segunda-feira, 22 de setembro de 2008

PATAXÓ - A REDENÇÃO DE UM POVO

Esta Semana o Supremo Tribunal Federal estará decidindo o destino dos índios Pataxó Hãhãhãe que vivem na Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu. 
O ministro-relator Eros Grau deverá proferir seu voto sobre a ação impetrada pela FUNAI em 1982 pedindo a anulação dos títulos de terras conferidas pelo governo da Bahia a particulares dentro do perímetro daquela terra indígena.
A Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu foi demarcada em 1937 pelo Serviço de Proteção aos Índios (SPI) em conjunto com o governo do estado da Bahia. Porém, diversos acontecimentos se sucederam que levaram à morte e a dispersão dos índios ali localizados e posteriormente à invasão de não indígenas e o conseqüente esbulho daquelas terras.
O voto de Eros Grau poderá ou não indicar um caminho para os votos dos demais ministros. Ou poderá acontecer o que aconteceu no dia 27 de agosto p.p. quando o voto do ministro-relator Ayres Britto sobre a manutenção da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol de tão bom e favorável aos índios daquela terra foi pedido vistas por um outro ministro do STF.
Se o voto do ministro Eros Grau for seguido de um pedido de vistas aí vai ficar chato para o STF. Mais um caso de incapacidade de decisão por parte da nossa Corte maior de justiça.
Já estão em Brasília cerca de 200 índios Pataxó ansiosos por ouvir um pronunciamento final sobre esse processo que já dura 26 anos, sem decisão e sem ao menos ter sido posto em votação, mas sempre com promessas de decisão por parte dos sete ministros do STF que já o tiveram nas mãos. Os dois últimos foram exatamente Nelson Jobim e o atual Eros Grau. Jobim sentou em cima do processo por sete anos; mandou até que a FUNAI pagasse uma perícia agronômica para determinar que propriedades estariam dentro e quais estariam fora da terra indígena. Só isso custou R$ 700.000,00 à FUNAI, sendo que a última parcela foi paga em 2003.
A história dessa terra indígena é dramática, cheia de acontecimentos inesperados. É singular e especial em muitos aspectos, mas também representa um tanto a história de outros tantos povos indígenas que foram contatados e sofreram enormes perdas populacionais e territoriais no século XX, após o contato com as frentes agrícolas de expansão e já com a intervenção do órgão indigenista oficial, o SPI.
Os atualmente chamados Pataxó Hãhãhãe compreendem os sobreviventes (e descendentes) de alguns povos indígenas que viviam entre os rios de Contas, ao norte, e o rio Pardo, ao sul, na parte sul do estado da Bahia e leste de Minas Gerais. Uma vasta região de matas que praticamente passou incólume pela colonização até o início do século XIX. 
Já se ouvira falar desses povos desde o século XVI, e eram conhecidos genericamente como Aimorés, inimigos dos Tupiniquim da costa sul da Bahia. A Coroa portuguesa os declarou, a certa altura, "incivilizáveis", tal era sua rejeição às tentativas de aproximação e contato e tal era sua insubmissão ao domínio militar. 
No começo do século XIX essa região começou a ser alvo de interesse de povoamento e os povos indígenas que ali viviam começaram a ser atacados. O príncipe Dom João, ao chegar ao Brasil em 1808, emitiu um alvará que permitia a formação de bandos de ataques a esses índios do leste de Minas Gerais e sul da Bahia, com direito a escravizar os sobreviventes pelo prazo de 10 a 15 anos. Entre os alvos dessas bandeiras estavam os Botocudos e Kamakã, ao sul, e os Pataxó, Mongoió e Baenã, ao norte.

(A foto acima, de um quadro pintado pelo pintor e naturalista francês Jean-Baptiste Debret, por volta de 1820, representa um índio Kamakã daquela época, quando eles já haviam sido atacados por frentes militares e diversos grupos haviam se entregues ao domínio luso-brasileiro.)
Durante todo o século XIX muitos aldeamentos indígenas foram sendo incorporados à população pobre da região enquanto suas terras iam sendo tomadas e transformadas em vilas e arraiais. A ordem religiosa dos capuchinhos estabeleceu diversas missões com esses índios e essas missões depois serviram de base para a chegada de brancos que as transformaram em cidades. 
Entretanto, nem todos os aldeamentos se submeteram ao poder militar e religioso brasileiro. Alguns grupos nunca se entregaram e passaram a viver nas matas ainda intocadas daquela região, o sul da Bahia.
Já no começo do século XX, quando a cultura do cacau se viabilizou economicamente e passou a se expandir para o interior das matas, as terras onde viviam os grupos autônomos dos Pataxó, Kamakã, Mongoió e Baenã foram cobiçadas e atacadas. 
A história de ataques a índios foi romanceada em diversos livros pelo escritor Jorge Amado, natural de Ilhéus, o centro comercial da região. 
Os ataques de jagunços dos donos do cacau chegaram a tal ponto que chamaram a atenção do governo, que convocou o Marechal Rondon para resolver o problema. A partir de 1920 ele passou a enviar expedições de sertanistas para tentar entrar em contato com os grupos autônomos. Em 1922 o sertanista Telésforo Fontes fez um contato pacífico com um grupo Baenã e aos poucos foi contatando os demais. Em 1926, o SPI e o governo da Bahia decidiram reconhecer uma área de 50 léguas quadradas para servir como horto florestal e como reserva indígena. 
Não se sabe exatamente o que seria essa área, pois ela nunca foi delimitada. Ao longo dos anos seguintes, o SPI tentou juntar os diversos grupos indígenas contatados dentro dessa área e todos perto do posto indígena ali formado. Outros povos que se agregaram foram os sobreviventes do antigo povo Tupinambá, que vivia na vila de Olivença, ao sul de Ilhéus, e os Kiriri-Supaiá, que viviam ao norte da Bahia.
Em 1936, finalmente, o SPI e o governo da Bahia demarcam uma terra indígena com uma área estimada em 54.000 hectares, compreendendo matas e campinas. O mapa dessa terra pode ser encontrado no Instituto de Terras da Bahia e faz parte do processo instaurado pela FUNAI a ser definido pelo STF.
Porém, logo em seguida, um ano depois, a Polícia Militar da Bahia ataca inesperadamente o posto indígena Caramuru-Paraguaçu sob o pretexto de que seu chefe, Telésforo Fontes, era comunista e estava armando uma guerrilha contra o governo brasileiro. O ataque foi feroz e matou muitos índios e alguns funcionários do SPI. Dispersou os sobreviventes de tal modo que alguns foram bater no Paraná. Outros foram abrigados em Minas Gerais, em Carmésia, próximo dos Maxakali e dos Krenak, povos que haviam sido contatados um pouco antes e que sobreviviam em pequenas glebas de terra.
Os sobreviventes, renitentes, inclusive os Kiriri-Sapuiá e os Tupinambá, ficaram sem proteção e sem destino certo. Passaram a viver de todo modo possível, inclusive como agregados nas próprias fazendas que iam se formando pelos invasores e por aqueles que passaram a arrendar do SPI, ainda nas décadas de 1940 e 1950.
O arrendamento que o SPI promoveu nas terras dos Pataxó foi mais um ponto desastroso nessa história. No começo controlado por cobrança e pagamento de uns poucos selecionados, depois se abriu para muitos e ao final nem pagamento havia. O posto indígena foi desativado e assim a tomada das terras aconteceu em sua totalidade.
Os detalhes desse processo final e as motivações não são bem conhecidos. Por que o posto indígena foi abandonado e desativado? Que tipo de pressão havia em cima do SPI para se abandonar algo que tinha dado tanto trabalho, inclusive com mortes de funcionários!
O certo é que, por volta de 1970, com a ditadura instalada, tudo parecia irreversível. Mas alguma coisa de inesperado estava no ar; alguns Pataxó que haviam permanecido na região, e tendo experimentado a desilusão da vida de agregado miserável nas fazendas, começaram a se reunir e buscar meios para recuperar suas terras. Entraram em contato com seus parentes que estavam em Carmésia, MG, e em seguida com a FUNAI e solicitaram ajuda. Aos poucos foram conseguindo alguma simpatia para sua causa aparentemente perdida.
Por volta de 1975 já diversas famílias Pataxó haviam se instalado no perímetro da Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu. Isto, por outro lado, atiçou os fazendeiros a tomar providências. Começou assim uma nova fase de violência para com os Pataxó. Nos últimos trinta anos mais de 20 Pataxó foram caçados e assassinados, em geral por pistoleiros contratados pelos fazendeiros. Um deles, Galdino, foi queimado por moleques da classe média brasiliense enquanto dormia num abrigo de parada de ônibus em Brasília. Morreu em conseqüência das queimaduras por todo seu corpo.
