quarta-feira, 23 de agosto de 2006

CAPITALISMO, INDUSTRIALIZAÇÃO E SUBDESENVOLVIMENTO NO BRASIL


Resumo

Este artigo visa à compreensão da formação do Estado Nacional brasileiro, a partir dos seus processos de industrialização e implementação do capitalismo estrangeiro. Busca compreender de que forma as ideologias da Cepal e as teorias advindas do ISEB contribuíram para a formação da mentalidade econômica do nosso país e ainda verifica como as raízes capitalistas penetraram a economia nacional e causaram o subdesenvolvimento desde os tempos do Brasil - Colônia.

Palavras-Chaves: Capitalismo, Estado Nacional, economia, governantes brasileiros, história.

Introdução

Os anos que sucederam o término da Segunda Guerra Mundial foram de reconstrução. A Europa, que saiu arrasada do pós-45, beneficiada pela ajuda internacional norte-americana, além da cooperação mútua entre os países do continente, em poucos anos estava reerguida. Na década de 50, os países europeus estavam com suas indústrias funcionando a todo vapor. Os Estados Unidos, mesmo envolvidos no conflito, saíram como vencedores, liderando uma economia forte e uma indústria capaz de abastecer a si e a Europa. Enfim, grande potência mundial.

Assim, tanto os Estados Unidos quanto países europeus, apareciam no cenário mundial como nações ricas e desenvolvidas, mas olhando para a América Latina o que se vê são países pobres, classificados como subdesenvolvidos. Era preciso, então, saber os motivos que fizeram com que esses países não se desenvolvessem, para que lhes fossem prestados auxílio.

1. Os “bons vizinhos” criam uma comissão de auxílio para a América Latina.

Em 1951, a Organização das Nações Unidas (ONU), criou a Comissão Econômica para a América Latina. O objetivo principal da Cepal era explicar o atraso da América Latina em relação aos centros desenvolvidos do capitalismo ocidental; e buscar fórmulas capazes de superar o subdesenvolvimento. Nesse sentido, a análise buscou, de um lado, identificar as peculiaridades do tipo de sistema socioeconômico dos países da periferia.

Uma das primeiras análises feitas pela Cepal, consiste em mostrar as diferenças entre os países desenvolvidos, por eles chamados de centro, e os países subdesenvolvidos chamados de periferia. A Cepal faz uma relação entre centro/periferia, percebendo desde o princípio o processo de difusão do progresso técnico na economia mundial e explicar a distribuição de seus ganhos, demonstrando a divisão internacional do trabalho, provocou efeitos diferenciados nas economias das regiões.

Os argumentos ideológicos da Cepal eram inteiramente pro - intervencionistas. Segundo os cepalinos, durante o século XIX, a América Latina passou a utilizar os princípios liberais, mas não conseguiu avançar, ficando a mercê da estagnação e da pobreza.

Um dos motivos dessa estagnação é que a política econômica adotada por esses países, exportava produtos primários e importava produtos manufaturados. Essa (injusta) relação de troca causa uma extrema situação de dependência. Prado Júnior (2004, p. 270) observa que:

Dessa forma, era preciso então, socorrer-se do Estado para estimular um surto industrial bem como proteger seus manufaturados da competição externa. A Cepal defendia também uma substituição dos produtos de exportação, uma política que visasse a vinda de empresas estrangeiras com modernas tecnologias produtivas para serem implantadas nos países latino-americanos, onde elas produziriam nos países latino-americanos aquilo que antes era preciso importar.

Percebemos que os ideólogos da Cepal tinham em mente um modelo econômico duplo, pois acreditavam promover um amplo setor econômico modernizado convivendo simultaneamente com o setor agrícola tradicional. Para eles, quem deveria determinar onde seriam feitos os principais investimentos deveria ser o Estado e não o mercado. Advogavam ainda, o estímulo ao mercado interno e uma política de reforma agrária para promover sua ampliação.

Os cepalinos, identificados no Brasil como estruturalista, eram os representantes ideológicos do que se chamava na época de “burguesia nacional”.

2. A Cepal procura entender o atraso das nações latino-americanas.

Sem nenhuma exceção, todos os países da América Latina foram colônias de países europeus. Dominação que causou pobreza para a periferia e riqueza para os centros metropolitanos. Os países que compõem a América Latina estão historicamente marcados pela exploração e pela dependência, seja política ou econômica.

Com a chegada dos europeus, a América Latina em sua totalidade foi explorada. Portugal e Espanha fizeram acordos, assinaram tratados, enfim, fizeram a partilha. Foram mais de três séculos de dominação. Depois, quando lutaram pela independência e acreditavam que estavam livres, apareceu a Inglaterra que impôs supremacia econômica, deixando esses países numa situação de dependência econômica. Mais tarde, os Estados Unidos se firmaram como grande nação e disseram: a “América para os Americanos”. Na verdade eles estavam dizendo para os países europeus: “Deixem que a América, nós que a exploramos”.

O que se percebe, é que há uma diferença muito grande no que concerne a formação industrial dos países desenvolvidos em relação aos países subdesenvolvidos. No entanto, os países subdesenvolvidos têm um ponto em comum: todos foram explorados por ricas nações.

No processo de compreensão do atraso presente entre os países periféricos, Toledo (1997, p. 85) explica que:

Mas, a Cepal contestou tal hipótese por meio de comprovações de ordem empírica: seus estudos revelam que os países atrasados sofreram permanentes desvantagens ao se especializarem com meros fornecedores de matérias primas e produtos primários ao mercado internacional. Em contrariedade ao que as teorias clássicas do liberalismo afirmam, os centros industriais não estariam transferindo seus aumentos de produtividade à periferia atrasada. Na verdade, estariam se apropriando dos modernos incrementos de produtividade realizados em países de periferia.

O diagnóstico cepalino implica em uma tomada de posição política e ideológica: seria preciso romper com as visões liberais predominantes, defensoras da “vocação natural” (agrária) das economias periféricas, postulando assim, uma via privilegiada para a superação do subdesenvolvimento crônico: a rápida industrialização dos países da periferia. É certo o reconhecimento dos cepalinos, no período de 1914 a 1945, de que os países da periferia passaram a ter um relativo crescimento “para dentro” – e não apenas “para fora”. Entretanto, tal crescimento, ainda precário, seria insuficiente se condicionado às livres forças de trabalho.

3. O Instituto Superior de Estudos Brasileiros.

Segundo Sodré (1978, p. 12), o Instituto Superior de Estudos Brasileiros inicia-se quando “um grupo de intelectuais, que englobava alguns assessores do Governo Vargas, decidira conjugar esforços para organizar um instituto que se especializaria no estudo, na pesquisa e no planejamento de tudo o que se relacionasse com a realidade brasileira”.

Assim, no início da década de 1950, o denominado Grupo de Itatiaia, liderado por Hélio Jaguaribe, articula uma instituição denominada Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política (Ibesp), que edita cinco números da revista Cadernos de Nosso Tempo, entre 1953 e 1956. Dessa forma, aglutina-se o que viria a ser o núcleo de intelectuais fundadores do ISEB.

