apresentava implicações políticas ao acusar o descaso do
governo com a deterioração dos padrões morais e materiais do Exército, que
necessitava se reequipar (FAUSTO, 2002, p. 415).
Relacionados ao novo nível do salário-mínimo a ser
estipulado estavam os protestos dos jovens militares contra seus baixos
salários. O Memorial dos Coronéis foi mais um entre os fatores que agravaram a
tensão política no país. A partir dele, o Exército pôde expressar a ameaça que
sofria de uma crise de autoridade e a oposição da classe média ao Estado.
(SKIDMORE, 1975, p.163-164). Deve-se notar que nesse seu novo período
governamental Getúlio não parecia o mesmo. O feiticeiro havia envelhecido e
suas mágicas já não impressionavam, ou pelo menos, não tinham a mesma
eficiência. As velhas não mais tinham graça e as novas eram apresentadas com
evidentes sinais de improvisação. Apresentava-se agora silencioso, alheio às
provocações, quase indiferente ante as celeumas e calúnias que na imprensa e no
Congresso os seus inimigos levantavam (BASBAUN, 1968, p. 205).
Mesmo sem uma base sólida de apoio, Vargas conseguiu
se manter no poder. Somente um acontecimento relevante seria capaz de levar as
Forças Armadas a depor o presidente, o qual de fato ocorreu. A culpa do
assassinato de Lacerda, figura mais relevante do antigetulismo, caiu
diretamente sobre Getúlio. A partir disso, o movimento a favor de sua renúncia
ganhou grandes proporções. Em 23 de agosto de 1954, o Exército lançou o
manifesto à nação exigindo a deposição do ex-ditador, que o respondeu com seu
suicídio (FAUSTO, 2002, p. 416-417).
O suicídio de Getúlio Vargas, como ressaltado na Carta
Testamento, foi conseqüência das pressões internas e externas sofridas por ele.
Naquele momento, a crise no país atingia seu ápice. Eram elevados o número e a
gravidade dos problemas internos assim como era extremamente forte a pressão
internacional sobre seu governo. A morte de Vargas repercutiu mundialmente e
deixou como herança uma política “personalizada” moldada nos ideais
nacionalistas. (SILVA / CLÓVIS, 2000, p. 125).
III - Política Externa do Segundo Governo Vargas
3.1 - O Nacional – Desenvolvimentismo
A ideologia do desenvolvimentismo, herdeira do modelo
keynesiano, foi a maior influenciadora da economia política brasileira e do
pensamento econômico latino-americano. Contrário ao liberalismo econômico, esse
ideário, nos anos 40 e 50, constituiu a bandeira de luta dos grupos adeptos à industrialização
e à promoção do desenvolvimento capitalista (MANTEGA, 1984, p. 23).
O desenvolvimento é um processo de transformação
econômica, política e social, através do qual o crescimento do padrão de vida
da população tende a tornar – se automático e autônomo. Trata – se de um
processo social global, em que as estruturas econômicas, políticas e sociais de
um país sofrem continuas e profundas transformações. (PEREIRA, 2003, p .31).
Na visão de Guido Mantega, o método mais adequado para
elevar os Estados periféricos, até então agroexportadores, ao patamar de países
desenvolvidos seria a promoção do planejamento global do governo, o qual
passaria a atuar em maior escala na economia. Isso porque o que estava em foco
não era apenas uma produção teórica e acadêmica, mas uma política econômica e
de planejamento governamental. As receitas econômicas desenvolvidas pela CEPAL
(Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) e as suas análises
econômicas viriam a contribuir de maneira eficaz para a prática do
desenvolvimentismo:
(...) a ideologia nacional-desenvolvimentista, forjada
ao longo dos anos 50, gestou-se inicialmente nos escritórios da CEPAL, ainda na
virada da década anterior; foi incrementada pelos especialistas estrangeiros,
como Ragnar Nurkse e Gunnar Myrdal (...). Assim, na segunda metade dos anos 50
essa ideologia fornecia um projeto político de desenvolvimento que, mal ou bem,
argamassava a sociedade civil brasileira e fornecia ao Estado sua base de
legitimação (MANTEGA, 1984, p. 63).
3.2 - A Política Externa
A diplomacia do último governo Vargas se mostrou
bastante distinta daquela praticada por Dutra. A nova política exterior passou
por um longo processo até atingir seu apogeu com a Política Externa
Independente (PEI), em 1961. A primeira tinha sua base no desenvolvimento
industrial a partir da substituição de importações. Logo, o que Vargas buscava
em seu segundo governo, assim como no primeiro (1930 – 1945), era interagir a
política externa com o desenvolvimento econômico (VIZENTINI, 2004, p. 31-32).
A política externa da segunda gestão de Vargas baseava
– se em duas premissas: transferir os benefícios das relações econômicas
internacionais ao desenvolvimento da economia brasileira e manter o alinhamento
político e militar aos princípios de solidariedade no mundo ocidental
(ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 263).
Quando João Neves da Fontoura assumiu o Ministério das
Relações Exteriores, atuou por dois anos e cinco meses no Itamaraty. Chanceler
pela segunda vez, apoiava a participação do Brasil na Guerra da Coréia e a
cooperação econômica do país com os Estados Unidos, porém suas ideias eram
contrárias às de Vargas, o qual exigia uma reciprocidade econômica nas relações
com Washington no que diz respeito à industrialização do país (BARRETO, 2001,
p. 189).
A vitória de Vargas em 1950 teve efeito imediato nas
relações Brasil - Estados Unidos. Logo surgiu do lado brasileiro a expectativa
de que o alinhamento pudesse representar um instrumento de negociação para o
país. O chanceler João Neves da Fontoura, nos primeiros meses do governo
trabalhista, manifestou sua esperança de ver o apoio político e militar
compensado por iniciativas de cooperação econômica. A primeira oportunidade
desse tipo de negociação de deu durante a Quarta Reunião de Consulta de
Chanceleres, realizada em Washington em março de 1951 (SILVA / CLÓVIS, 2000, p.
121).
Com o agravamento da Guerra Fria, entre 1951 e 1953,
Vargas enfrentou diversas dificuldades em âmbito externo. A Guerra da Coréia
teve grande impacto sobre as contas externas brasileiras e desviou a atenção do
Sistema Internacional, principalmente dos EUA para outras regiões do mundo,
deixando o Brasil e a América Latina em “segundo plano” (BARRETO, 2001, p.