Em 1978, o governador biônico da Bahia, Roberto Santos, resolveu cumprimentar os fazendeiros com o chapéu dos índios e passou a dar títulos das terras ocupadas sob o pretexto de que não havia mais índios -- exatamente quando estavam engrossando as levas de chegada e agregamento dos índios na região. Logo depois, o novo governador, Antônio Carlos Magalhães, completou a obra de seu antecessor. Parecia o fim.
Mas já os Pataxó eram muitos e com índole heróica. No começo o governo federal, pela direção da FUNAI, tentou tirá-los daquelas terras e providenciou uma terra estadual para eles se acomodarem e esquecerem suas terras originais. Muitos foram transferidos para lá, pois estavam passando muitas dificuldades nos acampamentos improvisados entre fazendas. Mas, um dia, um grupo de Pataxó, com a ajuda de diversos indigenistas jovens da FUNAI, resolveram entrar na fazenda que havia tomado o antigo posto indígena. Lá se instalou esse grupo e essa foi a primeira retomada de terras pelos Pataxó.
Ao longo desses 30 anos os Pataxó fizeram muitas retomadas, sempre com a disposição da FUNAI para ajudá-los e para indenizar as benfeitorias dos fazendeiros. A parte sul da terra indígena é onde se agrega a maioria das comunidades Pataxó.
As terras retomadas atualmente somam cerca de 18.000 hectares, isto é, um terço de sua terra demarcada em 1936. Porém os fazendeiros têm poderosos aliados políticos e sempre estão pedindo reintegração de posse, mesmo das terras que já foram retomadas e as indenizações pagas.
A FUNAI entrou com o processo que ora está sendo discutido pelo STF em 1982. Quer a anulação dos títulos conferidos pelos governadores da Bahia entre 1978 e 1982. Simples e claro.
Que haverá de mistério em tanta demora para a Corte Suprema de Justiça da nação deixar de lado e não se decidir? Haverá prova maior do descaso e da injustiça do nosso sistema jurídico?
O caso Pataxó Hãhãhãe da Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu é especial, mas agrega em si muita coisa de outros casos de esbulho de terras indígenas na história recente do país. O heroísmo do povo Pataxó é evidente. Quase incompreensível de tanta teimosia e determinação. Algo os move a buscar a recuperação dessa terra. É a busca da reconstituição de sua identidade, que foi desmembrada pela violência e cujos pedaços vêm sendo ajuntados pelos seus líderes, por suas mulheres, pelo olhar esperançoso de seus filhos.
Quisera que os ministros do STF soubessem dessa história. Ao menos sentissem um pouco dela.
Hoje os Pataxó falam exclusivamente o português. Perderam sua língua materna no êxodo forçado que sofreram. Querem recuperá-la e muitos estão aprendendo a língua de um povo próximo, os Maxakali, que conseguiram mantê-la apesar do confinamento a que foram submetidos. Querem reativar sua vida cultural, agregando os aspectos de sua vida de brasileiros rurais que vêm experimentando há tantos anos.

Que o STF dê essa chance a um povo indígena brasileiro, faça justiça a esses injustiçados e lave a honra da nação brasileira devolvendo aos Pataxó as terras que lhes foram usurpadas.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

OPERAÇÃO BROTHER SAM - O DIA QUE DUROU 21 ANOS

O Golpe Militar de 1964

O golpe militar ocorrido em 1964 estabeleceu no Brasil uma ditadura militar que permaneceu até 1985. Ao longo dos anos o regime militar foi endurecendo o governo e tornando legalizadas práticas de censura e tortura, por exemplo. Os militares combateram sem piedade qualquer ameaça comunista ou manifestantes contra o governo, marcando a história do Brasil por um período negro de atos autoritários ao extremo.
A decisão de se dar um golpe político por parte dos militares não foi algo repentino, aconteceu como consequência de uma série de fatos políticos acumulados no período republicano após Getúlio Vargas. Quando este presidente resolveu colocar um fim a sua própria vida a situação política nacional já estava abalada, a vacância do cargo máximo na política brasileira permitiu uma preocupante conjuntura de sucessão presidencial. Juscelino Kubitscheck foi eleito em pleito eleitoral direto para o governo seguinte, o então presidente desenvolveu um governo que lhe foi possível conquistar o apoio popular, mas por vários momentos os militares esboçaram um golpe de Estado. O sucessor na presidência foi Jânio Quadros, o qual foi eleito com enorme apoio popular, conquistando uma aprovação nas urnas que até então não havia sido vista. A vitória imperativa fez com que Jânio Quadros acreditasse em um auto-golpe de Estado. Crendo que o povo o apoiaria sempre, arquitetou um plano de renúncia para voltar ao poder através de um pedido amplo de retorno que só aceitaria se lhe fosse dado poderes absolutos. O plano de renúncia de Jânio Quadros não funcionou e o cargo de presidente acabou ficando disponível para o seu vice, João Goulart.
João Goulart era um jovem político que havia aparecido na cena política nacional como Ministro do Trabalho do segundo governo de Getúlio Vargas. Jango, como era chamado, tinha claras aproximações com ideologias e políticas de esquerda, o que o fazia ser considerado como uma ameaça. Para piorar, quando Jango recebeu a notícia da renúncia de Jânio Quadros estava em viagem política na China comunista. Os políticos de direita tentaram de várias formas impedir a posse do vice-presidente, mas Brizola, primo de Jango e governador do Rio Grande do Sul, sustentou o retorno e a posse legítima de João Goulart.
O presidente empossado tentou aplicar uma política de esquerda, foi muito combatido pelos direitistas e criticado como uma ameaça comunista. O estopim necessário para explodir um golpe militar se deu quando Leonel Brizola e João Goulart fizeram um discurso na Central do Brasil, Rio de Janeiro, no dia 13 de março, declarando as reformas de base, lideradas pela reforma agrária. Nos dias seguintes os oposicionistas se organizaram e promoveram seis dias depois a Marcha da Família com Deus pela Liberdade, o movimento de base religiosa tinha como objetivo envolver o povo no combate ao maléfico comunismo. Assim, a religião, o povo e o interesse norte-americano formavam a sustentação que permitiria o golpe militar.
O golpe começou a tomar forma prática quando no dia 28 de março de 1964 se reuniram em Juiz de Fora, Minas Gerais, os generais Olímpio Mourão Filho e Odílio Denys juntamente com o governador do estado, Magalhães Pinto. A reunião visava estabelecer uma data para início da mobilização militar para tomada do poder, a qual ficou decidida como 4 de abril de 1964. Mas Olímpio Mourão Filho não esperaria até abril para iniciar o golpe, ainda no dia 31 de março tomou uma atitude impulsiva partindo com suas tropas de Juiz de Fora para o Rio de Janeiro por volta das três horas da manhã. O general Castello Branco ainda tentou segurar o levante ligando para Magalhães Pinto, segundo o militar o movimento ainda era prematuro, entretanto não dava mais para parar.
Como legalista, ao lado de João Goulart, o general Armando de Moraes Âncora não estava satisfeito, mas quando recebeu a ordem do presidente para prender Castello Branco não a cumpriu. O general Âncora alegou que não queria iniciar uma guerra civil no país e então quando as tropas do governo se encontraram com as dos golpistas se uniram e continuaram a caminhada rumo ao Rio de Janeiro para efetivar o golpe que ocorreu no dia 31 de março de 1964 por volta das dezessete horas. João Goulart, ao se deparar com as tropas, também evitou uma guerra civil abandonando a presidência e se refugiando no Uruguai.
O Congresso Brasileiro providenciou então as medidas que tornaria legalizado o golpe, o senador Auro Soares de Moura Andrade declarou o cargo de presidente vago alegando que o presidente havia abandonado o Brasil. As eleições presidenciais foram prometidas para 1965, porém não realizadas, os militares passaram a eleger os presidentes indiretamente durante a ditadura que se tornaria mais severa a cada ano. O povo se mostrou confuso com o que estava acontecendo, mas o aparente crescimento econômico fez com que a população se acomodasse. Mais a frente a censura fez com que se calasse.
O golpe impediria tentativas de implantação de uma política comunista no Brasil, com os anos viriam os Atos Institucionais e o regime que tomara o poder através de um golpe se estabeleceria sobre bases legais, porém autoritárias.
Causas do Golpe Militar de 1964
As causas que favoreceram ao golpe militar ocorrido no Brasil no ano de 1964 são um somatório de diversos acontecimentos políticos e sociais ocorridos ao longo da história republicana brasileira. Ainda durante o período imperial, quando Dom Pedro II era quem governava o país, os militares demonstraram sua insatisfação com as condições vividas pelas Forças Armadas Brasileira. Com o fim da Guerra do Paraguai os militares se conscientizaram que na América Latina apenas o exército brasileiro permanecia sem prestígio na sociedade e na política. A pressão que os militares exerceram foi tão grande que integraram o grupo republicano responsável pela queda do regime monárquico no Brasil, sendo que os dois primeiros presidentes da república recém-nascida foram militares.