Como tal, o ISEB é constituído em julho de 1955, ainda no governo de Café Filho – baseado no modelo jurídico da Escola Superior de Guerra (ESG), criada em 1949 – por solicitação do Ministro da Educação Candido Mota que foi convencido pelo grupo de intelectuais ibespianos.

Vinculado e financiado pelo Ministério da Educação, não obstante, o ISEB possui plena liberdade de cátedra. Através de cursos em sua sede e no MEC e de publicações diversas, o ISEB difundia sua elaboração nacionalista e formava quadros para o Estado e para a sociedade brasileira.

Sendo um órgão multidisciplinar por excelência, tinha como diretor, o filósofo Roland Corbisier, e estruturava-se em cinco Departamentos: o de Filosofia, chefiado por Álvaro Vieira Pinto; o de História, por Candido Mendes – com coordenação docente no curso de História Brasileira, do pensador marxista Nelson Werneck Sodré, então recém-egresso do Exército –; o de Sociologia, por Alberto Guerreiro Ramos; o de Ciência Política, por Hélio Jaguaribe – tido como o líder principal do grupo que originou o Instituto –; e o de Economia, com Evaldo Correa Lima – cujo mais destacado colaborador foi Ignácio Rangel.

Já na sua origem, esse núcleo de intelectuais vincula-se à candidatura de Juscelino Kubitschek, prestando-lhe assessoria. Com a vitória de Juscelino e sua posse em 1956, o ISEB passa então a viver o auge de sua experiência, na qual parte importante de sua plataforma desenvolvimentista se materializa através do Plano de Metas – ainda que a sinergia entre o Plano de Metas e o desenvolvimentismo isebiano só pôde ser concluída contemporaneamente, numa visão de processo, com os olhos de hoje.

É, pois, a fase áurea do ISEB, na qual logra reunir em suas fileiras, numa frente-única, expressiva parcela da intelectualidade progressista brasileira, sob propósitos semelhantes e certa identidade no pensamento. “O que alguns estudiosos da experiência isebiana chamam equivocadamente como “posições ideológicas ecléticas e, conflitantes”, ou ainda, autênticos arco-íris ideológico” (Toledo: 1997), é mais corretamente qualificado como a expressão de uma ampla aliança, favorecida então por um entorno político favorável entre marxistas e outros nacionalistas e democratas. Dessa fase e de sua amplitude e unidade, reside o prestígio do ISEB na sociedade brasileira nos anos seguintes. Nessa primeira fase, como demonstração dessa ampla frente da intelectualidade progressista que se tornara, figuram em seu Conselho, nomes do porte de Anísio Teixeira, Gilberto Freyre, Heitor Villa-Lobos e San Thiago Dantas.

Mas, dado os limites e veleidades características de uma instituição com características de frente-única, a partir de 1958 eclode a crise que resultaria em defecções no ISEB, que então passa a vincular-se mais estritamente à política do PCB. O pretexto para a crise, se dá a partir da publicação do livro de Hélio Jaguaribe, O nacionalismo na atualidade brasileira (1958), no qual o autor reconhece “um papel positivo para os investimentos estrangeiros diretos” (Bresser Pereira: 2004).

Num período em que o ISEB se encontrava sob forte ofensiva da reação conservadora, o debate é o rastilho de pólvora para Guerreiro Ramos entrincheirar-se na “denúncia do livro, tido como herético” por defender o ingresso de capital estrangeiro no país, pelo que o sociólogo defendeu nada menos que a expulsão de Helio Jaguaribe da instituição.

Essa crise provocou uma “cisão ideológica de todo inoportuna, inadequada, sectária” (Sodré: 1978). Com a cisão e com a exclusão de importantes setores de centro no espectro político – que conferiam o caráter de frente-ampla ao instituto –, “daí por diante ‘purificado’ politicamente, o ISEB debilitou e foi isolado (...) A crise do ISEB foi, pois, grande serviço prestado a reação e particularmente ao imperialismo” (Sodré: 1978). Esse testemunho de Werneck Sodré é chave, pois na nova fase, até a extinção do ISEB em 1964, ele, junto com Corbesier e Vieira Pinto foram as principais referências da instituição.

Assim transcorre a segunda fase da experiência ISEB (1959-1964), durante a qual, acompanhando o clima de intensa radicalização do país, o Instituto passa a engajar-se ativamente na luta política e social da época, com ênfase na presença militante no movimento pelas Reformas de Bases do governo João Goulart.

Dias após o golpe de 31 de março de 1964, o ISEB junto com a UNE estão na primeira lista de entidades liquidadas pelo regime, sendo a sede de ambas, e todo o seu acervo, destruídas ainda em abril daquele ano.

De acordo com Toledo (1991, p. 92):

Percebe-se, no entanto, que tanto os intelectuais da Cepal como os do Iseb buscaram a independência econômica dos países da América Latina. A industrialização endógena para ambos, era a única forma de reduzir a pobreza e tirar os países da dependência econômica do capital estrangeiro, ao passo que a exógena somente iria aumentar esse problema social.

Acreditavam ainda, que fosse por meio da industrialização interna que se construiriam as bases econômicas internas e assim ia se liquidando com a pobreza, com a exploração da mão-de-obra e a alienação do trabalhador latino americano, pois saquear a América latina foi o maior projeto do colonizador.

4. Desenvolvimento do Brasil nas décadas de 1950 e 1960

4.1. O Governo de Eurico Gaspar Dutra

O governo Dutra (1946-1951) foi marcado pela instabilidade social e altas taxas de crescimento econômico. Além da repressão aos comunistas, ocorreram intervenções em sindicatos e prisões de lideranças operárias. As greves e manifestações dos trabalhadores eram provocadas pelas perdas salariais decorrentes da inflação do período pós-guerra. Em lugar de elevar os salários, Dutra promoveu uma liberalização da economia permitindo a ampla entrada de produtos norte-americanos no mercado brasileiro. Através da livre-concorrência, os economistas do governo acreditavam que ocorreria uma redução geral dos preços praticados.

O alto índice de importações provocou uma enorme evasão de recursos acumulados na Segunda Guerra Mundial, obrigando o governo a rever sua política econômica liberal. Em 1947, foi estabelecido um sistema de controle de importações e valorização da moeda nacional, com o objetivo de estimular a produção para o mercado interno. No mesmo ano era anunciada a elaboração do Plano SALTE, que previa a implantação de recursos nas áreas de Saúde, Alimentação, Transporte e Energia. O plano, por falta de investimentos foi um grande fracasso.

4.2. Mais um mandato de Getúlio Vargas

Getúlio Vargas, que já havia sido presidente do Brasil três vezes, assume novamente o poder em janeiro de 1951. No início do mandato, procurou estabilizar a economia, detendo a inflação e equilibrando as finanças públicas, e permitiu o aumento das importações como tentativa de diminuir as taxas inflacionárias que registravam altos índices.