190).
Para Vizentini, o descaso de Washington em relação à
América Latina, e mais especificadamente, às reivindicações dos governos
locais, devia-se ao fato da região estar sob seu controle durante toda a Guerra
Fria. Vargas não encontrou outra solução senão a de enfrentar esse difícil
contexto mundial e obter o maior número de barganhas possível. Porém, no auge
da Guerra da Coréia a capacidade de barganhar era ainda mais limitada. Mesmo
assim, o governo brasileiro não desistiu e conseguiu promover a criação da
Comissão Mista Brasil - Estados Unidos, assim como assinou o Acordo Militar
Brasil-EUA e recusou o pedido dos EUA de envio de tropas militares brasileiras
à guerra coreana:
A bipolaridade então existente não se prestava a ser
explorada em termos de uma barganha pragmática. Bem ao contrário, tendia a
limitar tal possibilidade. Finalmente, há que considerar que a maior parte da
classe dominante brasileira ainda estava marcada pelos parâmetros diplomáticos
do governo Dutra, pautado pelo alinhamento automático com Washington. Assim, a
diplomacia de Vargas ia requerer uma habilidade excepcional (VIZENTINI, 2004,
p. 43).
Segundo Heitor Ferreira Lima, diversos acontecimentos
externos influenciaram as ações de Getúlio, como a elevação do preço do café em
1949, que elevou a disponibilidade de divisas do país, e a Guerra da Coréia a
qual aumentou a cotação das matérias-primas no comércio internacional. Diante
destes fatos, Vargas criou vários instrumentos de ação com o intuito de
facilitar sua gestão administrativa econômica e financeira: “Daí a permanente
elevação do custo de vida naqueles anos, bem como o enorme crescimento do meio
circulante, o qual dobrou entre 1951 e 1955. Era o desenvolvimento realizado
com recursos próprios, sem auxílio externo, que se ia dilatando cada vez mais”
(LIMA, 1970, p. 386).
O processo de industrialização brasileiro se fez
necessário a partir da enorme quantidade de minério de ferro existente no país,
além de seu parque manufatureiro de bens de consumo já instalado e da rápida
urbanização decorrente do elevado crescimento da população. Assim, para
concretizá-lo, Vargas buscou contribuir com os esforços de Guerra dos Estados
Unidos em troca da cooperação econômica com os norte-americanos para o
desenvolvimento das indústrias nacionais. Porém, as discordâncias entre ambos
os países não tardaram a aparecer (BANDEIRA, 1999, p. 34-35).
O início das negociações bilaterais Brasil – Estados
Unidos se deu em abril de 1951, através IV Reunião de Consulta, no âmbito da
qual o Brasil solicitou aos EUA a eliminação das restrições ao preço do café, a
liberalização do crédito pedido ao Eximbank e ao Banco Internacional, para
financiar obras públicas e implementar indústrias de base no país, e,
principalmente, a criação de uma Comissão Mista entre ambos os países como
instrumento de apoio financeiro norte-americano à industrialização brasileira
(ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 266).
Durante a Reunião, enquanto os Estados Unidos
recomendavam aos países latino-americanos manter estoques disponíveis de
capitais para promover seu desenvolvimento, ao passo que os últimos alegavam
que a revolução, maior ameaça à região, só poderia ser evitada a partir da
elevação do nível de vida de sua população, a qual seria possível com a ajuda
norte-americana. Porém, esta foi mínima, quase nula, e não auxiliou os esforços
de Vargas de consolidação das indústrias de base para substituir as importações
de petróleo e de bens de capital e de eliminação do déficit no balanço de
pagamentos 10 (BANDEIRA, 1999, p. 35-36).
Na concepção de Vizentini, as atitudes de Vargas
preocupavam a Casa Branca desde os anos 30, quando o mesmo barganhou entre
Berlim e Washington; também o nacionalismo e o populismo reinantes no Estado
Novo e em seu segundo governo eram fontes de ameaça à influência
norte-americana no Brasil. Vargas conhecia tais fatos, tanto que entregou ao
pró-americano João Neves da Fontoura o cargo de Ministro das Relações
Exteriores visando uma maior aproximação com o governo Truman. Ao receber da
ONU o pedido formal de envio de tropas militares brasileiras para a Coréia,
Fontoura tratou logo de explicar a recusa do Brasil alegando que o país era
incapaz de sustentá-las economicamente, ou seja, o chanceler propunha uma ajuda
financeira norte-americana à economia brasileira para que fosse possível a
preparação do exército nacional. Essa foi a posição do Brasil na IV Reunião de
Consulta dos Chanceleres Americanos, na qual o país criticava a orientação
econômica dos Estados Unidos para a América Latina:
Após endossar o anticomunismo e a defesa do Ocidente,
a delegação do Itamaraty declarou que a proteção dos países latino-americanos
contra o totalitarismo dependia sobretudo do desenvolvimento econômico,
argumentando que a instabilidade política e a conseqüente infiltração comunista
eram resultados do atraso econômico. Nesse sentido, propunham a intensificação
do apoio ao desenvolvimento, e não seu retardamento (...) (VIZENTINI, 2004, p.
47).
Da Reunião resultou um discurso de João Neves da
Fontoura criticando a ajuda dos Estados Unidos à Europa, pelo Plano Marshall,
visto que o continente americano necessitava de assistência financeira para
promover o desenvolvimento de seus países e melhorar a qualidade de vida de
seus cidadãos. O princípio que regeu o final da Reunião de Consulta foi o de
que o elemento essencial para a defesa do continente Americano era o
desenvolvimento econômico dos países em desenvolvimento (BARRETO, 2001, p.
191).
Quando da preparação da IV Reunião de Consulta, uma
comissão ad hoc – da qual fizeram parte Valentim Bouças, Luis Dodsworth
Martins, San Tiago Dantas, Otávio Gouveia de Bulhões e Roberto Campos –
preparou um memorandum, aprovado pelo presidente eleito, Getúlio Vargas,
e enviado ao Departamento de Estado, fixando a nova política exterior
brasileira, sobretudo no que se referia à cooperação econômica (CERVO/BUENO,
2002, p. 274).