Ao longo da República Velha os militares só foram se revoltar novamente na década de 1920 quando organizaram um movimento de contestação política novamente, mas os responsáveis pelo movimento eram pertencentes de um escalão intermediário da hierarquia militar, por esse motivo o acontecimento ficou conhecido como Tenentismo. De toda forma, serviu para colocar novamente os militares na cena política nacional e seria um dos fatores republicanos que engrossaria mais tarde a capacidade política dos militares de promoverem um golpe. O governo de Juscelino Kubitschek seria atacado por tentativas de golpe em 1955, mas quem sofreria o impacto maior mesmo seria João Goulart em 1964.
No final do segundo governo de Getúlio Vargas, que se encerrou por ocasião de seu suicídio em 1954, a situação política brasileira estava muito instável, a crise havia fragmentado os destinos da nação. Os militares formavam o grupo que defendia a entrada do capital estrangeiro no país, quando se deu o processo eleitoral para sucessão de Getúlio Vargas tentaram arquitetar um golpe, que não foi bem sucedido e Juscelino Kubitschek assumiu a presidência. Como seu governo foi bem aceito pela população, teve respaldo suficiente para superar os ataques políticos e chegar ao final do mandato.
O sucessor de Juscelino Kubitschek é quem causaria problemas no destino político brasileiro. Jânio Quadros foi eleito com grande maioria dos votos, com tamanho apoio popular o então presidente acreditou que o povo estaria do seu lado de toda forma e elaborou um plano para que seus poderes aumentassem. O presidente Janio Quadros anunciou sua renúncia pelo rádio em 1961 esperando que a notícia causasse espanto no Congresso e na população, se corresse como o esperado Janio Quadros imaginava que seria procurado para voltar ao poder e não causar instabilidade política e então o ex-presidente aceitaria a proposta de retornar ao cargo somente se lhe fosse dado plenos poderes para governar. Entretanto, o plano de Janio Quadros passou longe do esperado, sua renúncia foi aceita e nada foi feito para que voltasse ao poder.
O vice de Janio Quadros era João Goulart, político que surgiu durante o segundo governo de Getúlio Vargas e que por isso tinha fortes identificações com o presidente suicida, causando desagrado nos políticos de direito. João Goulart já era encarado como um político de tendências de esquerda e para piorar quando recebeu a notícia da renúncia do presidente estava na China comunista. A direita política tentou de todas as formas fazer com que o vice não assumisse quando retornasse ao Brasil, mas Leonel Brizola, cunhado de João Goulart, era o governador do Rio Grande do Sul e deu o sustento necessário para que o vice voltasse ao país e assumisse o cargo que agora lhe era de direito.
Ao assumir a presidência, Jango, como era popularmente chamado, enfrentou sérias oposições. A política de Jango tinha claras influências de esquerda, pretendia fazer reformas de base e especialmente reforma agrária. A solução encontrada pelos opositores para impedir o governo de Jango foi instalar o parlamentarismo no Brasil, deste modo haveria presidente, mas as decisões seriam efetivamente tomadas pelo Primeiro Ministro.
O parlamentarismo foi aplicado e as decisões do Estado ficaram por conta de três Primeiros Ministros: Tancredo Neves, Francisco de Paula Brochado da Rocha e Hermes Lima. Em 1962 os políticos contrários ao parlamentarismo conseguiram que fosse realizado um plebiscito no qual a população escolhesse entre o presidencialismo e o parlamentarismo. O presidencialismo ganhou e Jango tentou finalmente governar conciliando suas reformas de base com os interesses conservadores. Houve então um desarranjo na situação brasileira, a inflação cresceu aceleradamente, as medidas econômicas causaram insatisfação política e a situação só foi piorando. Estudantes chegaram a organizar movimentos em defesa das ideologias de esquerda, o que só criaria motivos para a perseguição militar mais a frente.
O presidente João Goulart e seus aliados criaram políticas que só causaram insatisfação nos conservadores de direita. Leonel Brizola criou o “grupo dos onze” para fiscalizar parlamentares e militares e pressionar o Congresso para aprovar as reformas de base. As contestações cresceram, a imprensa deu início a uma campanha contra o radicalismo ideológico de Jango, alertando para o caminho escolhido pelo presidente de levar o Brasil para um regime comunista. Estouraram várias revoltas e greves pelas ruas do país, levando Jango a pedir o Estado de Sítio, que foi revogado pelo Congresso.
O grande estopim que colocaria os militares em cena e determinados a tomar o poder através de um golpe seria o discurso de João Goulart e Leonel Brizola feito no dia 13 de março de 1964 na Central do Brasil, Rio de Janeiro. Nesse, os dois anunciavam as reformas de base, reforma agrária, um novo plebiscito para aprovar uma nova constituição e a nacionalização das refinarias estrangeiras de petróleo. Os militares sabiam que o povo apoiaria o projeto e então não perderam tempo, aliaram-se aos políticos da UDN e ao governo norte-americano para deflagrar o golpe. A igreja católica iniciou o apoio contra a ameaça da esquerda mobilizando o povo através da Marcha da família com Deus pela Liberdade contra o governo e para dar legitimidade ao golpe militar. A queda foi inevitável e os militares permaneceram com o poder no Brasil de 1964 até 1985.
Golpe Militar de 1964 designa o conjunto de eventos ocorridos em 31 de março de 1964 no Brasil, e que culminaram no dia 1º de abril em um Golpe de Estado, que interrompeu o governo do presidente João Belchior Marques Goulart, também conhecido como Jango, que havia sido democraticamente eleito vice-presidente pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) – na mesma eleição que conduziu Jânio da Silva Quadros à presidência pela União Democrática Nacional (UDN). Jânio renunciou ao mandato no mesmo ano de sua posse (1961) e quem deveria substituí-lo automaticamente e assumir a Presidência era João Goulart, segundo a Constituição vigente à época e promulgada em 1946. Porém este se encontrava em uma viagem diplomática na República Popular da China.
Militantes então acusaram Jango de ser comunista e o impediram de assumir seu lugar como mandatário no regime presidencialista.
Depois de muita negociação, principalmente de seu cunhado Leonel de Moura Brizola, na época governador do Rio Grande do Sul, os apoiadores de Jango e a oposição acabaram fazendo um acordo político pelo qual se criaria o regime parlamentarista, passando então João Goulart a ser chefe de Estado. Em 1963, porém, houve um plebiscito e o povo optou pela volta do regime presidencialista. João Goulart, finalmente, assume a presidência da República com amplos poderes, o que tornou aparente vários problemas estruturais na política brasileira acumulados nas décadas que precederam o golpe e disputas de natureza internacional, desestabilizando o governo. O Golpe de 1964 submeteu o Brasil a uma ditadura militar alinhada politicamente com os interesses dos Estados Unidos da América, que durou até 1985, quando, indiretamente, foi eleito o primeiro presidente civil desde 1964, Tancredo Neves.
Etimologia
O historiador político italiano Norberto Bobbio define "revolução" como "a tentativa, acompanhada do uso da violência, de derrubar as autoridades políticas existentes e de as substituir, a fim de efetuar profundas mudanças nas relações políticas, no ordenamento jurídico-constitucional e na esfera sócia econômica". Já o sociólogo norte americano Jeff Goodwin, professor da Universidade Harvard, define "revolução" como "não só como uma mobilização de massas e uma mudança de regime, mas como uma mudança mais ou menos rápida das estruturas fundamentais sociais, econômicas e culturais".
Em 1964, houve um movimento de reação, por parte de setores conservadores da sociedade brasileira - notadamente as Forças Armadas, a sociedade civil e o alto clero da Igreja Católica, apoiados fortemente pela potência dominante da época, os Estados Unidos da América - ao temor de que o Brasil viria a se transformar em uma ditadura socialista similar à praticada em Cuba, após a falha do Plano Trienal do governo de João Goulart de estabilizar a economia, seguido da acentuação do discurso de medidas vistas como comunistas na época, as quais incluíam a reforma agrária e a reforma urbana.
No dia 13 de março daquele ano, data da realização de comício em frente à Estação Central do Brasil, no Rio de Janeiro, perante trezentas mil pessoas, Jango decreta a nacionalização das refinarias privadas de petróleo e desapropriação, segundo ele para a reforma agrária, de propriedades às margens de ferrovias, rodovias e zonas de irrigação de açudes públicos. Desencadeou-se uma crise no país, com a economia já desordenada e o panorama político confuso. A oposição militar veio à tona para impedir que tais reformas se consolidassem, impondo, portanto, uma manutenção da legalidade e da estrutura socioeconômica vigente.
Por isso, e pela falta de mobilização de setores mais baixos da sociedade, alguns historiadores consideram o movimento de 1964 como um golpe de Estado.
Em 1981, o general Ernesto Geisel, (Quarto presidente do regime militar), revelou para o jornalista Elio Gaspari sua opinião sobre o assunto:
"O que houve em 1964 não foi uma revolução. As revoluções fazem-se por uma idéia, em favor de uma doutrina. Nós simplesmente fizemos um movimento para derrubar João Goulart. Foi um movimento contra, e não por alguma coisa. Era contra a subversão, contra a corrupção. Em primeiro lugar, nem a subversão nem a corrupção acabam. Você pode reprimi-las, mas não as destruirá. Era algo destinado a corrigir, não a construir algo novo, e isso não é revolução".