A adoção da receita liberal, que previa a diminuição da intervenção do Estado na economia, o corte de gastos públicos e a maior participação do capital estrangeiro no mercado nacional, foram, no entanto, passageira. Além da inflação, o país esteve às voltas com um gigantesco déficit, provocando o esgotamento das suas reservas financeiras e atrasos na quitação de suas dívidas.

Getúlio Vargas percebia que o país só cresceria quando possuísse industrialização, pois só assim, superaria os obstáculos no balanço de pagamentos tão tumultuados visto no governo de Dutra. Skidmore (2000, p. 189) afirma que:

Assim, a política nacionalista, apesar de apontar para a independência e a soberania nacionais, via-se limitada pela conjuntura internacional. Ao contrário dos tempos da Segunda Guerra, não havia grandes margens de manobras nas negociações com os Estados Unidos, e um rompimento com a principal potência capitalista seria complicado. Por outro lado, para financiar o desenvolvimento do país era necessário atrair capitais estrangeiros.

Mesmo assim, o governo manteve o crédito a setores empresariais e passou a investir fortemente em infra-estrutura e energia, visando acelerar a industrialização do país.

A política do governo, se de um lado inspirou acertadamente a necessidade de se promover o processo de industrialização do país, fracassou na realização dos seus objetivos declarados, pois levou o país a grave situação de altíssimos índices inflacionários. Afirma Prado Júnior (2004, p. 309) que:

Em 1953, Getúlio Vargas criou a Petrobrás, empresa que deteria o monopólio do refino e da exploração de petróleo, fundamental, no entender dos nacionalistas, para a soberania do Brasil. Importante lembrar que esses gastos públicos, somados ao aumento da circulação monetária do país, mantiveram elevados índices inflacionários.

Em 1954 instaurou-se em nosso país uma grande crise econômica e política, que Vargas não conseguia conter. Em agosto desse ano, Getúlio suicidou-se com um tiro no peito e como ele mesmo disse, deixou a vida para entrar na história.

4.3. “Cinqüenta anos em cinco”: Governo de Juscelino Kubitschek.

Juscelino Kubitschek foi eleito em 1956, seu primeiro passo foi traçar o Programa de Metas. Programa que incluía um conjunto de metas para aumentar a produção em todos os setores do país. O objetivo era unir o Estado e o setor privado numa estratégia de alto crescimento, com a finalidade de acelerar a industrialização e a construção da infra-estrutura necessária para sustentá-la.

Em termos ideológicos, a estratégia econômica de Juscelino era centrista, e incluía intenso investimento público como também muitos incentivos para investimento privado. Na esfera pública, o Banco Nacional para o Desenvolvimento Econômico deveria canalizar fundos para grandes projetos de infra-estrutura. Na esfera privada, por exemplo, uma comissão governamental solicitou ofertas para a criação de uma indústria automobilística nacional sob termos cambiais externos favoráveis. Juscelino e seus assessores tinham esperanças de contornar as amargas divisões ideológicas que haviam ajudado a arruinar o governo Getúlio Vargas, por meio de estratégia política de proporcionar benefício a todos.

O presidente Juscelino Kubitschek conseguiu alcançar seu objetivo básico de rápido desenvolvimento econômico e industrialização. Quando deixou a presidência, no início da década de 60, o Brasil tinha uma indústria de veículos motorizados e estava a caminho de criar muitas indústrias subsidiárias vitais à produção de veículos. Houve ainda nesse período, impressionantes avanços no setor de eletricidade e na construção de estradas.

Os cepalinos criticavam o “imperialismo” comercial e financeiro dos centros metropolitanos, mas mesmo assim, Juscelino soube muito bem aproveitar as oportunidades das negociações com o capital internacional.

Assim, a determinação de Juscelino em seguir seu programa econômico assegurou uma crise contínua do balanço de pagamentos. Os ganhos de exportação do Brasil, que ainda vinham basicamente de uns poucos produtos primários, permaneciam estagnados, enquanto suas importações, que incluíam bens de capital e aplicações essenciais à indústria, haviam crescido. O Brasil só poderia sustentar um déficit na conta comercial se obtivesse financiamento externo para cobrir a diferença, ou por meio de investimento estrangeiro ou de empréstimos e subsídios.

A busca de crescimento rápido sem financiamento adequado inflamou a inflação do país. Ao invés de desacelerar o programa, reduzindo o déficit do governo, a equipe de Juscelino tolerava o aumento dos preços. A inflação e o déficit nos pagamentos andavam juntos em 1958, forçando o Brasil a negociar um acordo de estabilização com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Skidmore (2000, p. 207-08) afirma que:

Um ponto importante que podemos destacar, é que estamos aqui diante de uma das formas de exploração americana nos países da América Latina. Uma exploração que se dá através de financiamentos e empréstimos. É nesse contexto que aparecem o FMI, Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial. Através dessas instituições, genuinamente americanas, os países subdesenvolvidos contraem empréstimos, acreditando no desenvolvimento, mas com o passar do tempo percebem que na verdade, só é mais uma forma de dependência. Assim, os países que contraíram os empréstimos ficam endividados, aumentando ainda mais a sua dívida externa. Diante de tudo isso, Juscelino assumiu um risco: rompeu com o FMI e continuou seu programa a qualquer custo.

Na verdade, o Brasil passou por um período de intensa agitação econômica, com um forte crescimento econômico, mas, paradoxalmente, uma população vivendo com disparates sociais, onde os ricos ampliavam cada vez mais seus rendimentos e os pobres possuíam cada vez menos da parcela das riquezas nacionais.

É inegável que a política de Juscelino deu grande impulso ao desenvolvimento econômico do país. Mas, ao mesmo tempo, seu governo foi responsável pelo agravamento de antigos problemas, como as desigualdades sociais, as diferenças regionais e a defasagem entre setores arcaicos e modernos da economia. Nesse período, a dívida externa cresceu e o controle de setores fundamentais da economia pelo capital estrangeiro também aumentou.

4.4. João Goulart e as Reformas de Base.

Com a renúncia de Jânio Quadros, João Goulart assumiu a presidência, pretendendo resolver os problemas urgentes da sociedade brasileira. Uma das iniciativas foi conseguir no Congresso a votação para as Reformas de Base – agrária, bancária, urbana e educacional.

A conspiração de direita se organizava. Setores militares, políticos da UDN, governadores de Estado e empresários promoveram uma grande campanha divulgando que o presidente era comunista. Assustada, uma parte da classe média passou a apoiar os golpistas.

Diante das pressões contrárias e da crescente radicalização, Jango chamou as massas para uma grande manifestação em seu favor – um comício pelas reformas de base – na praça em frente à Estação da Central do Brasil, no Rio de Janeiro.

A direita também partiu para a mobilização de rua, como forma de legitimar o golpe de Estado. No dia 19 de março, dezenas de milhares de manifestantes saíram às ruas de São Paulo na Marcha da Família com Deus pela Liberdade, exigindo o fim do governo Jango e dos comunistas.