O governo Vargas observou que a capacidade produtiva
do Brasil só poderia ser elevada através da estatização de alguns setores base
da economia, pois não podia contar nem com a iniciativa privada e muito menos
com a estrangeira. Os recursos necessários para tal fim foram obtidos a partir
da contenção da exportação de capitais (remessas de lucros e dividendos), visto
que os mesmos não voltariam ao país, pois o Eximbank e o Bird não estavam
dispostos a conceder empréstimos e aos Estados Unidos não interessava investir
diretamente no Brasil, ao perceberem que a industrialização brasileira só
trazia desvantagens por criar novos mercados domésticos concorrentes. Por outro
lado, as Forças Armadas se beneficiavam com o crescimento industrial (BANDEIRA,
1999, p. 45).
partir de 1952, as importações brasileiras superavam
as exportações, subindo 81% em valor e 40% em volume, enquanto as exportações
caíam 20% de volume. Isso porque a situação econômica do Brasil se encontrava
abalada em função da deterioração das relações entre este e as instituições
financeiras internacionais. O país apresentava um déficit de 615 milhões de
dólares em 1952 seguido de uma drástica redução das reservas. (BARRETO, 2001,
p. 190).
Em relação à Guerra da Coréia, os EUA não conseguiram
apoio dos demais países da América Latina, porém houve a insistência de engajar
pelo menos a Colômbia no conflito. O Brasil apresentou ativa participação nos
trabalhos da ONU , visando compensar a sua recusa de enviar tropas à Coréia.
Dos Estados Unidos, Neves da Fontoura relatou a Getúlio suas tentativas de
constituir uma Comissão Mista com os EUA e obter o financiamento de 300 milhões
de dólares pelo Banco Mundial para a mesma., porém sem qualquer subordinação
dos interesses brasileiros aos dos norte-americanos. O Brasil se mostrou
disponivel a uma possível missão à Coréia, porém após detonarem a bomba de
hidrogênio, os Estados Unidos relataram que a missão não seria suficiente se
fosse desprovida de uma participação militar. Parta tanto, Fontoura voltou a
ressaltar a inviabilidade do envio das tropas militares, visto que a economia
brasileira não estava propícia para sustentá-las, e que tal ação só seria
possível mediante auxílio econômico dos EUA para reforçar o exército brasileiro
para uma guerra defensiva ou ofensiva. (BARRETO, 2001, p. 192-194).
A barganha diplomática com os Estados Unidos também se
exprimiu com força na atuação da Comissão Mista Brasil-EUA para o
Desenvolvimento Econômico. Esse órgão foi criado por demanda do Brasil em
dezembro de 1950, durante a Guerra da Coréia, portanto. Nesse momento os EUA
necessitavam do apoio diplomático de seus aliados, e foi sobretudo essa a razão
da Casa Branca haver escolhido a iniciativa brasileira (VIZENTINI, 2004, p.
48).
3.3 - Comissão Mista Brasil – Estados Unidos
Vargas não hesitou em ressaltar ao governo Truman que
as negociações militares entre os dois países somente seriam concretizadas
através da cooperação norte-americana aos projetos de desenvolvimento econômico
brasileiros. Para tanto, foi assinado em 1950 o acordo que deu origem à Comissão
Mista Brasil - Estados Unidos (SILVA / CLÓVIS, 2000, p. 122).
O início dos trabalhos da Comissão, em 1951,
formalizaram a cooperação econômica Brasil – Estados Unidos. O objetivo do
Brasil era de promover o desenvolvimento econômico do país enquanto que o do
governo norte – americano era apenas político. (ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO,
2006, p. 270)
Verifica – se, pois, que o governo pretendia
desenvolver uma política econômica de austeridade monetária e fiscal para que
se pudessem recuperar as condições de investimento que permitissem o avanço do
processo de industrialização. Para tanto, promoveu a instalação da Comissão
Mista Brasil – Estados Unidos (CMBEU), em 1951 (MENDONÇA/PIRES, 2002, p. 251).
Quando foi instituída a Comissão, as relações entre os
dois países já não eram as mesmas do período pós-guerra, pois as frustações do
Brasil em relação à falta de cooperação econômica só aumentavam, assim como os
discursos nacionalistas de Vargas. Entretando, esta ficou encarregada de
formular projetos para o desenvolvimento econômico brasileiro os quais seriam
financiados pelo Eximbank e pelo Banco Internacional de Reconstrução e
Desenvolvimento. Durante seu funcionamento, Vargas enviou ao Congresso, em
1951, uma mensagem relacionada à criação da Petrobrás e à regulamentação das
remessas de lucros ao exterior pelas empresas estrangeiras instaladas no país.
A atitude varguista não agradou os norte-americanos que o acusaram de fazer
concessões à esquerda, defensora do nacionalismo (CERVO/BUENO, 2002, p. 278-279).
A pouca disponibilidade de recursos financeiros por
parte dos organismos norte – americanos para o financiamento dos projetos de
desenvolvimento da economia brasileira e as oposições intrarburocráticas do
governo de Truman consistiam nas dificuldades que a Comissão passou a
enfrentar. O Departamento de Estado dos Estados Unidos era favorável aos
projetos na América Latina, ao passo que os burocratas e os organismos
financeiros, como o Banco Mundial e o Eximbank, mantinham uma posiçao
totalmente contrária11. Assim como na Missão Cooke, em 1942, o
programa da Comissão Mista não era compatível com os verdadeiros interesses
norte – americanos os quais se baseavam no suprimento de materiais estratégicos
e em garantir um campo fértil para os investimentos privados de seu país
(ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p.271).
Mesmo com todas as dificuldades de obtenção de
financiamento dos Estados Unidos, o Brasil ainda contava com a compreensão do
embaixador norte-americano Herschell V. Johnson, no Rio de Janeiro, e do
Secretário de Estado Assistente, Edward G. Miller que defendiam as pretensões
econômicas do governo Vargas. Uma prova disso foi o pedido de Johnson, ao
Departamento de Estado, para que este último pressionasse o Bird e o Eximbank a
liberarem, o mais rápido possível, os recursos necessários ao financiamento dos
projetos da Comissão. (BANDEIRA, 1999, p.36).