Todavia, a definição de "golpe" vs. "revolução" não é cristalina e há divergências sobre a correção do uso de um ou outro termo, causada pelas peculiaridades do movimento que deu origem à tomada do poder pelos militares.
Características gerais do novo regime e objetivos
O golpe de Estado conduziu à época da história do Brasil que foi denominada de Regime Militar de 1964. Esta época foi caracterizada economicamente por um grande desenvolvimento do país, por meio de financiamento norte-americano em grande escala, justificado em parte pelo controle do medo comunista e das organizações de trabalhadores pelos militares, o que era interpretado como estabilidade política pelos setores predominantes da economia mundial.
Porém, tal desenvolvimento econômico foi acompanhado de uma violenta repressão política e aumento da dívida externa, especialmente durante as décadas de 1960 e 1970 sob a égide da Lei de Segurança Nacional como justificativa de manter a sociedade politicamente estável no sentido de evitar a influência de ideias comunistas em um mundo dividido entre dois regimes, mas que também atuava contra qualquer um que discordasse publicamente da atuação do regime ou que pudesse provocar tal discordância.
Além da limitação de várias liberdades (como as de expressão, imprensa e organização), naquela época tornaram-se comuns os interrogatórios, prisões e tortura daqueles considerados opositores políticos do regime militar, especialmente os que fossem considerados simpatizantes de ideias comunistas, incluindo-se muitos estudantes, jornalistas e professores. Para além das prisões, estima-se que cerca de 300 dissidentes perderam a vida. Segundo a versão defendida pelos militares, a maioria dessas mortes teria ocorrido em combate com as Forças Armadas. Entretanto, os grupos de defesa dos direitos humanos e organizações de sobreviventes da ditadura militar, estimam que este número seja muito maior.
Este fato inicial foi denominado pelos militares que o executaram bem como o regime que se sucedeu como "Revolução de 1964". Mas a noção de que se trataria de uma revolução perdeu parte de sua aceitação pela sociedade brasileira desde meados dos anos 1970, com a abertura democrática então iniciada, o que trouxe à tona os assassinatos e torturas cometidos em nome deste regime.
Vendo os movimentos de esquerda crescendo e pela influência da propaganda pelos movimentos comunistas, foi iniciado um movimento de contrapropaganda conhecido como perigo vermelho, ou perigo comunista.
Segundo relatos publicados pelo Departamento de Documentação Histórica da Fundação Getúlio Vargas:
(sic)…Os militares envolvidos no golpe de 1964 justificaram sua ação afirmando que o objetivo era restaurar a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas e deter a "ameaça comunista" que, segundo eles, pairava sobre o Brasil.
Uma idéia fundamental para os golpistas era que a principal ameaça à ordem capitalista e à segurança do país não viria de fora, através de uma guerra tradicional contra exércitos estrangeiros; ela viria de dentro do próprio país, através de brasileiros que atuariam como "inimigos internos" – para usar uma expressão da época.
Esses "inimigos internos" procurariam implantar o comunismo no país pela via revolucionária, através da "subversão" da ordem existente – daí serem chamados pelos militares de "subversivos".
Características, golpe de Estado, Segundo a FGV, havia alguns fatores históricos que posicionavam as Forças Armadas do Brasil contra o comunismo, acentuando a polarização ideológica no Brasil:
A percepção de um "perigo comunista" no Brasil passou por um processo de crescente "concretização", até atingir seu clímax com a Revolta de 1935. Assim, após a Revolução Russa de 1917, tiveram lugar no país a criação do Partido Comunista do Brasil (depois Partido Comunista Brasileiro – PCB) em 1922; a conversão do líder tenentista Luís Carlos Prestes ao comunismo, em maio de 1930, e sua ida para a União Soviética, no ano seguinte; e o surgimento, em março de 1935, da Aliança Nacional Libertadora, dominada pelos comunistas. Se em 1917 o comunismo no Brasil era visto ainda como um perigo remoto, "alienígena" e "exótico", aos poucos ele foi se tornando mais próximo.
A frustrada revolta comunista de novembro de 1935 foi um evento-chave que desencadeou um processo de institucionalização da ideologia anticomunista no interior das [[Forças Armadas do Brasil Forças Armadas]]. Os comunistas brasileiros foram acusados de serem elementos "a serviço de Moscou" e, portanto, traidores da Pátria. Os militares que tomaram parte na revolta foram, em particular, acusados de uma dupla traição: não só do país como da própria instituição militar, ferida em seus dois pilares - a hierarquia e a disciplina. Foram também rotulados de covardes, devido principalmente à acusação, até hoje controversa, de que no levante do Rio teriam assassinado colegas de farda ainda dormindo.
O ritual de rememoração dos mortos leais ao governo, repetido a cada ano, tornava seu sacrifício presente, renovava os votos dos militares contra o comunismo e socializava as novas gerações nesse mesmo espírito. Foi no quadro dessa cultura institucional, marcadamente anticomunista, que se viveu a ditadura do Estado Novo e que se formaram os militares que, em 1964, assumiram o poder.
Situação internacional
A Guerra Fria estava espalhando o temor pelo rápido avanço do chamado, pela extrema direita, perigo vermelho.
As esquerdas espelhavam-se nos regimes socialistas implantados em Cuba, China e União Soviética. O temor ao comunismo influenciou a eclosão de uma série de golpes militares na América Latina, seguidos por ditaduras militares de orientação ideológica à direita, com o suposto aval de sucessivos governos dos Estados Unidos da América, que consideravam a América Latina como sua área de influência.
Fidel Castro vislumbrou expandir sua revolução no Brasil, inicialmente, usando as Ligas Camponesas de Francisco Julião. Posteriormente, propiciou treinamento militar em Cuba para brasileiros selecionados pelas organizações terroristas, capazes de desencadear ações de guerrilha urbana e rural.[7] Cuba e China passaram a financiar grupos de esquerda na América Latina, iniciando um movimento para implantar o comunismo na região, o que de certa forma influenciou na eclosão de uma série de golpes militares apoiados e financiados pelos Estados Unidos, que temiam o avanço comunista no Continente. Os EUA não admitiam que os movimentos igualitários e de desenvolvimento regionais fossem contaminados pela doutrina comunista de caráter stalinista ou maoista.
Com a polarização das ideologias houve a eclosão de inúmeros golpes de estado financiados pelos governos americano, soviético e chinês.
Guerra Fria
A origem da Guerra Fria remonta da rivalidade entre os Estados Unidos e a União Soviética ocorrida em meados da Segunda Guerra Mundial.
Embora muitos afirmem existirem raízes mais profundas provindas do início do século XX, a partir do fim da década de 1940 as desavenças entre os dois blocos acirrou-se, pois, ambos afirmavam que os seus sistemas eram os vencedores da guerra que varreu o planeta na época.
É sabido que devidos esforços de guerra, acabaram por surgir as duas superpotências militares, que seguiam ideologias antagônicas, acirrando ainda mais as desavenças em todos os campos do conhecimento, da tecnologia e da cultura.
Os comunistas, através de um sistema socialista autoritário, detinham o poder do bloco através de sistemas ditatoriais, os capitalistas mantinham o poder através do controle econômico, cuja estrutura também financiava ditaduras de direita, que também eram sistemas autoritários.
Na América Latina não eram raros os governos dirigidos por caudilhos que poderiam pender para o bloco que bem lhes conviesse. Neste panorama, todos se diziam democratas.
Desta forma, o mundo estava em plena guerra fria, a maioria dos países ocidentais se diziam democráticos e afirmavam manter a livre expressão.
Dizem alguns que existiam algumas exceções às liberdades democráticas como as ditaduras na América Latina. É sabido porém, que os Estados Unidos aceitavam, financiavam e apoiavam ditaduras da direita em países nos quais acreditavam haver risco de migração para o bloco comunista, como no caso da Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Haiti, Peru, Paraguai, Uruguai etc.
Situação nacional
No Brasil, o golpe de 1964 e a consequente tomada do poder pelos militares contou com o apoio do grande empresariado brasileiro, temeroso que as medidas reformistas do presidente João Goulart desencadeassem um golpe comunista, particularmente devida as nacionalizações.
A população, no início confusa e receosa, depois desinformada pela repressão à imprensa, acabou se acomodando à medida que a economia, aparentemente, melhorava.
Bipolarização
Durante a eclosão do golpe de 1964 havia duas correntes ideológicas no Brasil, sendo uma de esquerda e outra de direita. Aquelas correntes tinham movimentos populares de ambas facções, acredita-se financiados com capital externo. Além da polarização, existia também um forte sentimento antigetulista, dizem alguns motivador do movimento militar que derrubou Jango.