Sob a liderança política dos governadores Carlos Lacerda, da Guanabara, Adhemar de Barros, de São Paulo e Magalhães Pinto, de Minas Gerais, a direita desencadeou o golpe de Estado para depor o presidente. Em 31 de março de 1964, tropas instaladas em Minas Gerais tomaram a direção do Rio de Janeiro, que ainda era um centro de poder importante, com apoio das principais unidades militares do país. No dia 2 de abril uma junta militar tomou o poder, e no dia 15 tomava posse da presidência o general Humberto de Alencar Castelo Branco. Iniciava-se, assim, a ditadura no Brasil.

5. A formação do Estado Nacional e o desenvolvimento capitalista no Brasil.

Existe um rico debate no campo do marxismo brasileiro sobre as particularidades da nossa formação econômica e social. Isto tem impacto direto sobre a compreensão que temos sobre a própria formação e particularidades do Estado no Brasil. Faremos uma descrição brevíssima e, portanto, limitada das três principais correntes.

O grande historiador e membro do PCB Nelson W. Sodré, grosso modo, define o modo de produção predominante no pré -1930 como semi-feudal - assentado no latifúndio e nas relações sociais pré-capitalistas. Para ele, a Revolução de 1930 foi o marco fundador da sociedade burguesa no Brasil, mas que não rompe definitivamente com os resquícios feudais - portanto, a revolução democrática burguesa (anti-latifundiária, antiimperialista) continuava na ordem do dia. O Estado só poderia ser um Estado com características semi-feudais (pré-burguesas) - Esta visão, sobre a sociedade brasileira, impregnou fortemente a construção da tática e da estratégia dos comunistas brasileiros até a década de 1970.

O historiador Caio Prado Jr., também membro do PCB, pelo contrário, definia o modo de produção no Brasil, desde as suas origens, como capitalista - pois a economia brasileira se inseria nos marcos da circulação capitalista de mercadorias e capitais. Portanto, o Estado brasileiro sempre foi um Estado capitalista. A conclusão lógica é que não teria lugar para se falar de uma revolução burguesa no Brasil. Isto levou a uma subestimação das tarefas democráticas, especialmente a reforma agrária anti-latifundiária.

O historiador Jacob Gorender, também ex-militante do PCB, afirmou que o modo de produção no Brasil, da colônia até 1888 foi escravista colonial (ou escravista moderno). Ao contrário de Caio Prado Jr. as relações de produção tem centralidade na análise de Gorender.

O sociólogo Décio Saes, seguindo as indicações de Jacob Gorender, afirmou que o Estado nacional brasileiro foi de 1822 até 1888, um Estado escravista moderno e se transformou em Estado burguês após a proclamação da República e a promulgação da Constituição de 1891. Para ele a revolução de 1930, embora não fundante foi um dos momentos fundamentais da consolidação do Estado burguês moderno no país. Esta posição, com algumas nuanças, foi defendida por José Carlos Ruy em vários artigos publicados na revista Princípios, sob o título de Visões do Brasil. Para Ruy a nossa revolução burguesa foi uma revolução incompleta.

Toda esta longa introdução, ainda limitada e insuficiente, é para justificar a opção por uma das explicações sobre a gênese e as particularidades do Estado capitalista no Brasil: aquela que afirma que o Estado brasileiro antes de 1889 não poderia ser considerado, estrito senso, como um Estado capitalista.

O Estado brasileiro era fundamentalmente um Estado pré-capitalista - um Estado escravista moderno - que em grande parte obstaculizava o desenvolvimento do modo de produção capitalista no Brasil e era em relação a ele disfuncional.

Até hoje se vive essa grande contradição econômica, uma economia dual, agrária e industrial. Encontramos no Brasil o maior Centro Industrial da América Latina, encontramos também um grande número de profissionais estrangeiros no local, pois o planejamento do governo foi industrializar o Brasil, mas não se preocupou em qualificar o povo brasileiro para exercer tais funções. O governo brasileiro na época, queria sim se igualar com as grandes potências, mas do que adianta montar um parque Industrial e as indústrias serem todas estrangeiras? O Brasil ainda continua na condição de colônia e grande fornecedor de matéria prima para a grande metrópole estadunidense.

Considerações Finais

Conclui-se que a partir da década de 50, os países da América Latina e, em especial o Brasil, precisaram de comissões e institutos que idealizassem e provocassem o desenvolvimento econômico através de uma industrialização, na maioria dos casos, tardia. Percebeu-se também que o Estado capitalista moderno só pode se implantar após a abolição da escravidão e a proclamação da República.

A revolução de 1930, por outro lado, foi um dos marcos fundamentais na consolidação deste Estado e para a construção das bases fundamentais de um capitalismo verdadeiramente nacional. Os anos de 1888/1889 e de 1930 são decisivos para compreendermos o processo de constituição do Estado capitalista no Brasil e suas limitações.

Referências Bibliográficas

FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 33{ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2004.

MARANHÃO, Ricardo. Trabalho e Civilização. Uma história global. São Paulo: Moderna, 1999.

PRADO JÚNIOR, Caio. História econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 2004.

SKIDMORE, Thomas E.. Uma história do Brasil. Tradução de Raul Fiker. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

TEIXEIRA, Francisco M. P. e TOTINI, Maria Elizabeth. História Econômica e Administrativa do Brasil. São Paulo: Ática, 1989.

TOLEDO Caio Navarro de. Estado Nacional e desenvolvimento capitalista do Brasil.