Presidida por Horácio Lafer, a Comissão realizou
diversos estudos sobre a cooperação econômica entre Brasil e Estados Unidos e
aprovou 41 projetos relacionados aos setores de transporte e energia. Além
disso, contou com a participação de capitais europeus. Em troca do apoio
financeiro norte-americano, o Brasil se comprometeu a fornecer minerais
estratégicos aos EUA (CERVO/BUENO, 2002, p.279).
Os trabalhos da Comissão foram encerrados em 1953,
mesmo com os projetos já aprovados, devido à postura evaziva dos Estados
Unidos. A ascensão dos burocratas ao poder nos EUA resultou em uma degradação
da cooperação com o Brasil, pois seus interesses estavam agora voltados para
uma liquidação dos atrasos comerciais do país 12. Com a reforma
ministerial no Brasil, João Neves da Fontoura deixa o cargo no Itamaraty e
Oswaldo Aranha assume o Ministério da Fazenda. Nesse momento, as relações entre
Brasil e EUA se reduziam às discussões sobre o preço teto do café e sobre o
pagamento dos atrasos comerciais. Paralelamente, o governo norte – americano se
mostrava contrário à regulamentação da remessa de lucros dos investimentos estrangeiros
e ao projeto de criação da empresa estatal de petróleo impostos por Vargas.
(ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 273)
De fato, a CMBEU apresentou resultados. O Plano de
Reparelhamento Nacional, conhecido como “Plano Lafer”, que previa investimentos
em infra-estrutura e industrias de base, fundamentava – se em muitos dos
projetos daquela comissão. Mesmo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
(BNDE), criado em 1952, com o Plano Lafer, também foi resultado das ideias
surgidas no âmbito da Comissão (MENDONÇA/PIRES, 2002, p. 251).
Segundo Guido Mantega, o Banco Nacional do
Desenvolvimento Econômico, foi essencial para expanção industrial do Brasil,
pois consistia em uma agência financiadora de investimentos do país com a
função de executar os projetos de desenvolvimento industrial através de
créditos e de avais de financiamentos externos:
Num primeiro momento, as energias do BNDE foram
canalizadas para a infra-estrutura, que era a área mais problemática para a
expansão industrial (...). Dessa forma, o BNDE cumpria os desígnos da Comissão
Mista e procurava dissolver os pontos de estrangulamento constituídos pelos
setores de energia, transportes e insumos básicos (MANTEGA, 1984, p. 70).
3.4 - Acordo Militar de 1952
A política de restrição ao capital estrangeiro adotada
pelo governo Vargas resultou na solicitação, enviada pelo Conselho
Norte-Americano da Câmara de Comércio Internacional ao governo dos Estados
Unidos, de interrupção do fornecimento de empréstimos ao Brasil. Para amenizar
as tensões entre os dois países, Vargas optou por ceder no apoio militar entre
ambos. Um mês depois do envio do projeto do Acordo Militar ao Brasil, através
da embaixada norte-americana no Rio de Janeiro, o governo brasileiro criou o
Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) para abordar a questão dos minerais
estratégicos no âmbito da segurança nacional. As pressões dos setores nacionalistas
fizeram Vargas evitar o envio de tropas à Coréia, entretanto, não conseguiram
impedir a ratificação do Acordo (VIZENTINI, 2004, p. 51-53).
O ano de 1952 foi marcado pelas oscilações do governo
brasileiro: enquanto de um lado o governo criava o BNDE, denunciava a remessa
irregular de lucros ao exterior, tomava medidas para discipliná-la, aprofundava
o discurso nacionalista e negava-se a enviar tropas brasileiras para a Coréia,
por outro lado, assinava o Acordo Militar Brasil-EUA (VIZENTINI, 2004, p. 51).
Através da iniciativa norte-americana e das
conversações sobre a questão militar, foi ratificado, em março de 1952, o
Acordo Militar Brasil – Estados Unidos, ou ainda, o “acordo de assistência
militar recíproca” para defesa do Ocidente:
Os norte-americanos ficariam, na hipótese de agressão
externa, com o controle do fornecimento de armas, financiamento e treinamento
para os países situados na área considerada. A contrapartida era o fornecimento
de matérias-primas estratégicas. A assistência militar colocava o Brasil numa
situação de dependência dos Estados Unidos, no referente à aquisição de equipamentos, bem como no
treinamento para o seu uso 13 (CERVO/BUENO, 2002, p. 280).
As expectativas brasileiras de cooperação econômica
com os Estados Unidos fizeram o governo se comprometer com a participação
militar no conflito coreano e com o suprimento de materiais estratégicos. Ambos
os compromissos impulsionaram a assinatura do Acordo Militar. Porém, Vargas não
possuía suporte interno para enviar tropas brasileiras à Coréia e muito menos
para ratificar o Acordo Militar. Ficava, portanto, evidente que muitos
problemas internos eram frutos da política externa (SILVA / CLÓVIS, 2000,
p.121).
Em junho de 1952, a partir das dificuldades
enfrentadas pelos Estados Unidos em darem um rápido fim à guerra da Coréia,
aumentaram as pressões sobre o governo brasileiro, levando-o a examinar, mais
detidamente a hipótese de seu envolvimento direto no conflito. Nessa ocasião
também se negociava um acordo militar entre os dois países, estabelecendo-se
uma estreita associação entre o envio das tropas à Coréia e aos termos do
acordo (ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 267).
A Guerra da Coréia se tornava ainda mais grave com o
bombardeio dos Estados Unidos à hidrelétricas na Coréia do Norte e pela
rejeição por parte da China do armistício proposto pela Índia e adotado pela
ONU. Paralelamente a esses acontecimentos, Truman testava a bomba de hidrogênio
no Pacífico enquanto Churchill produzia a bomba atômica. O cenário, naquele
momento, era propício para a eclosão de uma Terceira Guerra Mundial, e foi
nesse clima, que Neves da Fontoura e o embaixador norte-americano, Herschele W.
Johnson, assinaram o Acordo de Assistência Militar Brasil – Estados Unidos. O
mesmo consistia na obrigação norte – americana de fornecer materiais ,
equipamentos e serviços, ao passo que ao Brasil cabia a obrigação de fornecer
materiais básicos e estratégicos. O processo para aprovação do instrumento no
Congresso foi longo e difícil e englobou questões já tratadas anteriormente
como a participação de tropas brasileiras na Guerra da Coréia e o envio de
urânio e areias monazítidcas para os Estados Unidos (BARRETO, 2001, p. 195).