Fatores políticos
Fator desestabilizador
O golpe não foi algo repentino, ele foi amadurecendo aos poucos. O motivo alegado era o comunismo.
O contexto, porém, era bem mais complexo: a estatização promovida por Jango e as visões conflitantes entre a política e a economia de ambas as correntes de pensamento, particularmente da extrema direita e extrema esquerda, vinham se contrapondo desde o início do século XX, sendo as alternativas mistas ainda em estágio embrionário.
O golpe militar de 1964 começou a ocorrer dez anos antes, em 1954. Um movimento político-militar conservador descontente com Getúlio Vargas e sua condição de ex-ditador, além de denuncias de corrupção, aliados aos Estados Unidos da América, tentou derrubar o então presidente Getúlio Vargas, que abafou o golpe terminando com sua própria vida num suicídio. A repercussão da carta-testamento de Getúlio Vargas conteve quaisquer movimentações e desestabilizou profundamente a estrutura política do Brasil.
Passados o impacto e a comoção social que se seguiram ao suicídio, em 1955 opositores de Vargas tentaram impedir as eleições sabendo de sua provável derrota.
Houve assim uma tentativa de golpe, impedida pela ação firme e corajosa do marechal Henrique Batista Duffles Teixeira Lott, que garantiu a eleição e a posterior posse de Juscelino Kubitschek.
Jânio e a tentativa de um autogolpe
Em 1961, quando Jânio Quadros renunciou, assumiu a presidência o então vice-presidente João Goulart, e houve suposições de um autogolpe fracassado.
Goulart era visto como sucessor político de Getúlio Vargas e era, também, cunhado do governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, que defendia a realização de reformas de base no Brasil, incluindo a reforma agrária e a reforma urbana.
As reformas de base desagradavam os setores conservadores, a classe média, e dirigentes de multinacionais, que vendo seus negócios em risco no Brasil financiaram em 1961 a criação do IPES. E através de seu poderio político financeiro e de lobby no Congresso Nacional acabaram por se movimentar no sentido de impedir a posse de Jango.
Por influência de grupos mais moderados, houve um acordo político estabelecendo o regime parlamentarista, o que significaria que Goulart seria chefe de estado, mas não chefe de governo - desta forma teria poderes reduzidos, mas permaneceria no governo.
Jango chegou ao poder através de uma eleição que levou Jânio Quadros à presidência pela UDN e o próprio João Goulart à vice-presidência pelo PTB. Ou seja, presidente e vice-presidente eram inimigos políticos. Esta situação foi possível devido a uma legislação eleitoral que permitia que se votasse no presidente de uma chapa e no vice-presidente de outra.
Devido às forças políticas atuantes no país, em 1962 foi convocado um plebiscito para escolher qual a forma de governo o Brasil adotaria: ou retornava ao presidencialismo ou permanecia no parlamentarismo. O povo optou maciçamente pelo presidencialismo com 9,5 milhões de votos contra 2 milhões dados ao parlamentarismo. Goulart começou a governar tentando conciliar os interesses do seu governo com os interesses políticos dos mais conservadores e também dos políticos progressistas no Congresso Nacional.
Devido a boicotes de ambas as correntes, houve uma grande demora em implantar as reformas de base. Os setores mais à esquerda, inclusive dentro do próprio PTB, afastaram-se da base governista e iniciaram protestos reivindicativos. Houve um aumento de preços dos mais diversos produtos e serviços. Desta maneira, a inflação acelerou e as medidas econômicas do governo foram duramente atacadas pelos grupos mais à esquerda. Estes viam nas medidas apenas a continuação de uma política antiquada que eles mesmos combatiam. Iniciaram-se greves comandadas pela CGT, o que repercutia mal nos setores patronais.
Assim, os setores mais à esquerda e os mais à direita movimentaram-se e desestabilizaram a política e a economia.
Em 4 outubro de 1963 Goulart solicita o estado de sítio ao Congresso Nacional pelo prazo de 30 dias. A justificativa do Ministério da Justiça é que o governo necessitaria de poderes especiais para impedir a comoção de "guerra civil" que punha em perigo as instituições democráticas. A manobra foi repelida inclusive pela esquerda, e a iniciativa foi vista como uma tentativa de golpe por parte de Jango.
Houve também uma importante guinada em direção a reformas de base de inspiração socialista. Junta-se à tensão política a pressão do declínio econômico.
Revolta dos marinheiros
A Revolta dos marinheiros foi um motim realizado pelos marinheiros da Marinha do Brasil que se sucedeu em 25 de março de 1964. Constituiu-se em uma assembleia de mais de dois mil marinheiros de baixa patente (marinheiros e taifeiros), que se realizou no prédio do sindicato dos metalúrgicos, no Rio de Janeiro.
Os amotinados exigiam melhores condições para os militares e também pediam apoio às reformas políticas de base apregoadas pelo presidente João Goulart. A assembleia foi chefiada por José Anselmo dos Santos, mais conhecido como Cabo Anselmo.
O então ministro da marinha, Sílvio Frota ordenou a prisão dos líderes amotinados, enviando destacamento dos fuzileiros navais, comandados pelo almirante Cândido Aragão. Ao final os fuzileiros juntam-se ao movimento.
Pouco depois da recusa do comandante Aragão em debelar o movimento, Jango expediu ordens proibindo qualquer invasão da assembleia e exonerou o ministro Mota. No dia seguinte, em 26 de março, o ministro do trabalho Amauri negociou um acordo, e os marinheiros concordaram em deixar o prédio pacificamente.
Logo em seguida, os líderes do movimento foram presos pelos militares, por motim. Goulart concedeu perdão aos amotinados, criando um forte constrangimento entre os militares diante da imprensa e sociedade. Logo depois, dia 30 de março, véspera do golpe, Goulart procurou apoio pelo seu governo junto a alguns sargentos.
As estatizações e as supostas fraudes financeiras
As recentes estatizações feitas por Leonel Brizola nas companhias telefônica e de energia do Rio Grande do Sul, ambas pertencentes a grupos dos EUA, criaram um clima tenso entre Brasil e Estados Unidos.
Brizola denunciou um acordo de indenização fraudulenta feito com as companhias dos EUA, antigas proprietárias das estatais recém-criadas do Rio Grande do Sul. O ministério caiu e o acordo foi suspenso, desagradando aos Estados Unidos.
Os sargentos, os estudantes e os Grupos dos Onze
Paralelamente, havia o movimento dos sargentos ideologicamente ligados ao governador Brizola. Estes pleiteavam o direito de serem eleitos, já que suas posses haviam sido impedidas pelo Supremo Tribunal Federal. O movimento estudantil, de orientação esquerdista, realizava protestos nas ruas.
O efeito da organização de sargentos e cabos em grupos políticos não pode ser subestimado em relação ao descontentamento dos militares com o governo de Jango, principalmente pela ligação destes com Brizola, que era cunhado do Presidente, pois subvertia a hierarquia militar, um dos preceitos mais importantes e talvez a própria alma das Forças Armadas.
Brizola criou o movimento chamado de Grupos dos Onze, que consistia na organização popular em grupos de onze pessoas, para fiscalizar parlamentares e militares (já prevendo tentativas de golpes) e pressionar o governo e o congresso pelas reformas de base.
Reação da direita
Os políticos do PSD, mais conservadores, temendo uma radicalização à esquerda deixam de apoiar o governo. A situação política de Goulart se torna insustentável, pois não tinha apoio total do PTB e nem dos comunistas. Não consegue governar de forma conciliatória.
A UDN e o PSD temiam pelo crescimento do PTB, já que Leonel Brizola era o favorito para as eleições presidenciais que aconteceriam.
Criou-se o medo de que Goulart levaria o país a um golpe de estado com a implantação de um regime político nos moldes de Cuba e China. Era o "perigo comunista", que serviria depois como justificativa para oo golpe.
Comício da Central do Brasil e a eclosão do golpe
O comício de Goulart e Brizola, na Central do Brasil, em 13 de março de 1964, foi a chave para dar início ao golpe. Ficou conhecido como Comício da Central.
Brizola e Goulart anunciavam as reformas de base, incluindo um plebiscito pela convocação de nova constituinte, a reforma agrária e a nacionalização das refinarias particulares de petróleo.
Os políticos da UDN e do PSD sabiam que Brizola era favorito para as eleições presidenciais e que o povo apoiaria o seu projeto, logo, a aliança UDN-Militares-Estados Unidos inicia sua mobilização definitiva em direção ao golpe.
Desde 1961 o IPES estava mobilizando a classe média. Sendo o Brasil de maioria católica, a sociedade cristã foi mobilizada para a Marcha da Família com Deus Pela Liberdade, reunindo 500.000 pessoas.
O uso da religião
Na Marcha da Família com Deus Pela Liberdade participaram quinhentas mil pessoas no dia 19 de Março de 1964. Os manifestantes foram da Praça da República e seguiram em direção à Praça da Sé, onde foi rezada uma missa para "salvação da democracia". O padre Patrick Peyton, conhecido por sua campanha anticomunista, rezou a missa.