sexta-feira, 27 de maio de 2005

FILME – QUASE DOIS IRMÃOS – RESENHA

Retrato contundente do impasse social brasileiro
Quase dois irmãos, de Lucia Murat, é sobretudo um filme sobre conflitos. Conflito entre dois amigos de infância cujas vidas correram paralelas em similitudes e diferenças. Conflito entre caminhos que, como assinalou Borges, se bifurcam, pontuando a distância que há entre os sonhos que alimentamos e seus desenhos concretos. Conflito, enfim, entre duas épocas – o final dos anos 60, ápice autoritário da ditadura militar, e os dias de hoje, quando o país encurrala-se no impasse aparentemente sem solução do crescente poder e sedução do narcotráfico.
Os dois amigos, no caso, são Miguel (Caco Ciocler) e Jorge (Flavio Bauraqui), que se conheceram ainda crianças devido ao apreço entre seus pais – o do primeiro, um intelectual apaixonado pela cultura popular; o do segundo, um sambista negro e morador do morro. A ponte cultural sugerida já no princípio do filme é, pois, a união possível entre esses dois lados da frágil moeda social brasileira – e também o ponto de partida para a diretora investigar de que maneira acabamos chegando ao dilema que ora nos aflige.
A trajetória de Miguel e Jorge será acompanhada ao longo de suas histórias pessoais, sempre conectadas a um fundo político e centradas em dois momentos básicos: a convivência na Ilha Grande, onde foram enquadrados na mesma Lei de Segurança Nacional - respectivamente por motivos políticos e por assalto - e o reencontro na atualidade, quando um virou deputado federal e o outro, líder do Comando Vermelho. Murat repisa a tese de que o convívio de detentos comuns com os articulados representantes dos movimento de esquerda corroborou para o nascimento do chamado ‘crime organizado’. E renova, agora através da paixão da filha adolescente de Miguel pelo ritmo do funk e por um jovem traficante, o paradoxal vínculo de repúdio e fascínio que fração dos segmentos mais estudados mantém com relação ao que é marginal.
Assim, mais do que fazer um simples recorte a respeito de certos aspectos do Brasil sob a mão pesada dos militares, a diretora expõe dilemas que nos flagelam hoje, com a cisão entre a classe média insegura, refém do próprio individualismo, e o imenso contingente de pobres que, cada vez mais afeitos aos signos do consumo, optam por trocar anos de vida por algum glamour, nem que seja meramente local. Um glamour cujo financiamento é feito pela própria classe média, num moto-contínuo sem freio ou solução imediata. Esse dois mundos, que se esbarram com progressiva freqüência, são muito bem retratados no roteiro, assinado em parceria por Murat e pelo escritor Paulo Lins, ela ex-militante política, ele autor do romance Cidade de Deus.
Com uma competência técnica que (felizmente) não abdica da contundência, Quase dois irmãos explicita a conivência policial, a coexistência compulsória da comunidade com os criminosos, a violência gratuita de quem se crê onipotente, todos estes elementos que contribuem para o mérito do filme de não enveredar por otimismos cândidos, nem apontar dedos para nichos exclusivos. Pelo contrário. Se Murat concede ao Estado sua parcela de culpa, em contrapartida não livra a cara o indivíduo - cuja imagem, na produção, faz lembrar a “superfluidade” conceituada pela grande Hannah Arendt. Uma imagem que esboça impotência acomodada, como se nada que se diga, se queira ou se faça vá importar para a sociedade.
Entre as atuações, destaque para os elencos dos grupos Nós do Morro e Nós do Cinema, que representam os jovens do tráfico, e para Flavio Bauraqui, no ponto exato como o estrepitado Jorge. Merece citação a sensacional seqüência em que, diante da lancinante dor-de-cotovelo do amigo, ainda dentro da prisão, Jorge o consola, e consegue transformar a situação essencialmente dramática numa verdadeira catarse. O trabalho de Ciocler é prejudicado pelos traços um tanto estereotipados do militante de esquerda sessentista. Isso, embora seja possível especular se alguns deles não constituíam de fato estereótipos em si.
Em meio a tantas qualidades, é preciso salientar que Quase dois irmãos por vezes esbarra no didatismo e chega a abusar de metáforas à beira do lugar-comum. Um bom exemplo é a passagem em que os detentos da Ilha Grande propõem – e constróem – um muro que a partir de determinado momento dividirá o pavilhão entre presos políticos e os presos comuns. Desnecessária, a alegoria acentua o que já está bastante claro para o espectador.
São, entretanto, problemas menores num filme tão urgente quanto o estado de coisas que, mais do que apenas denunciar, procura compreender, numa abordagem à beira do documental, muito valorizada pela fotografia de Jacob Solitrenick. A câmera na mão possibilita a agilidade e o vigor adequados à trama. E, em alguns momentos, se permite vôos para além do realismo. É o que acontece num plano-síntese no qual Jorge, já alçado ao comando do tráfico, descansa em sua cela, coberto pela sombra das grades em contraluz. Sugestão sutil de que dentro da atual perspectiva não há liberdade possível; de que sua clausura estende-se para além do presídio, e o acompanhará aonde esteja ou para onde vá. Assim como a de Miguel. E infelizmente, talvez, como a de cada um de nós


sexta-feira, 22 de abril de 2005

MINI PROJETO DE ESTUDOS INDÍGENAS

Objetivos:
- Conhecer e refletir sobre a história dos índios;
- Conhecer, analisar e debater os hábitos e costumes indígenas;
- Conhecer, analisar e debater a influência indígena em nossa vida;
- Aprender a respeitar os índios com a finalidade de construir a cidadania numa sociedade pluriétnica e pluricultural;
- A partir do tema gerador desenvolver atividades nas diferentes Áreas de Estudo.

Objetivo Proposto nos PCN’S de interesse no presente projeto:
- Conhecer e Valorizar a pluralidade do patrimônio sociocultural brasileiro, bem como aspectos socioculturais de outros povos e nações, posicionando-se contra qualquer discriminação baseada em diferenças culturais, de classe social, de crenças, de sexo, de etnia ou outras características individuais e sociais.

PLANEJAMENTO:
Propostas de Atividades que trabalharão os temas transversais: Ética, Saúde, Meio Ambiente, Pluralidade Cultural e Cidadania.

Sensibilização:
- Propor aos alunos que pesquisem e levem para sala de aula recortes de fotos de pessoas que possam parecer descendentes indígenas. Com todas as fotos em mãos, o professor em círculo analisará juntamente com os alunos cada foto. Procurando incentivar para que todos dêem sua opinião. Em um segundo momento listar em um cartaz os conhecimentos que os alunos já tem sobre o assunto ( Conhecimentos Prévios ).
- Provocar os alunos a se expressarem, fazer indagações e ir registrando em um cartaz. Logo em seguida, em um outro cartaz, listar as dúvidas provisórias dos alunos, ou seja, perguntar o que desejam saber sobre o tema e ainda não sabem, novamente provocar os alunos a fim de lançarem suas dúvidas.
Por último, propor que os alunos ilustrem os cartazes com fotos e desenhos.

Propostas de Atividades de Integração das Áreas de Estudo:
GEOGRAFIA:
- Localizar em Mapa ou Globo Terrestre pontos do território nacional onde ainda vivem tribos indígenas;
- Comparar o modo de vida dos índios de outras regiões com o modo de vida dos índios que ainda habitam a floresta amazônica, o pantanal mato-grossense, as praias nordestinas, o sudeste brasileiro e os assentados em áreas urbanas.

HISTÓRIA:
- Reconhecer os modos de vida dos índios, sua cultura, sua alimentação, formas de trabalho e sobrevivência;
- Refletir e opinar sobre o papel do índio na formação da nação brasileira

LINGUÍSTICA:
- Levantar o vocabulário usado pelos indígenas e descobrir seus significados;
- Produzir, utilizando diferentes formas de expressão, textos individuais e coletivos sobre os debates e as reflexões do assunto;
- Orientar os alunos para elaborarem pequenos textos sobre cada descoberta realizada;
- Ler histórias originalmente indígenas ou que tratem do indígena e seus valores;
- Organizar um dicionário ilustrado com as palavras indígenas.

ARTES:
- Observar manifestações de arte da cestaria, da cerâmica, da plumaria e de outros objetos de cerdas vegetais e cordas, realizados pelos índios de hoje e de antigamente;
- Observar ilustrações de artistas do tempo do Brasil – Colônia que retrataram o indígena e suas manifestações culturais;
- Vivenciar através de músicas sobre o tema um pouco da cultura indígena – cantando e dramatizando;
- Vivenciar através de atividades artísticas manuais e plásticas um pouco da cultura indígena, criando objetos e instrumentos musicais.