Em relação à aprovação do Acordo Militar, além de
receber críticas dos segmentos nacionalistas das Forças Armadas, o governo
Vargas sofria a oposição de seu próprio partido, o PTB. Nesse contexto, é
perceptível a divisão da sociedade política brasileira entre os pró-americanos
e os nacionalistas (SILVA / CLÓVIS, 2000, p. 121). Além disso, a assinatura do
Acordo pôs fim à aliança entre Vargas e os setores militares nacionalistas, a
qual era uma base de sustentação fundamental para o governo (ALBUQUERQUE/
SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 268).
As bandeiras nacionalistas eram marcadas por suas
orientações estatizantes e de forte hostilidade ao capital estrangeiro. No
outro extremo, manifestavam-se as posições que apregoavam o alinhamento aos
Estados Unidos e a importância dos investimentos provenientes daquele país
(...). Esta polarização pôde ser observada, tanto no caso do prolongado debate
no Congresso do acordo militar Brasil - Estado Unidos, como na acalorada
controvérsia em torno do petróleo (SILVA/CLOVIS, 2000, p. 119). Tal Acordo
possuía as mesmas premissas que o Acordo de 1942, as quais englobavam o
consenso entre os países para a segurança do continente e a preparação de
tropas militares à disposição das Nações Unidas para envio às regiões de ameaça
e, principalmente, ao conflito coreano. Porém, grande parte da sociedade
interna era contrária ao engajamento brasileiro na Guerra da Coréia, o que
dificultava bastante a tomada de decisão de Vargas que sofria ao mesmo tempo
pressões externas e internas (ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 268).
A cooperação Brasil-EUA ganhava um caráter adicional,
o da cooperação nuclear, a partir da assinatura do Acordo Atômico Brasil – EUA,
no final de 1952. A partir desse, houve o comprometimento brasileiro de vender
aos EUA, por um período de três anos, monazita, sais de cério e terras – raras.
Fontoura justificava tal venda pela necessidade de existência de uma cooperação
para defesa mútua. Góes Monteiro, ao mesmo tempo, relatou por escrito ao
general Charles Bolté o contínuo impasse, por falta de apoio popular, à
participação das forças armadas brasileiras no continente asiático. (BARRETO,
2001, p. 194).
Assim como a questão militar, a questão nuclear
apresentava diversos obstáculos. No Brasil, a Lei n. 1.310, promulgada em 1951,
estabelecia o monopólio estatal de minerais radioativos e restringia sua
exportação. Todavia, os Estados Unidos e a Inglaterra, detentores de tecnologia
nuclear e dependentes das matérias-primas brasileiras, discordavam dos termos
de tal lei, o que complicava ainda mais a situação. Mesmo atendendo às
solicitações dessas nações desenvolvidas, Vargas não abandonou sua política de
barganha, visto que buscou cooperação nuclear com a França e com a Alemanha
Ocidental ao perceber a despreocupação dos EUA em relação ao seu programa
atômico (VIZENTINI, 2004, p. 53-54).
Quando o Brasil acordou com os EUA, em 21 de fevereiro
de 1952, a venda de minerais atômicos em troca da transferência de técnicas e
da aquisição de equipamentos para o desenvolvimento do setor nuclear no país, o
último não cumpriu a promessa fazendo o Brasil buscar alternativas, devido à
falta de compensações específicas. Assim, o CNPq negociou, secretamente, com
firmas particulares alemãs a compra de três ultracentrífugas para a separação
do urânio 235; porém a venda não ocorreu devido à problemas internos na
Alemanha (CERVO/BUENO, 2002, p. 282).
Não há como não concluir que – como ocorreu em decorrência
do acordo militar, que colocava o Brasil numa posição dependente dos EUA em
termos de armamentos – a aproximação do Brasil aos Estados Unidos o deixaria
dependente também no referente ao aproveitamento dos minerais atômicos.
Acrescente-se a isso a deterioração dos termos de troca no comércio entre os
dois países (...) (CERVO/BUENO, 2002, p. 283).
3.5 - Diversificação da Agenda Internacional, Pacto
ABC e Petrobrás
Foi a partir dos desencontros entre Brasil e Estados
Unidos que o primeiro optou por criar novas ênfases em sua diplomacia
multilateral, valorizando o sistema da ONU de promoção do desenvolvimento
econômico. (SILVA / CLÓVIS, 2000, p. 119).
Apesar da constante e direta relação com os Estados
Unidos, o Brasil começa a abrir espaço para uma diversificação de sua agenda
externa. O primeiro passo era se aproximar dos países subdesenvolvidos e
promover uma estreita relação econômica e política com os mesmos; o segundo
passo consistia em conseguir uma maior projeção internacional do país. (ALBUQUERQUE/
SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 274).
Em meados de 1952, foi estabelecida pelo Itamaraty uma
missão, chefiada pelo Ministro João Alberto, Chefe da Divisão Econômica do
Ministério das Relações Exteriores, com o objetivo de promover a aproximação
econômica do Brasil com diversos países da Europa Ocidental, visto que estes se
recuperavam aos poucos da guerra. Tanto as relações comerciais com a Rússia,
baseadas na compra e venda de café, quanto as relações com o Leste Europeu se
mostraram mínimas, pois consistiam em mais uma medida de barganha com os Estado
Unidos. A visita ao Brasil do Secretário de Estado norte-americano, Dean
Acheson, evidenciava a preocupação da Casa Branca com a diplomacia de Vargas,
assim, João Neves da Fontoura aproveitou a ocasião para ressaltar a lealdade do
país aos Estados Unidos e a necessidade de se concretizar a cooperação
econômica entre ambos os países, como ocorreu com as cooperações política e
militar. O maior objetivo de Acheson era amenizar as tensões entre os EUA e os
países latino-americanos (VIZENTINI, 2004, p. 55-59).