A marcha teve seu amplo sucesso garantido por Adhemar de Barros e Carlos Lacerda. A finalidade desta era mobilizar a maior quantidade possível de participantes para dar respaldo popular e facilitar aos militares a organização da derrubada de Goulart com o apoio dos políticos e da sociedade organizada.
Na época, setores conservadores de outras igrejas também se juntaram ao apoio às cruzadas "anticomunistas". A Igreja Metodista, por exemplo, encontrava-se dividida, com setores simpáticos às reformas de Jango, e outros fortemente alinhados aos movimentos golpistas. Cabe lembrar aqui que, mais tarde, ocorreu o fechamento da Faculdade de Teologia desta Igreja, ao final de 1968, em sintonia com o AI-5.
A movimentação popular foi financiada pelo IPES.
Apoio logístico dos EUA
Financiamento eleitoral
O presidente norte americano John Kennedy através do intervencionismo político no Brasil, ordenou o financiamento das campanhas. Segundo o ex-agente da CIA, Philip Agee, os fundos provenientes de fontes estrangeiras foram utilizados na campanha de oito candidatos aos governos dos 11 estados onde houve eleições. Houve também o apoio a 15 candidatos ao Senado, a 250 candidatos à Câmara e a mais de quinhentos candidatos às Assembleias Legislativas.
Foram feitas doações através do IBAD. Como a bancada de esquerda aumentou, as doações de campanha resultaram numa CPI, que apurou sua procedência. Veio através dos bancos Royal Bank of Canadá, Bank of Boston e First National City Bank. Os militares brasileiros e com respaldo político e econômico das forças da UDN, lideradas por Carlos Lacerda, passaram modelar um movimento para remover Jango do poder.
Pedido de apoio de Lacerda
Lacerda havia pedido uma intervenção dos EUA na política brasileira, conforme entrevista ao correspondente no Brasil do Los Angeles Times, Julien Hart. Sua atitude causou uma crise política com os ministros militares solicitando o estado de sítio e a prisão de Lacerda.
O estado de sítio foi recusado pelo congresso, com a esquerda suspeitando que fosse uma armadilha dos militares para prender os líderes de esquerda como Brizola e Miguel Arraes.
Operações de logística
Como os arquivos do governo de Lyndon Johnson comprovariam, vinte anos mais tarde, foi feita uma operação militar chamada Operação Brother Sam para atuar no Brasil em apoio à Operação Popeye dos militares.
Somente no ano de 1962, quase cinco mil cidadãos americanos entraram no Brasil, número muito superior à média histórica conforme estudo de Jorge Ferreira em Rev. Bras. Hist. vol.24 no.47, São Paulo 2004, "A estratégia do confronto: a frente de mobilização popular".
Ainda:
(sic) “… o deputado José Joffily, do partido Social-Democrático (PSD), denunciou a "penetration" e, no princípio de 1963, o jornalista José Frejat, através de "O Semanário", revelou que mais de 5.000 militares norte-americanos, "fantasiados de civis", desenvolviam, no Nordeste, intenso trabalho de espionagem e desagregação do Brasil, para dividir o território nacional
Darcy Ribeiro citou ainda que "foi desencadeado com forte contingente armado, postado no Porto de Vitória, com instruções de marchar sobre Belo Horizonte.".
A "Brother Sam" objetivava abastecer com combustível e armas os militares golpistas. O porta-aviões americano USS Forrestal (CVA-59) e destróieres foram enviados à costa brasileira e ficaram próximos do porto de Vitória (ES).
Correntes de pensamento da época
Jango, por sua natureza populista seguia a tradição de Getúlio Vargas, além de influência da esquerda. Os militares impunham a segurança e o desenvolvimento conforme doutrina da Escola Superior de Guerra, cuja orientação filosófica seguia a política do National War College desde o final da Segunda Guerra Mundial e início da Guerra Fria.
Cronologia do golpe
No dia 28 de março de 1964, na cidade de Juiz de Fora, os generais Olímpio Mourão Filho e Odílio Denys se reuniram com o Governador de Minas Gerais o banqueiro Magalhães Pinto. Pinto foi um dos principais financiadores do IPES.
A finalidade da reunião era o estabelecimento de uma data para o início da mobilização que culminaria com o golpe militar de 1964.
As datas
A data estabelecida para o início das operações militares para o golpe foi o dia 4 de abril de 1964. Conforme descrito pelos jornais O Estado de São Paulo e Folha de São Paulo, o general Carlos Guedes, da Infantaria, afirmou que não poderia ser dado o golpe na data planejada, pois "nada que se faz em lua de quarto minguante dá certo". Consta que os golpistas haviam combinado em postergar a mobilização para depois do dia 8 de abril de 1964.
Em 31 de março de 1964 intempestivamente o general Olímpio Mourão resolveu partir com suas tropas para o Rio de Janeiro às três horas da manhã. Este ato, segundo os jornais, foi considerado impulsivo pelo marechal Humberto de Alencar Castello Branco.
Castello Branco, ao saber da partida de Olímpio Mourão, telefonou para Magalhães Pinto com o intuito de segurar o levante. Consta que o Marechal considerava o movimento prematuro e intempestivo.
Pinto argumentou que uma vez iniciado o desenlace, seria um erro parar, pois alertaria as forças legalistas podendo agravar a situação.
Anos mais tarde o Deputado Armando Falcão perguntou ao general Olímpio Mourão o porquê da atitude precipitada.
A resposta do militar divulgada pela imprensa foi: — Em matéria de política sou uma vaca fardada..
Segundo analistas, a precipitação foi um ato temerário de falta de visão estratégica que foi largamente discutido por historiadores e pela imprensa no sentido de que se houvesse reação poderia ter causado uma guerra civil no Brasil. Para tal bastaria que Goulart tivesse uma parcela de apoio de outros segmentos das Forças Armadas leais à Constituição Brasileira, entre elas o General Armando de Moraes Âncora.
A Imprensa
Antes da ditadura, jornais como O Globo, Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Diário de Notícias pregaram abertamente a deposição do presidente. Somente o jornal Última Hora se opôs ao golpe.
Segundo o jornalista Fernando Molica: "A grande maioria dos jornais era favorável à derrubada do governo João Goulart e festejou o golpe"
Segundo Mino Carta,
(sic) "…a Folha de São Paulo não só nunca foi censurada, como emprestava a sua C-14, carro tipo perua veraneio, usado para transportar o jornal, para recolher torturados ou pessoas que iriam ser torturadas na Oban, Operação Bandeirante."
A sequencia do golpe
Em seguida à marcha seguida por Olímpio Mourão Filho, o general Âncora havia recebido ordem de João Goulart para prender Castello Branco, porém não a cumpriu.
Comandando o Destacamento Sampaio para interceptar o Destacamento Tiradentes comandado pelo general Murici, o general Âncora, embora com tropa muito mais poderosa e armada, segundo suas palavras "não quis derramamento de sangue brasileiro atirando contra a juventude do país".
Se as forças se enfrentassem no Vale do Paraíba, onde se encontraram, com certeza se iniciaria uma guerra civil, e, segundo os cronistas da imprensa, era tudo que os militares não queriam.
A união das tropas
Ao se encontrarem, ao invés de haver enfrentamento as tropas uniram-se e marcharam em direção ao Rio de Janeiro. Às dezessete horas do dia 31 de Março de 1964, fez-se o golpe.
O Segundo Exército era comandado pelo general Amauri Kruel, que, em contato telefônico com o presidente, recebeu um pedido de apoio para pôr fim ao avanço.
Kruel impôs a condição do fechamento do CGT e a prisão de seus dirigentes para apoiar Jango, no que teve a negativa do Governante, então suas tropas se dirigiram para o Rio de Janeiro pela Via Dutra, onde foram interceptadas pelo general Emílio Garrastazu Médici, que estava com os cadetes das Agulhas Negras à sua frente.
No dia 1 de abril de 1964, houve uma reunião entre Âncora e Kruel que, convencidos por Médici, uniram-se de fato aos demais militares. Durante as negociações foi decidida a união das tropas.
A prisão de Miguel Arraes e João Dória
Enquanto isto, no Nordeste, Miguel Arraes, governador de Pernambuco, e João Dória, governador de Sergipe, eram presos como traidores da nação.
Jango se refugia no Rio Grande do Sul
O Quarto Exército comandado pelo General Justino Bastos dominava estrategicamente toda a situação, e João Goulart havia voado para Brasília para procurar apoio do Congresso. Na Guanabara, Carlos Lacerda havia posto a polícia à caça de colaboradores de Goulart bloqueando ruas e acessos com caminhões de lixo. As tropas da polícia de Lacerda chegaram a cercar o palácio Guanabara, numa tentativa de prender o Presidente da República.
Enquanto era perseguido pelos golpistas, Goulart reuniu-se com o general Nicolau Fico, comandante militar de Brasília, e o general Assis Brasil, chefe da Casa Militar.