Formulação de Problemas:
- Questionar em classe:
- Ainda existe preconceito com os índios?
- O que as crianças sabem, pensam e acham sobre isso?
- O que podem e o querem fazer para ajudar a mudar o quadro dos preconceitos e discriminação?
- A culinária indígena é usada na cozinha brasileira? Como?
- Ainda são encontrados locais de agrupamentos e reservas indígenas?
- Quais são essas tribos? Como vivem? Como se mantêm? Quais os seus atuais costumes?
- Quais são as palavras e costumes de origem indígena?
- Há influência dos índios na Língua Brasileira?
- Há influência dos índios no artesanato?
- Há influência dos índios na medicina caseira? E nos adornos pessoais?

segunda-feira, 4 de outubro de 2004

O ÔNUS E O BÔNUS DE SER PROFESSOR

O papel e a atuação do professor já não é há muito tempo a mesma do passado. Antes ele detinha “todo” conhecimento e depositava nos seus alunos aquilo que havia estudado. Porém, esse estudo era normalmente lido e repassado para eles sem reflexão ou visão crítica dos conteúdos.
Hoje, felizmente, podemos e devemos ensinar nossos alunos a pensar, a questionar e a aprender a ler a nossa realidade, para que possam construir opiniões próprias.
Para que isto ocorra o professor deve, em primeiro lugar, gostar e acreditar naquilo que faz, ou seja, através de seus atos e ações ele servirá de modelo para seus alunos; se ele ensina a refletir ele deve também refletir, se ele ensina a respeitar o próximo ele deve respeitar seus alunos e assim por diante. Deste modo ele está sendo uma prova viva daquilo que está ensinando, pois bem a sua frente existem seres humanos que estão sendo moldados por ele.
O aluno é como se fosse um solo fértil , onde o professor semeia suas melhores sementes para que se produzam belos frutos. A relação professor/aluno deve ser cultivada a cada dia, pois um depende do outro e assim os dois crescem e caminham juntos. E é nessa relação madura que o professor deve ensinar que a aprendizagem não ocorre somente em sala de aula. Se estivermos atentos aprendemos a todo momento e não só na escola com o professor. Assim, o aluno irá desenvolver um espírito pesquisador e interessado pelas coisas que existem; ele desenvolverá uma necessidade por aprender, tornando-se  um ser questionador e crítico da realidade que o circunda. Como diz o filósofo: “O verdadeiro objetivo da Educação não é meramente prover informação, mas o estímulo de uma consciência interna” (Al- Ghazali).

PROFESSORES QUE INSPIRAM, por Dr. Anthony P. Witham
” Professores que inspiram . . .percebem que , em última análise, não irá contar o quanto seus alunos aprenderam , mas o quanto acumularam conhecimento e habilidades que possam ser usadas por toda a vida;despertam o potencial infantil ao invés de reprimi-lo; elogiam o esforço de cada aluno ao invés de ignorá-lo, estimulam ao invés de encobrir a curiosidade da criança;percebem que eles devem respeitar seus alunos, sem impor seus valores pessoais, pois cada um precisa explorar e estabelecer seus valores próprios; ajudam os alunos a descobrir seus dons, porém esses talentos “escondidos” podem ser facilmente dominados se o principal enfoque estiver no texto ou na avaliação, e não na criança; disponibilizam seu tempo espontaneamente e lembram-se de encorajar aqueles que têm mais dificuldades;corrigem os erros do aluno e elevam sua auto-estima ao mesmo tempo; motivam mentes jovens a pensar por eles mesmos , muito mais do que se preocupam com fatos que exijam memorização; percebem que o maior de todos os presentes que eles podem oferecer a seus alunos não é seu talento pessoal ou sua esperteza, mas ajudar cada a um a descobrir e a se apropriar de sua própria esperteza e talento; encorajam mentes a pensar, mãos a criar e corações a amar – professores que exigem muito e que recebem muito; nunca se empenham em explicar sua visão pessoal de mundo, mas simplesmente convidam seus alunos a ficarem ao seu lado para que eles possam ver o mundo por eles mesmos; minimizam as deficiências de seus alunos e realçam seu dom natural.
Tais professores nunca forçam um dançarino a cantar nem um cantor a dançar. Eles permitem com que seus alunos acendam sua própria “lâmpada” no momento e da maneira deles; acreditam que a comunicação em sala de aula não melhora  se falada em voz muito alta; acreditam que exemplo não é uma ferramenta de influências para impressionar mentes jovens, e sim a chave para moldar atitudes positivas, valores e hábitos de estudo para os alunos; recordam seus alunos de que ganhar não é tudo na vida, mas ir em busca de seus ideais sim; sabem que o presente mais valioso do mundo não é dinheiro nem livros, mas ter uma vida nobre; não acham que eles têm que estar com seus alunos, eles querem estar com eles. Ensinar não é uma profissão , mas uma escolha que optaram em consideração ao próximo; concordam com Eleanor Roosevelt que disse, “O futuro pertence àqueles que acreditam na beleza de seus sonhos”; percebem que na vida de cada aluno existe um espaço esperando ser preenchido pelo professor, que pode comunicar auto confiança, criação de talentos que não foram descobertos e incentivo às atitudes na vida para o seu crescimento; inspiram bons sentimentos nas crianças e na juventude, pois sabem que eles nunca irão conseguir medir o quanto influenciaram na vida de uma criança; acreditam que algum dia seus alunos irão perceber que eu estou lá para ajudá-los a alcançar seus objetivos ou a completar suas tarefas, a melhorar sua auto-imagem e que existem algumas fronteiras que eles não podem alcançar; acreditam no credo: “ensine aquilo que a sua consciência achar certo; ensine aquilo que a sua razão disser que é o melhor; ensine com toda o seu espírito e poder; faça o seu dever e seja abençoado”; acreditam que aprender, fazer e ensinar acontecem quase que ao mesmo momento na vida -elas ocorrem normalmente simultaneamente. A criança que estamos ensinando a ler e a escrever está, ao mesmo tempo, nos ensinando sobre a inocência e a maravilha; tentam garantir a cada criança oportunidades iguais – não se tornar “igual” mas “diferente”, compreender todo potencial do corpo, mente e espírito que ele ou ela possui; optam por alternativas positivas em estabelecer disciplina em sala de aula, ao invés de depender unicamente das formas diversas de punição; encorajam e afirmam para a criança não aquilo que ela é, mas aquilo que ela virá a ser; estão sensíveis por saber o quanto suas palavras e ações podem afetar seus alunos positiva ou negativamente; acreditam que um relacionamento positivo entre aluno e professor se origina através do respeito; suscitam atitudes positivas em sala de aula e criam uma corrente contínua de pensamentos e idéias positivas; são entusiastas, enérgicos e eternamente otimistas em relação à potencialidade de seus alunos; concordam com o pensamento de Grayson Kirk’s que diz: “A função mais importante da educação, em qualquer grau, é desenvolver a personalidade do indivíduo e o significado de sua vida para ele mesmo e para os outros”.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2003