Com a descolonização de regiões produtoras de matérias
– primas, assim como das regiões asiáticas, africanas e árabes, as
oportunidades do Brasil de diversificar sua pauta de exportações eram ainda
maiores. As relações multilaterais entre Brasil e América Latina ocoriam no
âmbito da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da CEPAL. Enquanto os
Estados Unidos se mostravam contrários à tais relações multilaterais, a CEPAL
formulava políticas de defesa ao desenvolvimento dos Estados latino –
americanos. Mesmo com a oposição dos EUA, a CEPAL foi legitimada e constituída,
com importante participação brasileira, além de ser considerada o principal
foro multilateral para o desenvolvimento econômico da América Latina.
(ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 274-275).
A revolução boliviana de 1952 e a intervenção branca
norte – americana na Guatemala em 1954 foram episódios que relataram a falta de
postura própria do Brasil para um relacionamento independente com a região
latino – americana, pois em ambos os casos o país manteve seu alinhamento com
os Estados Unidos. O Brasil possuía uma posição contraditória, pois condenava a
assimetria das relações entre a América Latina e os Estados Unidos ao mesmo tempo
em que mantinha um alinhamento político com o governo norte – americano. A
presença dos EUA no cenário internacional dificultava os esforços do Brasil de
aproximação com os países da América Latina e com países industrializados,
visto que os países europeus não apresentavam interesse em manter relações com
os países latino – americanos alegando que os mesmos estavam sob área de
influência norte – americana (ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p.
274-276).
A tentativa de Vargas de estender a projeção do Brasil
no exterior resultou na aproximação do país com o Terceiro Mundo. Em seus
discursos, Vargas ressaltava a importância da cooperação comercial e política
entre esses países diante do descaso norte-americano com a região; também
chamou a atenção para a manutenção da paz como meio facilitador do
desenvolvimento econômico. As relações brasileiras eram cada vez mais estreitas
com a Bolívia, Peru, Equador, Chile e Argentina. Tratados relacionados à
exploração de petróleo foram firmados com a Bolívia, aumentando a cooperação
econômica entre ambos. A relação comercial com o Equador se concretizou com a
criação de uma Comissão Mista, ao passo que eram semelhantes os interesses
peruanos e brasileiros em relação à exploração da Amazônia e de recursos
petrolíferos. As relações com a Argentina e com o Chile se confirmaram através
do Pacto ABC (VIZENTINI, 2004, p. 68-70).
O populismo, estilo de política inaugurado por Vargas
e Perón, consistia em uma ameaça aos interesses do governo norte – americano na
América Latina, pois o mesmo era confundido com um movimento de esquerda. Em
meados dos anos quarenta era notável a aproximação política entre Brasil e
Argentina, porém ambos os países tomaram rumos diferentes em relação às
políticas interna e externa. O projeto de política externa de Perón, conhecido
como o da “Terceira Posição”, era de rebeldia à política contencionista norte –
americana, desde a vigência do governo Dutra. A contradição entre as posições,
tanto econômicas quanto políticas, da Argentina e do Brasil no cenário
internacional se mostrava presente na segunda metade dos anos quarenta. No
âmbito político, a Argentina possuia uma posição neutra durante a Guerra Fria,
ou seja, não se aliou a nenhum dos dois pólos de poder existentes, enquanto o
Brasil seguia fielmente a ideologia dos Estados Unidos. Na ONU, o Brasil apoiou
tanto a criação do Conselho de Segurança quanto a criação do Estado de Israel,
ao passo que a Argentina dicordou de ambas as iniciativas. (ALBUQUERQUE/
SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 276-278).
A questão é complicada, pois as relações entre o
Brasil e a Argentina estavam longe de ser definidas. Embora ambos países
buscassem se acercar por complementaridades comerciais e para atenuar a
diplomacia de Washington para a América do Sul, inegavelmente disputavam a
hegemonia regional. E o Brasil, no fundo, mais barganhava que afrontava os EUA,
pois necessitava de uma aliança privilegiada com este país, enquanto a
Argentina ainda era economicamente mais ligada à Europa (VIZENTINI, 2004, p.
74).
Os esforços de Perón estavam em estimular o
envolvimento do Brasil na formação de um bloco latino – americano, porém a
política externa brasileira era completamente oposta à da argentina, sendo essa
diferença um significativo obstáculo à um possível acordo, além do fato de João
Neves da Fontoura ser contrário, desde o retorno de Vargas ao poder, a uma
aproximação com a Argentina. Sendo assim, no cenário interno brasileiro era
considerada como traição nacional qualquer aliança entre Vargas e Perón. Com o
intuito de amenizar as pressões internas, Vargas substituiu seu embaixador em
Buenos Aires, colocando no posto Orlando Leite Ribeiro, que ao contrário de
Neves da Fontoura, defendia uma aproximação com o governo argentino, mas agora
com um tratamento pragmático e não mais passional como antes (ALBUQUERQUE/
SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 279-282).
A assinatura do Acordo Militar com os Estados Unidos
afetou a relação bilateral Brasil – Argentina, mesmo na existência do Acordo
Econômico entre estes países, assinado por Vargas nos primórdios de seu segundo
governo. As tensões aumentaram quando Vargas se recusou a participar do projeto
de criação do Pacto ABC (Argentina, Brasil e Chile) (BARRETO, 2001, p. 195).
O Acordo comercial assinado entre Brasil e Argentina, em
1953, não gerou negociações, pois a imprensa e o meio parlamentar foram
totalmente contra a assinatura do convênio. Tanto em nível regional quanto
bilateral, foram ineficazes as tentativas de fomalização do Pacto ABC. Países
como Bolívia, Paraguai, Chile e Equador mantiveram uma aproximação com a
Argentina, entretanto, o Uruguai e o Peru optaram, juntamente com o Brasil, por
uma diplomacia de distanciamento do governo de Perón (ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/
CASTRO, 2006, p. 283).
O projeto de criação de uma empresa nacional de
petróleo foi defendido por Vargas desde a sua campanha eleitoral, visto que o
seu objetivo era criar um empreendimento prioritário como um marco de seu
governo. O envio da proposta ao Congresso Nacional gerou longas discussões,
internas e externas ao Parlamento, sobre a aprovação da Petrobrás, envolvendo
inclusive diversos setores da sociedade brasileira. Os debates ocorriam em
torno de dois pontos: os alcances do monopólio estatal e a participação
estrangeira na refinação do petróleo. Vargas considerava essencial a cooperação
econômica com os Estados Unidos para a construção das refinarias petrolíferas,
porém os setores privados norte – americanos reivindicavam uma participação
também na exploração do petróleo. (ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p.