Preparou um comunicado à nação, informando que iria para o Rio Grande do Sul para se unir às forças do III Exército, sob o comando do general Ladário Teles, informando sobre o golpe e conclamando a população a lutar pela legalidade.
Darcy Ribeiro e Waldir Pires falaram à população na televisão. O governo ainda controlava os meios de comunicação em Brasília. O presidente tentou viajar para Porto Alegre em avião de carreira, porém a decolagem foi sabotada por golpistas. Jango voou então no avião presidencial, arriscando-se a ser abatido por militares.
Apesar do acordo com o general Nicolau Fico estabelecer que as tropas ficariam nos quartéis em Brasília, os militares ocuparam as imediações do Congresso para impedir manifestações populares. Estas estavam previstas se os congressistas se reunissem para votar o impedimento do presidente.
O motivo seria o fato do chefe da nação ter se ausentado do país. Darcy Ribeiro fez então um comunicado, lido por Doutel de Andrade na tribuna do Congresso Nacional, já na madrugada do dia 2 de abril.
A ação do Congresso
O senador Auro Soares de Moura Andrade, presidente do Congresso Nacional, apesar do presidente da República estar no País, declarou vaga a presidência.
Alegou que o presidente havia saído do Brasil e que o comunicado de Darcy Ribeiro era mentiroso.
Andrade empossou o presidente da Câmara Ranieri Mazzilli como governante provisório, ato considerado anos depois por juristas como irregular. Em seguida mandou desligar os microfones e as luzes rapidamente sob protestos de Tancredo Neves.
Os participantes do Congresso Brasileiro criaram assim condições para o golpe militar e a ditadura que se seguiria.
Jango vai embora do Brasil
Consta que Darcy Ribeiro tentou convencer o presidente a resistir, como explicou em depoimento.
Darcy considerava que o governo deveria resistir usando a aviação comandada pelo brigadeiro Teixeira para conter as tropas de Olímpio Mourão, composta de recrutas desarmados, e os fuzileiros comandados por almirante Aragão, que poderiam então prender Carlos Lacerda e Castello Branco.
Goulart se recusou a resistir pois foi informado que os golpistas tinham o apoio da armada americana que estava se encaminhando para o Brasil, o que poderia conflagrar uma guerra civil. João Goulart tinha o apoio do Terceiro Exército comandado pelo general Ladário Teles, e de Leonel Brizola. Porém decidiu ir embora do Brasil, a partir de então teria surgido uma dura inimizade entre Brizola e João Goulart, que perduraria até 1976.
O general Argemiro de Assis Brasil foi figura determinante na fuga de Jango do país durante o golpe, pois protegeu-o e à sua família, guiando-o em segurança para o Uruguai. Ao se apresentar às autoridades que assumiram ao poder, o general foi preso, processado e sua carreira profissional interrompida sendo considerado traidor. Perante o Exército Brasileiro o general Assis Brasil passou a ser considerado morto, perdendo assim todos os seus direitos e os anos dedicados àquela arma.
Consolidação do regime militar
O jornal Última Hora e a sede da UNE são destruídos por militantes de Lacerda, muitas das organizações que apoiavam Jango tiveram seus líderes presos e perseguidos pela ditadura.
À medida em que o golpe militar foi avançando as liberdades individuais da população brasileira foram sendo extinguidas com o endurecimento do regime.
A imposição de um estado de exceção com a ruptura dos direitos civis da população e uma ditadura militar com o alinhamento político-econômico sob tutela e proteção dos Estados Unidos da América, segundo aqueles, era primordial para a modernização do Brasil, e, havia a doutrina propagandeada de que
"(sic)…o que era bom para os Estados Unidos, era bom para o Brasil…".
Base de apoio militar
O movimento político militar de 1964 foi um golpe de estado, portanto não somente militar. O Congresso e a sociedade civil tiveram sua parcela de responsabilidade aceitando o patrocínio financeiro e logístico dos Estados Unidos. A Operação Brother Sam, conforme amplamente divulgado pela própria imprensa nacional e estrangeira teve papel importante em respaldar a Operação Popeye deflagrada por Olympio Mourão Filho. O National Security Archive, entidade de pesquisa e divulgação de documentos secretos do governo norte-americano, por ocasião dos quarenta anos do golpe militar, divulgou documentos já em domínio público do primeiro escalão do governo norte-americano da época.
Segundo os arquivos, para o presidente Lyndon Johnson, o que estava em jogo era o confronto global entre o comunismo soviético e a democracia. Por essa razão Johnson estava disposto a fazer o que fosse preciso para ajudar o movimento que derrubou João Goulart.
A embaixada e os consulados norte americanos no Brasil, tinham agentes da CIA encarregados de levantar informações sobre as atividades de comunistas e militares no Brasil.
Segundo a Revista Veja na Edição 1848 de 7 de abril de 2004:
"(sic)…Os militares e empresários que conspiravam contra Jango tinham o hábito de pedir apoio aos americanos para suas aspirações golpistas, revela um relatório de Lincoln Gordon de 27 de março de 1964… Uma nova leva de papéis publicada na semana passada no site do National Security Archive…".
A quebra da hierarquia
Uma justificativa apresentada à opinião pública pelos militares após a revolução, era a de que este era um movimento político militar para derrubar Jango e restabelecer a hierarquia militar vertical abalada nas Forças Armadas, pelo apoio do presidente da República à luta emancipatória dos sargentos e marinheiros, que queriam candidatar-se a cargos públicos. Este era "ato considerado irregular pela própria legislação e pela Constituição vigente". Também afirmavam que queriam evitar a contaminação das doutrinas de esquerda no Brasil pelos Chineses, Cubanos e Soviéticos. Afirmavam ainda que a finalidade do golpe foi também controlar a inflação e colocar o país nos eixos.
O golpe de 1964 se transformou numa sucessão de atos institucionais, mas também de construções de grandes obras. A modernização elevou o país como uma das grandes economias mundiais. As dívidas geradas pelas famosas Obras Faraônicas, ao final da ditadura, geraram uma inflação galopante que levaram o Brasil a um período chamado posteriormente por alguns setores da Imprensa como A década perdida.
As promessas
No início houve a promessa a elite, à classe média e à população em geral (noticiada fartamente no rádio, televisão e imprensa), que a Constituição de 1946, a normalidade democrática e as eleições seriam preservadas e restabelecidas rapidamente (Em 1966, no mais tardar), logo ao final do mandato de Jango, que estaria sendo preenchido pelos interventores militares.
Segundo a Fundação Getúlio Vargas:
(sic)…o golpe militar foi saudado por importantes setores da sociedade brasileira. Grande parte do empresariado, da imprensa, dos proprietários rurais, da Igreja católica, vários governadores de estados importantes (como Carlos Lacerda, da Guanabara, Magalhães Pinto, de Minas Gerais, e Ademar de Barros, de São Paulo) e amplos setores de classe média pediram e estimularam a intervenção militar, como forma de pôr fim à ameaça de esquerdização do governo e de controlar a crise econômica.
No pensamento vigente da época, o Brasil estava perdido em greves, "baderna", corrupção, "roubalheira" e inflação, portanto, haveria que ser feito algo urgente para restabelecer uma suposta ordem democrática.
A propaganda institucional era farta. A sociedade estava dividida pela ideologia.
É alegado que qualquer que fosse a direção tomada, fatalmente o Brasil seria uma ditadura, ou de esquerda, ao estilo soviético, chinês, ou cubano, ou de direita, como tantas outras que floresceram na América Latina.
Assim, houve a ditadura de direita, alinhando-se ao bloco liderado e financiado pelos Estados Unidos.
Após o golpe de 1964
Logo após o golpe de 1964, em seus primeiros 4 anos, a ditadura foi endurecendo e fechando o regime aos poucos. O período compreendido entre 1968 até 1975 foi determinante para a nomenclatura histórica conhecida como "anos de chumbo". Vieram os Atos Institucionais, artificialismos criados para dar legitimidade jurídica a ações políticas contrárias à Constituição Brasileira de 1946, culminando numa ditadura.
Dezoito milhões de eleitores brasileiros sofreram das restrições impostas por seguidos Atos Institucionais que ignoravam e cancelavam a validade da Constituição Brasileira, criando um Estado de exceção, suspendendo a democracia.
Querendo impor um modelo sócio, político e econômico para o Brasil, a ditadura militar no entanto tentou forjar um ambiente democrático, e não se destacou por um governante definido ou personalista. Durante sua vigência, a ditadura militar não era oficialmente conhecida por este nome, mas pelo nome de "Revolução" e seus governos eram considerados "revolucionários". A visão crítica do regime só começou a ser permitida a partir de 1974, quando o general Ernesto Geisel determinou a abertura lenta e gradual da vida sociopolítica do país.