QUANTO TEMPO O TEMPO TEM

QUANTO TEMPO O TEMPO TEM?
RESUMO: Neste texto procurei abordar as diversas dimensões da temporalidade como componente indispensável ao pensar histórico, ao fazer e ensinar História. Distinguem-se as concepções de História baseadas no estudo do passado daquela voltada para o estudo do tempo presente. O tratamento da dimensão temporal da História constitui uma das dificuldades do seu ensino para crianças e, neste texto, procura-se oferecer alguns aportes para o trabalho do professor com alunos do Ensino Fundamental.
Palavras-chave: tempo, temporalidade, tempo presente, processo histórico, tempo histórico.
O HISTORIADOR, PESSOA DO SEU TEMPO
Este livro eu o fiz de mim mesmo, de minha vida e de meu coração.
Brotou de minha experiência, muito mais que de meu estudo.
Tirei-o da observação, das relações de amizade e vizinhança,
coligi-o ao longo dos caminhos; o acaso gosta de servir àquele que o persegue
sempre com um mesmo pensamento.
Enfim, encontrei-o sobretudo nas recordações de juventude.
Para conhecer a vida do povo, seus trabalhos, seus sofrimentos,
bastava-me interrogar as lembranças. (MICHELET, 1988, p. 2)
O questionamento sobre a relação entre o historiador e o tempo constitui aspecto decisivo da tarefa de ensino-aprendizagem da História. Trabalhando com relatos, com discursos produzidos sobre a experiência humana, o historiador desvenda um mundo temporal em sua  obra. Ao fazê-lo, permite que o tempo se torne humano na medida em que está articulado de  maneira narrativa, tendo como ponto de partida o presente.
Difícil tarefa a de estabelecer a dimensão do tempo presente. A dificuldade em fixá-lo nos leva a indagar: trata-se de minuto, hora, dia, mês, ano? Seu aspecto fugaz leva a concluir pela indeterminação e a confiar em sua definição como algo diferente do passado (aquilo que já foi) e o futuro (aquilo que ainda não é).
É a experiência que dá aos indivíduos a percepção dos intervalos de tempo – da medida  do tempo –, a qual é adquirida por meio das atividades sensoriais, intelectuais e pragmáticas.
Assim, compreende-se que o tempo histórico ultrapassa o tempo medido pelo movimento dos astros. Trata-se de considerar o tempo subjetivo que, em suas diferentes dimensões e ritmos,  passa pela experiência psicológica. Assim considerado, “o tempo torna-se [...] humano na medida em que está articulado num modo narrativo e que o relato atinge sua significação plena quando se torna uma condição da existência temporal” (RICOEUR, 1997, p. 105).
A relação entre tempo passado e tempo presente, realizada mediante as atitudes de comparar, analisar e relacionar, contribui para que as pessoas se percebam como membros de uma sociedade, sujeitos da história e responsáveis pela construção do futuro. É por meio do estabelecimento dessas relações, a partir das experiências cotidianas, que as pessoas podem aprofundar a compreensão da dimensão histórica do viver em sociedade e verificar a existência de múltiplas dimensões temporais.
Uma atitude frequente no estudo da história consiste na concentração do foco no passado remoto e no afastamento em relação às questões contemporâneas. Daí resulta uma relação com o passado semelhante ao turismo “[...] que excursiona pelo passado como se fosse mais um país estrangeiro para onde se quer evadir” (THOMPSON, 1992, p. 20). Porém, em contraponto a essa postura do historiador limitado ao estudo do acontecido, distante de sua época, hoje cada vez mais, ele se reconhece como homem de seu tempo e abandona a recusa à reflexão sobre acontecimentos do presente. O historiador segue, assim, as novas tendências da História, que fazem análises baseadas na noção de cultura e valorizam o tempo presente ao buscarem explicação sociocultural para a vida em sociedade. Esta concepção da história enfatiza o trabalho com temporalidades longas e volta-se tanto para permanências, quanto para mudanças.
Além dessa transformação do campo teórico-metodológico da História, existe atualmente massificação das informações, sua divulgação em grande velocidade e a tendência ao esquecimento rápido das notícias, que torna a memória extremamente passageira. O enorme fluxo de informações, que alcança diariamente os espectadores de televisão, os usuários da Internet, os leitores de jornais e revistas, traz abundância de notícias para consumo imediato.
Porém, ao mesmo tempo, essa quantidade de informações dificulta a relação do historiador com o passado na medida em que o torna extremamente próximo dos acontecimentos noticiados e sujeito aos filtros e decodificações utilizados pelos meios de comunicação. Há uma nova relação do historiador com seu tempo: passado e presente se aproximam, os eventos cotidianos invadem sua vida e o “fato histórico” é apropriado pelos meios de comunicação.
Diante dessa realidade, torna-se pertinente a questão:
... pode o presente ser objeto de história? Como de fato inscrever um presente fugaz na construção, ou reconstrução, necessariamente temporal ou retroativa, que elabora o historiador confrontando suas hipóteses de trabalho com a dura realidade da documentação e do arquivo recebidos? (RIOUX, 1999, p. 40).
Desde a década de 1960, essas inquietações geraram discussões sobre a ampliação do tempo abrangido pelo estudo da História, com a extensão da pesquisa ao período contemporâneo e, mais especificamente, à chamada “história imediata”. Sobretudo os historiadores do político foram chamados a atender às demandas da sociedade e a explicar os acontecimentos que atingem de modo espetacular o presente. O impacto do dia 11 de setembro de 2001 dificilmente poderá ser esquecido pelos que viram repetir-se, exaustivamente na tela da TV, o acontecimento-monstro registrado no calor da hora, universal e instantaneamente, e pouco a pouco banalizado, esvaziado de sentido. No entanto, milhares de livros rapidamente lançados no mercado editorial procuraram fornecer explicações históricas para a catástrofe. Este fenômeno atestou, por meio da exposição do vigor editorial, a expansão e o aumento do prestígio da história do tempo presente.
Diante dessa avalanche, como conservar o método histórico no estudo do tempo presente? As fontes documentais disponíveis para tal abordagem são problemáticas, pois nem sempre estão disponíveis para o historiador. Além disso, corre-se o risco de realizar uma análise dos acontecimentos apenas em seu encadeamento cronológico linear horizontal, em lugar de integrá-los a outros acontecimentos simultâneos que podem clarear seu significado. Recoloca-se, portanto, com urgência, a necessidade de manutenção de práticas historiográficas legítimas, como o distanciamento crítico em relação ao objeto de estudo, o uso criterioso de fontes, a resistência às pressões exercidas pelos grupos de sociabilidade de que participa o historiador, também percebido como ator/sujeito participante da história que estuda.
Nesse sentido, adquire pertinência a afirmação de Ariès sobre o trabalho do historiador e sua relação com o tempo presente:
[...] parece difícil apreender a natureza própria do passado se mutilamos em nós mesmos o sentido do nosso tempo. O historiador não pode mais ser o homem de gabinete, o cientista da caricatura, entrincheirado atrás de seus fichários e de seus livros, isolado dos ruídos vindos de fora. (ARIÈS, 1989, p. 240).
O historiador está intimamente conectado com o tempo presente e com a comunidade à qual pertence. No entanto, seu campo de trabalho é o passado, o tempo fluído e “morto”, que é recuperado a partir do presente. Independentemente do tema escolhido, do recuo temporal que ele contém, esta relação persiste, conectando o historiador a sua própria história. O tempo vivido pelo historiador é decisivo para que ele encontre e selecione, na “caixa de ferramentas” de sua “oficina”, o caminho a ser trilhado no estudo do passado.
Refletindo sobre o ensino de História a partir dessas questões, podemos considerar o quanto o tempo presente é importante, pois de nossa relação com ele decorrem as escolhas dos conteúdos a serem trabalhados a partir das “[...] problemáticas locais em que estão inseridas as crianças e as escolas, não perdendo de vista que as questões que dimensionam essas realidades estão envolvidas em problemáticas regionais, nacionais e mundiais” (BRASIL, 1997a, p. 43). É o estudo dessa realidade presente que irá contribuir para que o aluno estabeleça relações de identidade e diferença com outros indivíduos e grupos sociais, vistos em diversas épocas.
Para que a criança alcance um “modo de pensar histórico” e possa ver-se como sujeito ativo da História, é preciso escolher os conteúdos do ensino a partir do tempo presente, estabelecer diálogos entre passado e presente, identificando neles permanências e mudanças, simultaneidade e conexão temporal. O presente constitui um tempo vivo do qual participam diferentes tempos do passado, os quais se manifestam em conflitos, costumes, formas de organização social, modos de viver.
NO SEU TEMPO HAVIA DINOSSAUROS?
O ensino e a aprendizagem de História, em todos os níveis, não pode prescindir da noção de tempo/temporalidade e isto vale também para crianças de 6 a 11 anos. Ela é fundamental para a compreensão da historicidade, ou seja, das transformações de uma sociedade em suas múltiplas dimensões.
Nesse nível de ensino, os alunos trabalham com a noção de tempo histórico em suas dimensões de presente, passado e futuro associadas à anterioridade, posteridade, simultaneidade, abordadas inicialmente na dimensão cotidiana para, depois, ampliarem-se em períodos mais longos. A dimensão temporal será útil para o estudo de permanências e mudanças, as quais constituem o objeto mesmo do conhecimento histórico.
Segundo o PCN, ao final do chamado primeiro ciclo, os alunos deverão ser capazes de
[...] comparar acontecimentos no tempo, tendo como referência anterioridade, posterioridade e simultaneidade; reconhecer algumas semelhanças e diferenças sociais, econômicas e culturais, de dimensão cotidiana, existentes no seu grupo de convívio escolar e na sua localidade; reconhecer algumas permanências e transformações sociais, econômicas e culturais nas vivências cotidianas das famílias, da escola e da coletividade, no tempo, no mesmo espaço de convivência (BRASIL, 1997b, p. 50).
Com esta colocação, abandona-se o presentismo e a recusa da “datação” para enfatizar sequências temporais e ordenamento processual. Recusa-se também tanto a concepção linear da História, como a da História como progresso contínuo e as interpretações de ciclos que levam as sociedades inevitavelmente à decadência ou à revolução, enfim, filosofias da História teleológicas.
Esta concepção pode ser entendida como ruptura com “a ideia de um tempo único contínuo e evolutivo para toda a humanidade. Em lugar desta visão, afirma-se que “[...] a realidade  é moldada por descontinuidades políticas, por rupturas nas lutas, por momentos de permanências de costumes ou valores, por transformações rápidas e lentas” (BRASIL, 1997a, p. 31).
É preciso diferenciar o tempo cronológico, marcado apenas por calendários e datas que constituíam a base da história factual em seu ordenamento linear, dos fatos históricos em uma linha de tempo. Entende-se que a vida em sociedade é muito mais complexa em sua dimensão temporal do que a linearidade do arranjo dos fatos, segundo os critérios de passado, presente e futuro, ou seja, em sua dimensão de anterioridade e posterioridade. Considera-se, nesta perspectiva, que não existe regularidade no ritmo da História, acelerações e retardamentos ocorrem e podem ser bastante específicos de uma sociedade ou de um grupo social.
A compreensão da dimensão temporal da existência humana pode ser alcançada na escola a partir de vivências pessoais, cujo ponto de partida é sua própria história como ser humano sujeito a um tempo biológico (nascimento, desenvolvimento e morte). Extrapolar essa dimensão para a de outros indivíduos inseridos em uma dada sociedade é o salto qualitativo a ser feito para que a criança possa situar-se em relação ao seu próprio passado e ao da humanidade, que não obedece a um ritmo único, mas está sujeito a diferentes durações. A simultaneidade dos acontecimentos, que se desenrolam em diferentes espaços em permanências e mudanças, ocorre em diversas sociedades, rompendo-se assim a noção de uma história linear, universal e válida para todos os povos.
Algumas questões para reflexão: as acelerações da História (o Afeganistão desde 11 de setembro, as transformações sociais da China nas últimas décadas etc.); a percepção de tempo pela criança (– Vovô, no seu tempo havia dinossauros? Você conheceu a Princesa Isabel? etc.).