284)
A Assessoria Econômica da Presidência da República,
composta por técnicos nacionalistas e defensores da industrialização, do
planejamento econômico e do desenvolvimento econômico, era presidida por Rômulo
Almeida e possuía a função de subsidiar o presidente na questão do petróleo.
Apesar do caráter nacionalista da Assessoria, seus membros adotaram uma
política de permissão à participação de capitais privados internos e externos,
associados ao capital estatal, na criação de uma empresa de pesquisa e produção
de petróleo, visto que a propriedade das jazidas era de monopólio do governo
(VIZENTINI, 2004, p. 61).
O boicote que os Estados Unidos pretendiam realizar em
relação ao abastecimento de petróleo no Brasil não passou de uma ameaça, pois
os equipamentos necessários para a exploração do petróleo e para a montagem de
suas refinarias eram, justamente, fornecidos pelos norte-americanos. Porém, tal
atitude era mais um jogo de interesses devido à intenção dos EUA de evitar que
o Brasil os comprassem na Europa, que voltava a atuar no comércio internacional
(BANDEIRA, 1999, p. 38).
A política petrolífera de Vargas tornara ainda mais
dramáticas as atitudes diversas do Brasil e dos Estados Unidos com relação ao
desenvolvimento econômico. A campanha fortemente emocional que havia cercado os
esforços de Vargas em favor da lei da Petrobrás, chocou e aborreceu muitos
homens de negócios e banqueiros americanos, que encaravam a criação do
monopólio petrolífero estatal como um triunfo do radicalismo irresponsável
(SKIDMORE, 1975, p. 153).
A fórmula do pré – projeto, encaminhado ao Congresso
por Vargas, somava a participação privada nacional e estrangeira com a
propriedade estatal. Ou seja, a economia da Petrobrás deveria ser mista com o
estabelecimento dos percentuais fixos tanto para a participação do capital
nacional quanto para a do estrangeiro. O partido da União Democrática Nacional
mantinha sua postura anti – getulista, ao defender o monopólio estatal na
pesquisa, lavra, refinação e transporte do petróleo. Na votação final, em 1953,
a Petrobrás foi aprovada como empresa estatal. Nesse contexto, o Partido Social
Democrático (PSD) buscava conciliar posições pró e contra o projeto do governo,
ao passo que o Patido Trabalhista Brasileiro forneceu apoio irrestrito à
proposta de Vargas. Washington não escondeu seu descontentamento em relação ao
encaminhamento do projeto no Brasil, o qual sofria constantes influências de
forças nacionalistas. A criação da Petrobras provocou um distanciamento das relações
entre Brasil e EUA. (ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 285).
O grande desenvolvimento da indústria química deu –
se, naturalmente , devido ao petróleo. Depois de longa batalha política, em que
se degladiaram as forças do Brasil novo e do Brasil velho, do nacionalismo
então em plena expansão e do colonialismo minado pelo complexo de inferioridade
nacional, em 1953 foi fundada a Petrobrás. Esta empresa, que teria um papel
fundamental no desenvolvimento econômico do país, produz nos seus primeiros três
anos de funcionamento três vezes mais do que durante os catorze anos e sete
meses anteriores em que a produção ficara sobre o controle do Conselho Nacional
de Petróleo (BARROSO, 1958, p.45 apud PEREIRA, 2003, p.52-53).
3.6 - As pressões externas e a crise de Vargas
Segundo a avaliação do Departamento de Estado e de
João Neves da Fontoura, que abandonou o Ministério das Relações Exteriores
quando os trabalhos da Comissão Mista foram encerrados, Vargas não concluiria o
seu segundo mandato. Além disso, no final de 1953, o Intelligence Adivisory
Comittee14 informou ao Departamento de Estado o péssimo estado de saúde do
presidente e a sua incapacidade física e mental de superar os inúmeros
problemas internos e externos de seu governo. Foi diante das pressões e
principalmente depois de ser divulgado, pelos oficiais da Cruzada Democrática
juntamente com os líderes civis da UDN, o ultimatum dos militares
pressionando a sua renúncia, que Getúlio se suicidou com um tiro no peito
(BANDEIRA, 1999, p. 41-42).
No entanto, em 1953 aprofunda-se a crise econômica, a
oposição política, a mobilização popular e as dificuldades do cenário
internacional. Nessas condições ainda mais difíceis, Vargas vê-se obrigado a
acentuar os elementos autônomos de sua política externa, para lograr manter a
estratégia de barganha e dar continuidade ao desenvolvimento industrial. A nova
situação evidenciou as contradições do projeto varguista e o caráter prematuro
de sua diplomacia. Contra essa, levantaram-se tanto os EUA como os grupos
político-sociais ligados ao projeto da ESG 15 (VIZENTINI, 2004, p. 32).
Muitas dúvidas giram em torno do motivo que levou
Vargas ao suicídio. A instabilidade política tanto interna quanto externa em
1953, geradas pela incapacidade de negociação entre o Estado e a sociedade e
entre o país e o sistema internacional, podem estar entre os fatores que
explicam o ocorrido. Em 1954, quando do suicídio de Vargas, havia a preocupação
por parte dos Estados Unidos de que a Carta Testamento, de teor nacionalista,
por ele deixada tivesse incentivado os comunistas de postura antiamericana. A
morte de Getúlio Vargas encerra uma etapa da política externa do Brasil
(ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 286-287).
Getúlio Vargas foi um líder populista típico. Ao
contrário de muitos outros líderes populistas, porém, foi suficientemente hábil
para realizar a sua missão. Fez um governo de compromissos, soube conceder, mas
não perdeu a visão de seu objetivo geral, como tantos fatos comprovam,
inclusive os resultados econômicos e sociais de seu governo (PEREIRA, 2003, p.
38).