O golpe também foi recebido com alívio pelo governo norte-americano, satisfeito de ver que o Brasil não seguia o mesmo caminho de Cuba, onde a guerrilha liderada por Fidel Castro havia conseguido tomar o poder. Os Estados Unidos acompanharam de perto a conspiração e o desenrolar dos acontecimentos, principalmente através de seu embaixador no Brasil, Lincoln Gordon, e do adido militar, Vernon Walters, e haviam decidido, através da secreta "Operação Brother Sam", dar apoio logístico aos militares golpistas, caso estes enfrentassem uma longa resistência por parte de forças leais a Jango.
Correntes ideológicas militares
Segundo o tenente-coronel de Infantaria e Estado-Maior do Exército Brasileiro Manuel Soriano Neto, em palestra comemorativa proferida na AMAN em 12 de setembro de 1985, em homenagem ao centenário do marechal José Pessoa:
"Com as desavenças que grassavam na corrente outubrista, o tenentismo vem a se desintegrar. Tal fato se dá após a Revolução de 1932, mormente durante o ano de 1933, quando se formava a Assembleia Nacional Constituinte. Parcelas das Forças Armadas se desgarraram para a esquerda e para a direita, incorporando-se à Aliança Nacional Libertadora e à Ação Integralista Brasileira, que apregoavam ideologias importadas, não condizentes com a idiossincrasia de nosso povo."
Portanto, dentro das forças armadas brasileiras, existia uma grave cisão interna de ordem ideológica e, ainda havia outra divisão entre os moderados e a linha dura.
Porém havia também o sentimento patriótico autêntico que manteve ocultas da população todas as desavenças internas.
Os grupos concorrentes entre si defendiam pontos de vistas diferentes:
Um grupo defendia medidas rápidas diretas e concretas contra os chamados subversivos, ou inimigos internos, estes militares apoiavam sua permanência no poder pelo maior tempo possível.
Ao contrário do grupo anterior, o segundo era formado por militares que tinham por doutrina a tradição de intervenções moderadoras. Estes procuravam permanecer no poder somente o tempo necessário até se formar um governo aceito pelo grupo a exemplo de 1930, 1945 e 1954. Quando passado o período de maior risco institucional houve o rápido retorno do poder para os civis.
Doutrina da segurança nacional
Para os dois grupos era necessário salvaguardar o Brasil contra o poder do comunismo internacional.
Segundo a doutrina dos militares, o inimigo devia ser extirpado a todo custo e os governos populistas seriam uma porta de entrada para a desordem, subversão e propiciariam a entrada de ideologias nocivas à nação.
As facções contrárias internamente nas forças armadas acabaram se unindo apesar da não concordância metodológica. Desta forma, os militares mais radicais se aglutinaram ao general Costa e Silva, e os mais estratégicos ao general Humberto de Alencar Castelo Branco.
Muitos militares da época afirmam que se a orientação filosófico ideológica das forças armadas fosse para a esquerda, estas defenderiam da mesma forma a linha de pensamento, somente o inimigo que mudaria de lado, o que importava era a segurança da Nação.
Beneficiados
Os políticos oportunistas que trocavam de partido independente da sua orientação ideológica. Os maiores financiadores do golpe foram notadamente as grandes oligarquias do Brasil, além de multinacionais estadunidenses, em torno de trezentas empresas inicialmente.
Veja também:
IPES: Os maiores financiadores do IPES foram cinco empresas: Refinaria União, Light, Cruzeiro do Sul, Icomi, Listas Telefônicas Brasileiras, além de trezentas empresas norte americanas de menor porte. O Instituto foi fundado pelo general Golbery do Couto e Silva, logo após pedir para passar para a reserva do Exército Brasileiro, em 2 de Fevereiro de 1962.
Localizava-se no edifício Avenida Central, no Rio de Janeiro, vigésimo sétimo andar, com treze salas:
Propaganda
Propaganda institucional
Publicidade do regime militar de 1964
O surto de crescimento econômico que ocorreu em seguida ao golpe militar, chamado de Milagre brasileiro, caracterizado pela modernização da indústria e pelas grandes obras, estava de fato ocorrendo. Porém, também havia os interesses de grandes grupos econômicos e a especulação do capital. Estes tinham interesse nos lucros advindos da ditadura forçando a construção de grandes obras de infraestrutura.
Naquela época, fortunas gigantescas foram ganhas à custa de empréstimos externos. Dizem alguns que o retorno do investimento das empresas e grupos multinacionais era necessário, o montante aplicado no golpe foi imenso. O problema não equacionado foi custo social do retorno.
O Brasil cresceu, mas endividou-se exponencialmente, apesar de ser elevado à oitava economia do planeta.
Ao primeiro sinal de crise, entre (1973-1974), o capital especulativo volátil se foi para outras praças mais seguras, deixando o país num beco sem saída.
Os empréstimos a juro barato se extinguiram, o crescimento desacelerou, o país entrou em grandes dificuldades de caixa e principalmente de liquidez. Muitas obras pararam ou tiveram sua qualidade diminuída em função da falta de dinheiro para um término adequado, outras foram inauguradas às pressas.
Sem liquidez não há capital de giro, e sem capital de giro há recessão e inflação; assim se iniciou um lento movimento em direção à estagnação econômica.
A aceleração inflacionária, como todo processo de aceleração, começou lenta, gradual e constante. A economia de aproximadamente 67% da massa populacional (em torno de 40 milhões de pessoas) teve uma redução abrupta, o povo empobreceu e se endividou rapidamente junto ao sistema financeiro, o que gerou escassez de capital e aumentou a impressão de papel-moeda, que realimentou a inflação, que por sua vez alimentou a escassez.
A pressão social foi aumentando exponencialmente, todos começavam a maldizer o governo, inclusive os próprios servidores públicos, apesar de isso ser proibido.
O governo militar, prevendo aonde isso poderia chegar, viu-se forçado a mudar de estratégia. Já em meados de 1976, iniciou um lento processo de abertura democrática e adequação social. Este processo não poderia ser rápido demais, pois poderia haver uma explosão social, nem muito lento, pois a recessão advinda poderia destruir a economia do país.
Ato Institucional Número Um
Em 9 de Abril de 1964, foi publicado o Ato Institucional Número Um , ou AI-1, que suspendeu por dez anos os direitos políticos de todos aqueles que poderiam ser contrários ao regime, intimidando os congressistas com a ameaça de cassações, prisão, enquadramento como subversivos e expulsão do país. A Lei de Segurança Nacional que seria publicada no futuro, em 3 de Março de 1967, teve seu embrião no AI-1.[7]
Houve uma razão lógica para a decretação do Ato, que foi uma medida mais estratégica do que o diálogo. Os políticos, em sua maioria, estavam reticentes quanto aos caminhos que seriam tomados pelo governo de então. Naquela altura, a conversa, o convencimento pela razão e pelos argumentos, seriam inócuos, demandariam muito tempo, o que daria espaço e fôlego aos depostos ou à oposição de se reorganizarem.
Haveria que se tomar uma medida radical para convencer os indecisos dos rumos determinados pelo comando da revolução (Ou golpistas), e um Congresso indeciso seria precedente perigoso para a deflagração de uma guerra civil, daí o afastamento de todos aqueles que porventura poderiam dificultar o processo ou reagir. Isto está bem claro nos primeiros parágrafos do AI-1:
"…(sic) É indispensável fixar o conceito do movimento civil e militar que acaba de abrir ao Brasil uma nova perspectiva sobre o seu futuro. O que houve e continuará a haver neste momento, não só no espírito e no comportamento das classes armadas, como na opinião pública nacional, é uma autêntica revolução."
"A revolução se distingue de outros movimentos armados pelo fato de que nela se traduz não o interesse e a vontade de um grupo, mas o interesse e a vontade da Nação."
"A revolução vitoriosa se investe no exercício do Poder Constituinte. Este se manifesta pela eleição popular ou pela revolução. Esta é a forma mais expressiva e mais radical do Poder Constituinte. Assim, a revolução vitoriosa, como Poder Constituinte, se legitima por si mesma."
Como observado no texto, os militares acreditavam da necessidade urgente de legitimar o golpe "por si mesmo".
Muitos ainda discutem que se fosse de fato um "movimento popular legítimo em nome da democracia", alguns meses depois da "revolução" deveria ser feito um plebiscito, para se saber da verdadeira vontade popular.
Ainda hoje é cobrada pelos mais antigos a necessidade de se mandarem cumprir dezesseis atos institucionais.
Alegam outros que no início houve o desejo de entregar a democracia o mais rapidamente possível à Nação. Ainda dizem que o presidente Castello Branco foi bastante claro quanto ao seu desejo, pois ele era um intelectual.
Dizem ainda que houve uma radicalização principalmente da "linha dura", que não aceitava de forma alguma um governo de tendências esquerdistas democraticamente eleito novamente. Segundo o grupo mais radical, se isso acontecesse, poderia haver uma entrada das esquerdas no Brasil e, em consequência, o país explodiria em conflitos agrários e urbanos, com muito mais violência do que se eles (os militares) permanecessem no poder.