REFERÊNCIAS
ARIÈS, Philippe. O tempo da História. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais. Brasília: MEC, 1997a.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: História e Geografia. Brasília: MEC/SEF, 1997b, p. 50.
DOSSE, François. A História em migalhas. São Paulo: Ensaio; Campinas: UNICAMP, 1992.
MICHELET, Jules. O povo. São Paulo: Martins Fontes, 1988.
RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa. São Paulo: Papirus, 1997. 3 v.
RIOUX, Jean-Pierre. “Pode-se fazer uma história do presente? In: CHÉVEAU, A; TÉTARD, P. (Orgs.). Questões para a história do tempo presente. Bauru: EDUSC, 1999.
THOMPSON, Paul. A voz do passado. Rio de Janeiro: Paz e Terra: 1992

BIBLIOGRAFIA
ABUD, Kátia M.; MALATIAN, T. M. A História e o historiador. PEC construindo sempre-aperfeiçoamento de professores PEB II. São Paulo: FAFE-SP/CENP/Fundação C.A . Vanzolini, 2002.
BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989). São Paulo: Ed. UNESP, 1997.
GEERTZ, Clifford. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1989.
HOBSBAWM, Eric J. Mundos do trabalho. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000.
MARROU, Henri I. Do conhecimento histórico. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1975.
NOVAES, Adauto (Org.). Tempo e História. São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura/Companhia das Letras, 1992.

THOMPSON, E. P. A formação da classe operária inglesa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997. 3 v