A crise política que levou Vargas ao suicídio foi
causada principalmente pelas pressões externas norte-americanas e internas por
parte dos grupos nacionais em relação à questão do petróleo. Uma prova disso é
o teor da carta-testamento. Porém, segundo Bandeira, não foi comprovado que a
desastabilização de Vargas foi fruto das pressões norte-americanas, há apenas
suspeitas (BANDEIRA, 1989, p. 41 apud CERVO/BUENO, 2002, p. 284).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O período compreendido entre 1946 e 1954 não foi mais
um na trajetória política, econômica e social do Brasil, visto que foi
caracterizado por consideráveis transformações econômicas e políticas no país,
as quais influenciaram a sociedade interna e são perceptíveis até hoje.
A começar pelo governo Dutra, é possível afirmar que
este representou o caminho para o desenvolvimento industrial brasileiro, assim
como para a concretização das relações político-econômicas entre o Brasil e os
Estados Unidos.
Ao optar pela redemocratização do país e pelo abandono
da industrialização do governo anterior, Dutra condenou qualquer forma de
intervencionismo na economia e estipulou a livre importação de bens, ao
considerar que esse mecanismo era a solução para a inflação e para o atraso
econômico do Brasil, porém não imaginou que o retorno aos princípios liberais
provocaria o rápido esgotamento das reservas de divisas do país, e muito menos
que a política de controle cambial adotada resultaria no aceleramento da
industrialização, que naquele momento não era a prioridade do governo. Isso
porque, quando foi adotado pelo governo o intervencionismo na economia, o
crescimento da indústria se fez presente através do regime de licença-prévia,
no qual foram estimuladas as importações de máquinas, equipamentos,
matérias-primas e combustíveis essenciais para o desenvolvimento industrial.
Como no plano externo o governo Dutra assumiu seu
alinhamento político e econômico a Washington, através da implementação da
Missão Abbink, da cooperação militar Brasil – Estados Unidos e de sua postura
anticomunista, era extremamente forte a influência norte-americana no país,
assim como a dependência econômica brasileira aos EUA. O problema estava no
fato de Dutra ter recebido mínimas concessões dessa relação bilateral, apesar
de ter esperado maiores vantagens.
Não é difícil perceber a relação entre o Governo Dutra
e o segundo Governo Vargas, tanto no âmbito interno como no externo. A
industrialização, que na gestão de Dutra foi um processo espontâneo, teve
continuação com Vargas a partir da fórmula nacional – desenvolvimentista, pois
para este, o crescimento do setor industrial através da substituição das
importações era o instrumento essencial para a promoção do desenvolvimento
econômico do país. No cenário interno, ambos os governos sofreram pressões da
oposição, e em relação à diplomacia, tomaram rumos diferentes. O nacionalismo e
o populismo de Vargas preocupavam a Casa Branca, pois ameaçavam a influência
norte-americana no Brasil, o que não ocorria com o governo Dutra que se
mostrava fielmente alinhado aos Estados Unidos.
Ainda no sentido de expor a relação entre Vargas e
Dutra, cabe ressaltar que a Missão Abbink abriu espaço para a criação da
Comissão Mista Brasil-EUA, assim como a cooperação militar entre esses países,
estabelecida ainda na gestão Dutra, criou as bases para a assinatura do Acordo
Militar de 1952. Nenhum desses casos gerou resultados concretos devido à
contradição entre os interesses desses países. Vargas, ao contrário de Dutra,
utilizou todos os possíveis meios de barganha para obter a atenção
norte-americana e seu apoio financeiro no combate ao atraso econômico do
Brasil, mas nunca ignorando os interesses brasileiros. Um exemplo disso foi
quando Getúlio ratificou o acordo de assistência militar recíproca a fim de
amenizar o descontentamento dos Estados Unidos com a sua recusa de envio de
tropas brasileiras à Guerra da Coréia.
A posição dos Estados Unidos como potência hegemônica
mundial com forte poder econômico e político, a qual exercia e ainda exerce
forte influência em diversas regiões do mundo, inclusive no Brasil e na América
Latina, como meio de preservação do sistema capitalista mundial, explica os
esforços, tanto de Dutra como de Vargas, para tirar proveito dessa situação em
prol do desenvolvimento econômico do Brasil.
A diversificação da agenda internacional brasileira se
deu a partir dos desencontros entre os governos brasileiro e norte-americano, e
consistiu em mais uma estratégia varguista para promover o crescimento
econômico do Brasil. Houve tentativas de aproximação com os países em
desenvolvimento e com os países do Leste Europeu, além da aproximação com Perón
através do Acordo comercial que se deteriorou com o fracasso do Pacto ABC.
Porém, ambas as tentativas não passaram de mais um meio de barganha com os
Estados Unidos e foram incapazes de se formalizarem devido à presença
norte-americana no Brasil, a qual afastava os outros países.
Getúlio Vargas foi um líder hábil e persistente em sua
missão de desenvolver economicamente o país. Sua Política Externa foi
caracterizada por um jogo político que objetivava obter apoio, ao mesmo tempo,
de lados extremamente opostos: os entreguistas, apoiados pelos Estados Unidos,
e os nacionalistas; o resultado de tal anseio foi a elevação das pressões
internas e externas sobre Vargas, levando à sua crise final, ou melhor, ao seu
suicídio. Mesmo com a sua morte, a sua influência sobreviveu entre seus
sucessores. A Petrobrás é uma importante herança varguista fruto do seu
nacionalismo, e atualmente é uma empresa essencial para o desenvolvimento
econômico do Brasil, aquele que Vargas nunca deixou de estimular.
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5 Estado em que se encontra.
6 Estado em que se encontra
7 Comissão Econômica para a América Latina
8 Superintendência da Moeda e do Crédito
9 Inn: Decreto n. 34 893, de 5 de janeiro de 1954 apud IANNI, 1986, p. 129.
10 Telegrama de Herschell V. Johnson ao Departamentode Estado, Rio de Janeiro, 9-5-1952, 8 p.m., secreto, apud BANDEIRA, 1999, p. 35-36.
11 Carta de Bohan para Dulles em 29.12.1963. Biblioteca Harry Truman, Papers of Merwin Bohan apud ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 71.
12 Carta de Horácio Lafer a Getúlio Vargas em 27.04.53 apud ALBUQUERQUE/ SEITENFUS/ CASTRO, 2006, p. 273.
13 Brigagão (1978, p.105-107) apud (CERVO/BUENO, 2002, p. 280).
14 Órgão interdepartamental coordenado pela CIA
15 Escola Superior de Guerra
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